O carnaval e as escolas de samba do município

Mocidade de Miguel Pereira, Verde & Rosa, Sereno Serrano e Unidos da Praça da Ponte

 02/06/2023     Historiador Sebastião Deister      Edição 452
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As brincadeiras carnavalescas tão típicas do Brasil derivam do chamado entrudo português, que configurava o tempo de se comer carne em oposição ao período da quaresma quando se devia jejuar. Na realidade, o dia de carnaval propriamente dito é o domingo que antecede os quarenta dias pré-quaresma, juntando-se a ele, através dos tempos, a segunda e terça-feira imediatas.

As origens do carnaval remetem-se às mais antigas celebrações orgíacas da Humanidade, entre elas as chamadas saturnais romanas. Com o rolar dos tempos, o carnaval (palavra surgida da justaposição de carne nada vale por conta das liberdades que tais festas permitiam) foi ganhando outros contornos ligados à dança e à música, duplicando-se assim os divertimentos populares nos salões de bailes e, principalmente, nas ruas e avenidas de todas as cidades.

Brasil

No Brasil, ao longo dos anos, introduziram-se brincadeiras e folguedos representados pelo uso de fantasias e pelo entretenimento proporcionado pelo agradável duelo de confetes e serpentinas. Outras interessantes características do carnaval são os grupos de foliões de rua batendo bombos e tambores, exibindo roupas e trajes coloridos ou qualquer outra espécie de vestimenta e tocando elementos de percussão logo acompanhados dos tamborins, das cuícas e dos pandeiros, tudo destinado a manter o melhor possível o ritmo e a alegria adequados aos desfiles.

Com o passar dos tempos, foram sendo valorizadas e introduzidas nos desfiles as músicas alegóricas de carnaval, destacando-se, já em finais do século XIX, o aparecimento das marchas ranchos e logo em seguida o samba, cujo uso acabou por dar origem aos grupos organizados que então ganharam as denominações de blocos, cordões, corsos ou ranchos, todos embriões da atuais e famosas escolas de samba do país.

Rio de Janeiro

O carnaval do Rio de Janeiro sempre foi um modelo para todo o Brasil, tendo se transformado em tradição nacional e internacional até mesmo em elemento de captação econômica por atrair centenas de milhares de turistas de todo o Mundo que deixam no país altas somas de dólares e de outras moedas. Por outro lado, o carnaval acabou por se transformar em um fator de enorme inclusão social, visto que pelo seu caráter democrático, popular e livre ele põe de lado quaisquer outras manifestações preconceituosas e descabidas, agregando nos dias de folguedo pessoas de todos os gêneros, credos, origens familiares e etnias. Há no carnaval, de fato, um espírito lúdico de congraçamento humano quando diferenças pessoais e sociais são esquecidas em favor de momentos de alegria, de consolidação de novas amizades e até mesmo de relacionamentos mais íntimos e permanentes.

Com efeito, durante essa festa tão colorida e vistosa as pessoas são levadas a esquecer as desigualdades entre elas em favor de um convivência pacífica e solidária, o que as leva, mesmo que inconscientemente, a construir um universo de cidadania e respeito mútuo. A despeito de algumas querelas e dos inevitáveis desentendimentos que estouram entre os foliões pouco ajuizados, o carnaval talvez seja a manifestação humana que caracteriza, em sua plenitude, os vieses de incorporação social mais fortes e evidentes que trazem à tona o pleno exercício do indivíduo em seu direito de ir e vir, de festejar e se alegrar e, em especial, de praticar o prazer de criar novos campos de estima e de simpatia.

Com seu apelo turístico, o carnaval também proporciona a harmonia social e humana junto aos visitantes do país, estreitando assim laços de afeição entre os mais diversos tipos de pessoas, quando as dificuldades do idioma, as discrepâncias econômicas e os preconceitos acabam superados por momentos de muita diversão e empatia humana.

Miguel Pereira

Miguel Pereira já viveu momentos marcantes no carnaval, principalmente quando dos desfiles de suas escolas de samba pioneiras e hoje tão saudosas, cujas exibições sempre se caracterizavam pela qualidade dos sambas-enredo, pela grandiosidade e criatividade de seus carros alegóricos, e também da beleza e bom-gosto das fantasias de seus componentes. Lembremos em especial:

 

1. Mocidade de Miguel Pereira - Ficou eternizada pela alcunha de verde & branco. Pioneira na cidade, marcou época nos anos setenta pela grande qualidade de suas apresentações, abiscoitando, inclusive, muitos prêmios quando de desfiles competitivos promovidos pela prefeitura. Nasceu da iniciativa de alguns moradores do bairro São Judas Tadeu, e no seio de seus organizadores destacaram-se Silvio "Tundum", Tão, Paulo Policarpo, Lauro de Barros e o filho Dico, Guinha, Tio Jorge e sambistas admiráveis, tais como Neula, Iara Montezuma e Balengo.

 

2. Verde & Rosa - No rastro da verde e branco, surgiu uma escola inspirada na Mangueira do Rio de Janeiro, daí o nome, que buscou então fazer frente ao prestígio da Mocidade. Ali militaram vários membros da família Corrêa, entre eles Luizinho, Irene, Helena e apaixonados carnavalescos, como Zé Pretinho. Na verdade, a Verde & Rosa foi criada por diretores e atletas do Estrela, clube de futebol rival do Miguel Pereira Atlético Clube que, dessa forma, tentava se impor de forma lúdica e cultural na cidade.

 

3. Sereno Serrano - Surgiu no bairro Rio d'Ouro, em Portela. É crível dizer que o distrito de Portela, sempre pioneiro em suas atividades sociais, sentia-se desconfortável por não participar diretamente dos desfiles carnavalescos no município. Joel Rocha, "Déa" e Iara Calile e dezenas de outros personagens trouxeram para as ruas uma bela agremiação, que enriqueceu ainda mais as noites de carnaval em Miguel Pereira.

 

4. Unidos da Praça da Ponte - O título já cita o bairro de origem, nascendo por sugestão de João Carlos Barreto, o "Taubinha". Foi uma grande surpresa e uma agradável novidade. Apoiada integralmente pelo empresário Antônio Arantes Alves Filho, arregimentou toda a população do bairro, tornando-se rapidamente uma agremiação de imensa criatividade e de qualidade indiscutível, passando, inclusive, a ganhar vários títulos na cidade. Grandiosa em sua concepção e dispondo de ótimos meios financeiros, marcou época no município.

 

Infelizmente, todas as agremiações (e muitos blocos miguelenses) acabaram engolfados por problemas econômicos e outras mazelas sociais que sempre liquidam as iniciativas culturais das pequenas cidades do interior. O carnaval no município, hoje, não passa de um arremedo de festa popular, que cultua apresentações totalmente dissociadas do espirito recreativo dos grandes entrudos. Ao povo, agora, são oferecidas músicas apartadas dos verdadeiros ritmos carnavalescos, cuja comercialização de shows de qualidade duvidosa visam tão-somente aos interesses de alguns espertos empresários que passeiam pelo mundo midiático.

 

IMAGEM: Um passista-destaque da Unidos da Ponte

 

 

Na próxima edição: Padre Colombo e o Centro Juvenil São Carlos