A Fazenda Monte Ararat e o Barão de Mentzingen

Wilhelm Ludwig Raban von Mentzingen mudou-se para o Brasil em 1847 com cerca de 20 anos de idade.

 20/01/2023     Historiador Sebastião Deister      Edição 433
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Embora a maioria dos nobres senhores agraciados com títulos nobiliárquicos ao longo do século XIX tenha optado pelos territórios de Vassouras, Valença e Rio das Flores para implantar suas pioneiras atividades agropecuárias, também o Vale do rio Santana viu-se contemplado com a presença e os trabalhos de colonização de um representante da nobreza europeia, este de origem alemã, como tivemos a oportunidade de estudar em capítulos anteriores: Wilhelm Ludwig Raban von Mentzingen (em português, Guilherme Luís Raban de Mentzingen), nascido em 9 de fevereiro de 1827 no castelo Mentzingen, Kraichtal, conforme consta no Livro de Registros do Ano 1827 da Igreja Evangélica Luterana de Karsruhe, Baden, Alemanha.

É valido registrar que os Mentzingen, linhagem da qual o barão Wilhelm Raban foi o mais interessante de seus representantes no Brasil, tinham raízes cravadas no século XVI através do casamento do nobre casal holandês Barão Único Ripperda/Baronesa Judith van Twickelo. Por seu turno, Wilhelm apresentava parentesco distante com a famosa Rainha Vitória do Reino Unido (24.05.1819/22.01.1901), filha única e herdeira do Príncipe Eduardo, Duque de Kent and Strahearn, e da Princesa Maria Sachsen-Coburg-Saalfeld, uma vez que, na Inglaterra, os Mentzingen provinham do Freiherr (Barão) Georg von Khevenhüller III (1534-1587) casado em primeiras núpcias com Ana Thurzó de Bethlenfalva, enquanto a Princesa Maria, mãe de Vitória, nasceu do segundo casamento do Barão com Sibylla von Weitmoserl.

Assim, vale a pena relembrar que, de acordo com o Livro de Referência Histórica da Nobreza Alemã "Neues Allgemeines Deutsches Adels-Lexicon", Wilhelm era filho de Christian Ernst August Freiherr von und zu Mentzingen (nascido em Menzingen em 21 de junho de 1790) e de Antonia Freiin Leutrum von Ertingen (nascida em Augsburg, Baviera) em 2 de novembro de 1794. Christian era Freiheer (Barão) da família Mentzingen e sua mãe membro da linhagem nobre suábia dos Leutrum. Nascido em 1827, Wilhelm era o filho mais jovem, e teve como irmãos Otili (1816), Maria (1816), Hermann (1817), Mathild (1818), Constantin (1821) e Ernst (1823).

 

Brasil

 

Wilhelm Ludwig Raban von Mentzingen mudou-se para o Brasil em 1847 com cerca de 20 anos de idade. Na verdade, atraído pelo país e desejoso de se firmar na rica área agrícola e urbana de Vassouras, perecebeu que ali seria bastante difícil fazer frente aos poderosos senhores e barões que dominavam os trabalhos fazendários da região. Por essa razão, optou por se instalar no município de Iguassú (atual Nova Iguaçu), nas proximidades da então florescente Freguesia de Sant'Anna das Palmeiras, localizada no topo da Serra do Tinguá, que detinha guarda administrativa sobre a região conhecida como Bom Fim, aos pés da serra e irrigada pelo rio Santana, território que, de qualquer forma, era uma célula integrante do grande município de Vassouras. Na área adquiriu uma grande propriedade que batizou como Fazenda Monte Ararat, na qual pretendia cultivar o precioso e rentável café.

Por sua origem nobre e elevado patrimônio financeiro, passou a ser conhecido como barão, referência usada até os dias atuais por seus descendentes, embora nunca tenha recebido oficialmente da Coroa Brasileira tal título nobiliárquico. Porém, sendo filho de um Freiherr (Barão) alemão, foi contemplado com o direito também de usar o tal título no Brasil pelo fato de a nobreza alemã ser hereditária para todos os membros masculinos, prerrogativa, contudo, não reconhecida entre as autoridades brasileiras.

Casou-se com a brasileira Antônia Maria dos Santos (1842-1926) em 6 de novembro de 1857 na Fazenda Palmeiras, no Alto Iguassú, embora algumas fontes antigas da nobreza alemã dão o enlace como ocorrido em 16 de novembro de 1857. Antônia era filha do fazendeiro e agrimensor Antônio dos Santos e de Antônia Maria Ventura (ou Vieira)

Cumpre ressaltar que, à época, o Barão de Paty (Francisco Peixoto de Lacerda Werneck), à época, administrava várias propriedades no alto de Iguassú, inclusive a Fazenda Palmeiras, em cuja área tentara construir uma grande igreja junto à Vila de Sant'Anna das Palmeiras do Alto da Estrada do Comércio, empreendimento que, além de não se concretizar, trouxe-lhe sérios aborrecimentos e muitos prejuízos financeiros. De fato, cotejando algumas datas, infere-se que o agrimensor Antônio dos Santos comprara a Fazenda Palmeiras do Barão de Paty,

Sabe-se que Wilhelm, com o tempo, tornou-se um hábil engenheiro agrimensor, mensurando com sucesso muitas áreas pela região de Bom Fim e até mesmo em outros municípios. Assim sendo, é provável que ele, ainda jovem e cheio de planos, tenha aprendido a profissão com o sogro até então bastante requisitado no território de Sant'Anna das Palmeiras.

De fato, já em 1852 Wilhelm realizaria a medição topográfica da fazenda Campos Elíseos, em Valença, pertencente ao Coronel Peregrino José d'América Pinheiro, primeiro Barão e Visconde com Grandeza de Ipiabas. Seu trabalho foi tão bem aceito e elogiado pela família que em finais de 1883 também desenhou a planta completa do complexo fazendário da Campos Elíseos como parte do espólio do Visconde falecido em 8 de junho daquele ano. 

Em 22 de setembro 1877, Wilhelm organizou e liderou uma expedição com quarenta roçadores e tropeiros para revitalização de um caminho na Serra do Tinguá por onde passaria uma caravana liderada pelo então Príncipe Imperial do Brasil, o Conde d'Eu  (Luis Felipe Maria Fernando Gastão d'Orleans, 1842-1922), que visitava a família Werneck na área de Paty do Alferes. Além da melhoria da pequena estrada, ele balizou todos os limites geofisiográficos da fazenda Monte Líbano, propriedade administrada pelo bacharel Manoel Peixoto de Lacerda Werneck, filho do Barão de Paty do Alferes, onde a nobre comitiva pretendia pernoitar. Monte Líbano fora comprada em 1844 a Duarte José do Rego Gouveia, ficando, pelo inventário, para Manoel Peixoto.

 

Imagem: Fundos do casarão da fazenda Monte Ararat. Na gravura, familiares do barão de Mentzingen e alguns escravos (Arquivo: J.M Linhares)