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13 de maio - uma data de muita luta
À noite, desceram com enormes tochas de fogo, o machado dilacerou a porta de jacarandá da sede da Fazenda Maravilha, depois foram as janelas, vidros. Os pratos e roupas são jogados pelas janelas. O fogo foi colocado primeiro no sofá da sala de visitas...
Edição: 293
Data da Publicação: 15/05/2020
Durante séculos, 75% do café consumido no mundo era
produzido onde é hoje Paty do Alferes, Miguel Pereira e Vassouras (a sede do
município). Era o único produto exportado pelo Brasil. Os negros abasteciam o
mundo com o café produzido com sua força de trabalho gratuita, seu suor e muito
sangue. Os negros enriqueceram aqueles que os mantinham sob ferros, chicotes e
desterrados de seu continente, sua terra, seus costumes, suas famílias. Os homens
negros escravizados durante 350 anos no Brasil construíram fazendas, estradas,
cafezais, engenhos com moendas, tulhas, armazéns, ranchos, casas, varandas e
capelas, e iam dormir em senzalas; construíram tudo, e tudo que está aí 132
anos depois.
A abolição não foi fruto de um processo de conscientização
e muito menos aconteceu de uma hora para outra. Foi longa e conquistada com
muita luta daqueles que se importavam com o próximo e contra aqueles que
enriqueceram sob o sofrimento da tortura do semelhante. A abolição se deu quando grande parte da população negra
não se mantinha mais nos cativeiros, por força da luta e resistência dos
movimentos negros nos quilombos, nas irmandades e nas rebeliões, como a Revolta
dos Malês em Pernambuco, bem como em razão das pressões internacionais, tendo
sido o Brasil o último país da América a fazê-lo.
Durante esse processo, dois heróis têm especial espaço na
história: Zumbi dos Palmares e Manuel Congo. Manuel Congo é nosso; ele liderou
uma revolta de mais de 400 homens e mulheres escravizados. Manuel Congo vem da
Fazenda Maravilha e da Fazenda Freguesia, que pertenciam a Manuel Francisco Xavier, e eram as maiores, mais poderosas e ricas fazendas do Vale do Café.
Hoje, se dissolveram e é onde está a Aldeia de Arcozelo, que na década de 80 foi do teatrólogo e embaixador Pascoal Carlos Magno. Hoje pertencente a Funarte.
Ali, há 200 anos, nasceu Paty do Alferes, que pertencia a
Vassouras, mas era maior e mais poderosa que a sede do município. Nessa época,
essa região (Paty, Miguel Pereira e Vassouras) tinha quatro vezes mais homens
escravizados do que homens livres.
A tensão era constante; o tronco nunca foi tão utilizado,
pés e mãos metidos em dois buracos num toco de pau. Dedos cortados, cicatrizes
pelos corpos, dentes arrancados, unhas arrancadas, sinais de correntes pelos
punhos e coisas piores.
Aqui, numericamente, os homens escravizados eram
infinitamente superiores. Nessa realidade, Manuel liderou centenas de negros,
irmãos escravizados, para o quilombo. À noite, desceram com enormes tochas de
fogo, o machado dilacerou a porta de jacarandá da sede da Fazenda Maravilha,
depois foram as janelas, vidros. Os pratos e roupas são jogados pelas janelas.
O fogo foi colocado primeiro no sofá da sala de visitas, onde havia almofadas
bordadas a ouro, depois foi subindo, subindo até virar uma labareda só. Do lado
de fora, os negros livres (pelo menos naquele momento) dançavam, cantavam e
bebiam no terreiro em volta da fogueira; trouxeram atabaques para dançar,
cantar e fazer amor. O engenho foi destruído a base de machado, pau e unha,
tamanha era a revolta.
Em seguida, seguiram
mata adentro até o quilombo onde estava a Gruta de Manuel Congo em Vera Cruz (Miguel Pereira) na divisa com Paty do Alferes. A Gruta
fica na vertente de Miguel Pereira, mas naquela época era tudo Vassouras.
Os fazendeiros, liderados por Manuel Francisco Xavier,
exigiram do Imperador Dom Pedro II a Guarda Nacional. Dom Pedro II hesitou muito
em mandar, mas enviou a Guarda Nacional comandada por quem mais tarde se
tornaria Duque de Caxias. Ele nunca se envergonhou de ser assassino de
escravos, chefiar a tropa e dar combate aos negros. Na verdade, quando Caxias chegou, os fazendeiros já tinham montado sua patrulha e grande parte já tinha sido presos ou mortos.
Manuel Congo e mais 12 escravos e escravas, entre elas Mariana
Crioula, foram condenados, uns a 650 açoites. O Código Penal do Império estabelecia o limite de 50 açoites por dia. Foram 13 dias de horror, e para os que conseguiram sobreviver, tinham que usar uma gargalheira de ferro por 3 anos
imprensando o pescoço.
Manuel Congo foi o único condenado à forca, sentença que
foi executada em Vassouras em 06 de setembro de 1839 na frente de sua esposa e seu corpo foi proibido
de ser enterrado. Vale a pena conhecer o local do enforcamento.
A abolição não foi uma concessão da família real. A
pressão pela liberdade era de todos os lados, não só internamente, mas do
exterior também. O mundo já estava se industrializando, precisava de
consumidores e trabalhadores assalariados.
Pela liberdade dos escravos sem indenização, os
escravocratas se juntaram aos abolicionistas e derrubaram o Império. Assim,
nascia a República a partir de um golpe, o primeiro da República.
Com a abolição, nos anos seguintes, a região rica e
poderosa passou a sentir o esvaziamento econômico, diferentemente de outras
regiões do país.
Luta, resistência e sobrevivência, até hoje. "Não vamos aceitar voltar para o tronco nem
para a senzala", disse a deputada federal e ex-governadora do estado Benedita
da Silva no Congresso Nacional, se referindo à perda dos direitos trabalhistas
que estão sendo revogados.