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A Petrobras não comanda mais o preço dos combustíveis

Segundo o senador Roberto Requião: "Quando o 'mercado' derrubou as ações da companhia petrolífera na Rússia, o presidente Putim bancou o jogo, comprou as ações [em baixa] e estatizou completamente o setor petrolífero".

Edição: 334
Data da Publicação: 26/02/2021

A Petrobras é uma empresa híbrida, meio pública e meio privada. Ela atende a dois senhores completamente antagônicos e, por isso, é fonte de constantes crises de interesse. O mercado acha que a mera maximização da eficiência da empresa levará ao desenvolvimento econômico do país - ledo engano, como se um lucro maior fosse suficiente para levar o país.

Entretanto, as empresas públicas têm papel muito mais relevante do que maximizar lucros. Aliás, o papel delas é fazer coisas que o "mercado" não faz, como nas áreas de saúde, educação, na esfera da ciência e desenvolvimento tecnológico, redução de desigualdades e bem-estar da população. E esse é o caso da Petrobras - aliás, ela é mais do que uma empresa e, como diz o economista Paulo Gala, "ela é quase um Ministério do Petróleo". Se somar toda a cadeia produtiva dela, chega a mais de 10% do PIB brasileiro.

Saudi Aramco da Arábia Saudita

Empresas de cunho público são regidas por outra lógica. Por exemplo, a grande empresa petrolífera estatal da Arábia Saudita, a Saudi Aramco, recomprou mais um pedaço dela mesma na bolsa e sua política nº 1 é desenvolver a cadeia produtiva do petróleo e gás. Eles querem que as refinarias da Arábia Saudita sejam desenvolvidas e anunciaram que só vão comprar insumos e máquinas de multinacionais se houver transferência para as empresas sauditas. A Arábia Saudita, a gigante do petróleo, está preocupada em desenvolver o país, assim como fez a Noruega. Todo desenvolvimento da cadeia do petróleo e gás foi feito pela estatal norueguesa do petróleo - é isso mesmo, é uma estatal gigantesca.

EUA

Os EUA proibiram a exportação do petróleo até 2015 porque era considerado um bem estratégico e essa determinação só foi revogada com a descoberta de petróleo de xisto no seu subsolo, então eles estão produzindo 12 milhões de barris de petróleo por dia, a mesma quantidade que a Arábia Saudita. Mas o setor é altamente regulado e tratado com mão de ferro, o país proibiu que empresas chinesas comprem refinarias americanas literalmente.

Perguntas sem respostas

Petróleo não é salsicha e cabe aos economistas estudarem geopolítica, coisa que eles não fazem. Petróleo é energia, é estratégico para qualquer país no mundo. Hoje, o Brasil tem um custo de extração no pré-sal de US$ 8,00 um barril de um petróleo leve de excelente qualidade e que atende a 2/3 das necessidades do país. O Brasil importa apenas 1/3 do petróleo que necessita ao custo de 60 dólares o barril. Então por que ele pratica um preço como se importasse 100% do petróleo que precisa? Por que o governo brasileiro importa gasolina e diesel se suas refinarias estão com capacidade ociosa?

Aonde está o sistema de preços da Petrobras?

Hoje, o grande problema do Brasil não é o presidente da Petrobras, mas aonde está o sistema de preços. O governo Temer, através do então presidente da Petrobras Pedro Parente, mudou o sistema e adotou o PPI - Preço de Paridade de Importação. A situação piorou com a venda dos ativos da empresa, como refinaria, Transpetro e BR Distribuidora, e a Petrobras deixou de ser uma empresa do poço ao posto, ela era uma empresa integrada de energia - coisa que não é mais. Nós perdemos a capacidade de utilizar o sistema de preços a favor do processo de desenvolvimento do Brasil. Esse é o "X" da questão: a empresa vai trabalhar a favor do desenvolvimento do país ou dos poucos acionistas? E nesse aspecto, é importante esclarecer que, em números redondos, o governo tem 51%, os fundos internacionais têm 43% e os acionistas brasileiros têm 6%. A BR Distribuidora foi esquartejada (vendida) em 3 oportunidades. Na primeira, se vendeu 30%, na segunda mais 20% e no ano passado (2020) outros 20%. Os compradores? Um fundo Canadense e uma empresa Franco Belga.

Outra pergunta

É justo que toda economia do país sofra por causa de alguns acionistas estrangeiros? Acionistas esses que sabem que a Petrobras é uma empresa pública, estatal e altamente estratégica?

A importância de ser estatal

As empresas estrangeiras, como Shell e Esso, não querem investir no país. Exemplo disso é que a Shell era sócia da Petrobras no poço onde o pré-sal foi descoberto. Só que a Shell fez suas contas e achou que não valeria a pena investir mais 150 milhões de dólares e devolveu sua parte. A Shell levou em consideração seu custo-benefício, que se dá através da maximização de lucro no curto prazo, e não quis.

A lógica da Petrobras é outra, então ela decidiu pelo desenvolvimento do país e resolveu bancar esse valor. Ela achou uma Arábia Saudita no fundo do mar, e o pré-sal foi descoberto - sem a Shell, descobrindo mais de 300 milhões de barris de petróleo no pré-sal. A lógica pública é que fez a Petrobras continuar a furar o poço. Com isso, o preço das ações da empresa explodiu, subiu de 2 dólares para 20 dólares.

O sistema privado não aguenta carregar riscos, ele é muito fraquinho, os grandes riscos que são relevantes são do setor público, que os assume, e é assim no mundo todo.

Segundo o senador Roberto Requião: "Quando o 'mercado' derrubou as ações da companhia petrolífera na Rússia, o presidente Putim bancou o jogo, comprou as ações [em baixa] e estatizou completamente o setor petrolífero".

A venda das refinarias

A venda de uma refinaria gera caixa e se incorpora ao balanço da CIA daquele ano e, ao gerar caixa, paga lucro e dividendos; ao pagar enormes dividendos porque privatiza, valoriza as ações. O investidor tem duplo lucro com a Petrobras quando ocorre venda de refinaria, sendo que uma já foi vendida pela metade do preço para um fundo saudita, restam outras sete que estão previstas.

Segundo Paulo Gala, "Atualmente, 95% do petróleo brasileiro refinado é produzido nas 12 refinarias da Petrobras, o que configura, na prática, um monopólio de fato. Lembrando que a cadeia petroquímica é muito relevante sob a ótica da complexidade tecnológica. Com isso, abrir mão das refinarias contribuirá para o enfraquecimento da estatal em um movimento contrário ao das companhias atuantes no setor, que promovem investimentos no parque de refino mundial. Além disso, as petroleiras nacionais estão se fortalecendo em todo o mundo, sobretudo através da expansão e integração da capacidade de refino com a petroquímica vide países da Ásia (China, Índia, Indonésia e Malásia), Rússia e do Oriente Médio. Mesmo nos Estados Unidos, onde 135 refinarias de empresas privadas fazem isso, há um mecanismo de regulação estatal sobre a aquisição desses ativos por empresas estrangeiras".

A venda da refinaria pela metade do preço também afeta a própria dinâmica de preços e de atuação da Petrobras, o que dificultará que o presidente encontre uma fórmula de reduzir a voracidade dos interesses do "mercado", que estão anos-luz dos interesses da Nação.