Atriz Leila Diniz: de grávida na Praia de Ipanema, no Rio, ao resguardo em Miguel Pereira

Em Miguel Pereira, Leila Diniz e o prefeito Zé Nabo chegaram a sair para tomar cachaça, e o Sítio Diniz era lugar de descanso, além de ter servido de refúgio da repressão do golpe militar de 64

 10/07/2020     Cultura      Edição 300
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Leila Diniz frequentou muito Miguel Pereira. Segundo a irmã Regina: "Tanto meu pai Newton quanto minha irmã (Leila Diniz) gostavam do prefeito Zé Nabo. Leila  chegou a sair com Zé Nabo cachaça juntos". Seu Diniz (Newton) fez muita campanha para Zé Nabo, tanto para prefeito quanto para deputado estadual, quando Zé nabo se elegeu deputado, sendo cassado logo em seguida pela ditadura. Ambos eram do partidão.

A filha Janaína Diniz Guerra

E continua Regina: "Quando a Leila teve a Janaína, ela veio passar o resguardo aqui no sítio. Nós tínhamos uma vizinha que tinha uma vaca que deu muito leite para Leila amamentar a filha. Janaína, por sua vez, quando teve o filho Heitor, também veio para o sítio; aliás, Heitor tem muito da avó Leila Diniz", concluiu Regina.

A Praça Leila Diniz

A relação muito intensa do prefeito Zé Nabo com toda a família Diniz ficou aparente quando, na década de 80, Zé Nabo criou em uma área da prefeitura, em frente ao Sítio Diniz, a Praça Leila Diniz.

Sítio Diniz

Hoje o Sítio da família Diniz é comandado pelo médico Renato, marido da também médica Regina Diniz, irmã de Leila. O casal tem três filhos: Rafael, Ricardo e Renata, e todos adoram o sítio, que é o porto seguro onde toda a família se reúne. Tanto é que os casamentos dos filhos Ricardo e Renata foram feitos no sítio lotado de amigos que vieram de todo lugar - uma festa em grande estilo.

O pai Newton Diniz

Newton Diniz trabalhava no Banco do Brasil e se casou duas vezes. O primeiro matrimônio foi com Ernestina e o segundo com Izaura. Newton teve cinco filhos: Elio (1938), Eli (1939), Leila (1945), Regina (1949) e Lígia (1951).

O casamento com Ernestina durou pouco, por isso todos os filhos foram criados praticamente por Izaura. Segundo Regina, "não há diferença entre nós, nos falamos com muita frequência, o que acontece com um, todos ficam sabendo, é uma festa".

Newton também militava regularmente no Partido Comunista Brasileiro e, quando o golpe militar ocorreu em 1964, Newton achou melhor passar um período no Sítio Diniz, em Miguel Pereira.

O mito

O mito de Leila Diniz era - e é - tão poderoso que faz sentido dizer que no Brasil de hoje "toda mulher é meio Leila Diniz", e, aliás, esse é o nome do livro da escritora Mirian Goldenberg, um livro apaixonado e apaixonante sobre uma mulher carioca (Leila Diniz) que revolucionou os costumes no final da década de 1960 e os influencia até hoje.

Leila nos fez refletir sobre as mudanças e continuidades do comportamento conjugal e sexual - não só das mulheres, mas dos homens também - ao longo das últimas décadas. Leila Diniz revolucionou os costumes no final da década de 1960.

Dos 15 aos 27 anos

Ela viveu intensamente esse momento histórico e se tornou um mito porque ela se deixou julgar por um país inteiro para que ninguém mais fosse julgada por ninguém. "Sobre minha vida, meu modo de viver, não faço o menor segredo. Sou uma moça livre. A liberdade é uma opção de vida", dizia ela. 

A foto que correu o mundo - Leila estava esperando Janaína

Depois que o médico que acompanhava a gravidez de Leila disse que pegar sol na barriga fazia bem para a gravidez, a barriga que abrigou Janaína foi exposta ao sol, ao mar e às lentes do fotógrafo David Zingg. A beleza implícita da cena, daquele rosto aberto à vida, do biquíni e do barrigão de fora, hoje já faz parte da galeria de registros históricos do comportamento de uma geração. Foi uma foto que correu o mundo.

Leila Diniz quebrou tabus de uma época em que a repressão dominava o Brasil; escandalizou ao exibir a sua gravidez de biquíni na praia; e chocou o país inteiro ao proferir a frase: "transo de manhã, de tarde e de noite". Ela era considerada uma mulher à frente de seu tempo, ousada e que detestava convenções. 

