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O desconhecido sistema financeiro chinês
Foi um debate interessante no canal GGN, do jornalista Luis Nacif, no programa "Nova Economia", formado pelos economistas João Furtado e Leda Paulani com o Marcello Azevedo
Edição: 459
Data da Publicação: 21/07/2023
Em 1978, a China tinha um banco grande, o banco Popular da China, que
exercia todas as funções bancárias, desde as funções de banco Central, funções
de banco comercial, controladores de divisas, além de ter umas 3.000
cooperativas rurais. Esse era o sistema financeiro chinês.
Hoje, 45 anos depois, estamos diante do segundo maior sistema financeiro
do mundo. Se nós pegarmos os dez maiores bancos do mundo por ativos financeiros
segundo a Forbes, FMI, Banco Mundial, cinco são chineses, e, se pegarmos entre
os cinco primeiros, quatro são chineses. O maior banco do mundo é o Banco do
Comércio e da Indústria da China. Se pegarmos o setor securitário (seguros) a
maior seguradora do mundo é chinesa (Ping An).
Na China, existe o que se chama de bancos políticos, que são aqueles
direcionados e controlados pelo estado chinês e com quase nenhuma participação
do capital privado. São eles: o Banco de Desenvolvimento da China, o Banco de
Importação e Exportação da China e o Banco do Desenvolvimento Agrário da China,
esses são os bancos que desenvolvem política a mando do governo.
Existem também os bancos tradicionais estatais que também são bancos
direcionados, como, por exemplo, o banco da indústria, o banco da construção, o
banco das telecomunicações, e, ao mesmo tempo, tem os bancos de desenvolvimento
regionais, esses também são comerciais.
Na China, há controle rígido e, quando há crise como houve com o sistema
habitacional, os gestores são presos, os bens são bloqueados, inclusive os bens
dos familiares adquiridos durante o período da sua gestão. É bem diferente
daqui no Brasil como foi o rombo das Lojas Americanas e os gestores estão
soltos até hoje.
A China enfrentou a crise das bolsas no final do século XX, a crise de
2008, enquanto, no ocidente, bancos americanos fecharam e a China passou
incólume. Os chineses tem verdadeira obsessão, psicose sobre a mitigação de
risco, as taxas de inadimplência são muito inferiores às taxas existentes no
ocidente, eles têm muito controle no uso do dinheiro.
Bancos
privados
Os bancos privados aparecem na China muito recentemente, mas são muito
poucos e com funções específicas e definidas. Na década de 80, quando a China
cria as Zonas Econômicas Especiais, ela se abre ao capital internacional e ao
processo industrial, e, quando há o processo industrial, tem que haver processo
bancário por tabela, mas totalmente regulado pelo estado chinês. Mas tem que
estar em parceria com as empresas chinesas em uma join venture.
Como os
chineses veem o mundo
Os chineses trabalham com uma teoria nas relações internacionais chamada
Teoria Relacional. Para eles, você só existe quando se relaciona e isso
explica um pouco a relação com a África que é relacional. Os ocidentais, quando
vão à África, é para dar esporro, conselhos e saquear as reservas naturais do
continente, como ouro, diamante, petróleo etc. Quando os chineses vão à África,
deixam um hospital, uma fábrica, uma estrada, uma ferrovia. É outra cultura.
Os chineses praticam o comércio há 5.000 anos (é um estado nacional mais
velho que o Cristianismo), e é isso que explica os 14 trilhões de dólares
alocados no projeto Rota da Seda (belt and roads), onde estão sendo
feitos aeroportos, ferrovias, rodovias e portos no mundo inteiro, para que sua
mercadoria, seja exportada ou importada, chegue mais rápido e mais barato,
exatamente o que os EUA e Inglaterra fizeram no início do século passado, que, na
verdade, é exportação de capital e importação de matéria-prima.
O projeto Rota da Seda está financiando e organizando investimentos em
mais de 100 países, passando pela África, Oriente Médio, Europa e América do
Sul. São grandes rotas de comércio e, para cada projeto, o governo chinês cria
uma Zona Especial de Livre Comércio nos países que aderem. Para financiar o projeto,
é criada uma nova instituição financeira, respeitando cada país, suas leis e
instituições financeiras. Por isso o banco Popular da China está interessando
em formar novos executivos para essa empreitada.
Esses empréstimos são bem diferentes dos empréstimos feitos tanto pelo
Banco Mundial como pelo FMI. O chinês não condiciona o empréstimo à mudança de
regime econômico, como faz o FMI em sua cartilha e como foi feito na América
Latina e, em especial, no Brasil, obrigando o país a privatizar diversas
empresas estatais. Eles condicionam o recebimento do empréstimo a recursos
naturais estratégicos para o país e também à exportação de produtos e
tecnologia das empresa chinesas, isso quando não exportam fábricas chinesas. O
FMI e Banco Mundial estão ligados à garantia do capital financeiro, e, na China,
prevalece o interesse nacional, o conceito de nação se sobrepõe ao conceito de
mercado.
Para concluir, na China também existem bancos municipais como o de
Shanghai que, por exemplo, financiou o metrô de Shanghai.