Entre seus 15 e 25 anos, Leila foi invejada e criticada pela sociedade conservadora das décadas de 1960 e 1970. Ela falava de sua vida pessoal sem nenhum tipo de vergonha, pudor ou constrangimento. Concedeu diversas entrevistas marcantes à imprensa, mas a que causou um grande furor no país foi a entrevista que deu ao jornal O Pasquim em 1969.

Nessa entrevista, a cada trecho ela falava palavrões, e ainda disse: "Você pode muito bem amar uma pessoa e ir para cama com outra. Já aconteceu comigo". Depois dessa entrevista, o governo militar baixou um decreto instituindo a censura nos meios de comunicação (jornais, tv e rádio). Esse decreto foi apelidado de Decreto Leila Diniz.

1972, um ano que parecia mágico

Um ano após essa foto (1972), tudo parecia especialmente bom para Leila Diniz antes dela decidir embarcar para Sidney e acompanhar o Festival de Cinema da Austrália. Leila e o amigo Luis Carlos Lacerda embarcaram juntos nessa viagem dolorosa para a atriz que, pela primeira vez, deixou sua filha Janaína, de sete meses, aos cuidados do pai Ruy Guerra. Leila Diniz concorria ao prêmio de melhor atriz pelo filme Mãos Vazias, dirigido pelo amigo. Leila recebeu o prêmio de melhor atriz do festival e, em 13 de junho, enviou o seguinte cartão-postal para o Brasil: "Minha querida Janaina, hoje eu e meus amigos passeamos num lindo parque cheio de cangurus, coalas e outros bichinhos. Fiquei com uma vontade de ter você aqui comigo. Acho que daqui a dois anos nós vamos poder viajar juntas, conhecer os lugares mais lindos da Terra. Estou voltando logo, logo. Muitas saudades de você e do nosso querido Brasil. Beijo para você e para o seu paizão. Da mãe cangurua, Leila".

Comoção social

     No dia seguinte, Leila embarcou de volta para o Brasil, mas, quando o DC-8 da Japan Airlines sobrevoava Nova Déli, na Índia, ele explodiu. Era preciso se certificar de que era o corpo de Leila Diniz que se misturava entre os 78 passageiros e 11 tripulantes mortos, visto que apenas três crianças e duas mulheres foram as sobreviventes. Foi o advogado e cunhado Marcelo Cerqueira quem voou 40 horas para constatar: "Infelizmente era Leila. E, de repente, andando, eu vejo no chão do deserto, a 20 quilômetros, um papel. Abaixo e pego: era o diário dela. Veja que coisa! Diário que eu trouxe, nunca abri, e dei para o pai dela. Recordo-me que uma semana depois, quando fui visitar o pai, eu o vi lendo o diário, chorando e falando coisas. No diário, que existe, ela falava muito em Janaina". Com apenas 27 anos, Leila Diniz faleceu no dia 14 de junho de 1972. Até aquele momento, havia participado de 12 novelas e 15 filmes.

 

Janaína Diniz Guerra

Sobre a mulher e o biquíni: o exercício da cidadania em tempos de trevas

"Meu lugar, Janaína, filha de Leila Diniz, é a de uma filha do biquíni. É que eu fui uma barriga grávida exposta na praia, quando a barriga grávida era escondida porque era sinônimo do pecado e não devia ser vista. A barriga grávida no biquíni fazia lembrar o ato sexual que deu origem àquela barriga, que vem a ser o ato que gera a vida. Enfim, incongruências.

"O fato é que a moral exigia das mulheres dessa época o impossível: disfarçar uma barriga indisfarçável. Enfim, 47 anos se passaram desde que eu circulei em uma barriga e num biquíni que escandalizou um país moralista, de uma moral ditada pela ditadura militar". Texto completo em:

https://www.deixafalarmegafone.com.br/post/uma-fala-de-jana%C3%ADna-diniz-filha-de-leila-diniz-e-ruy-guerra-que-emocionar%C3%A1-a-todos


Depoimentos:

"Ela quebrou tabus e foi exemplo de uma geração. Gostaria de saber sobre o bebê que ela estava gerando nesta foto." (Heloisa Helena)

 

"Leila Para Sempre Diniz!" (Ubiratan Soares)

 

"A mais completa tradução da mulher carioca daquele final dos anos 60/início dos 70. Eterna musa de Ipanema." (Rodrigo Leite Póvoa)

 

"Mil anos luz à frente de sua época." (Valeria Tostes)

 

"Eu me lembro que quando engravidei em 1976, muitas mulheres ainda cobriam a barriga na praia, e eu, adolescente, me espelhei nela e fui à praia de biquíni - causei escândalo. A ovelha negra da família, grávida aos 16 e ostentando a barriga de fora." (Ana Vasconcelos)