A Ferrovia e a implantação da localidade
As origens de Arcádia - Parte 3
06/01/2023
Historiador Sebastião Deister
Edição 431
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Sua estação foi inaugurada em 29 de março de 1898
(125 anos), com horário de trens vigorando a partir do mesmo dia conforme
notícia veiculada pelo Jornal do Brasil de 28 de março, sendo sua titulação
derivada de uma antiga fazenda localizada nas proximidades da estação. Seria
digno de nota lembrar que a fazenda Bom Fim (como já vimos anteriormente) fora
criada e administrada pelo barão Wilhelm Ludwig Raban von Mentzingen,
fazendeiro que se instalara na região objetivando plantar o café já cultivado
com êxito no Vale do Paraíba.
Nascido na Alemanha em 1827, Wilhelm veio cedo para
a área de Vassouras, mas em vista da grande concorrência que encontrara naquele
território, decidiu-se pelo Vale do Rio Santana. Todavia, viu-se presa de
enormes dificuldades quanto ao envio do produto para o Rio de Janeiro por conta
da ausência de estradas de qualidade e do obstáculo representado pela falta de
transporte até a capital. De qualquer forma, persistiu em seu trabalho ao lado
dos filhos, e depois do advento dos trens conseguiu, por algum tempo,
deslanchar seus serviços agrícolas. Falecido em 1902, foi sepultado no
cemitério de Arcádia. Sua propriedade foi então negociada pelos herdeiros com a
família Portela alguns anos após sua morte, ocasião em que os novos donos
trocaram sua designação para Monte Ararat.
Em seu clássico livro sobre as estradas de ferro do
Brasil, Max de Vasconcelos consagrou a data de 29 de março como sendo,
efetivamente, o dia das solenidades de inauguração da nova parada de trens da
Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil. Entretanto, por motivos desconhecidos
o nome original veio a ser mudado para Arcádia nos anos entrantes de 1940.
Como dados interessantes sobre Arcádia, podemos
ainda citar os seguintes:
- Localização:
km 92,695 da Linha Auxiliar
- Altitude:
155 metros em relação ao nível do mar
- Uso
atual da estação: Sede do Programa Municipal Saúde da Família
Arcádia esteve sob a administração da Estrada de
Ferro Melhoramentos do Brasil entre os anos de 1898 e 1903. Desse ano até 1965
foi reconhecida como parte integrante da Linha Auxiliar da Estrada de Ferro
Central do Brasil. No interregno 1965 - 1975 passou para as mãos da Estrada de
Ferro Leopoldina, sendo então encampada pela RFFSA (Rede Ferroviária Federal
Sociedade Anônima) até 1996, ano que foi fechada por conta da desativação daquela
estatal.
Abastecimento
da Maria Fumaça
Estrategicamente construída no sopé da serra, a
modesta estação tinha por finalidade essencial fornecer às locomotivas e aos
vagões os meios seguros para a subida final dos trilhos que rasgavam as colinas
em busca de Vera Cruz. Ali, completava-se o nível dos reservatórios de água e
óleo da Maria Fumaça, abasteciam-se seus depósitos de lenha e lubrificava-se
cuidadosamente todo o seu complexo sistema de frenagem, além de se proceder a
uma criteriosa inspeção pelos vagões que formavam os comboios. Tais ações
preventivas eram de suma importância para os trens, pois se até Bom Fim eles
haviam vencido um leito quase horizontal, sem curvas e apresentando algumas
ladeiras menos íngremes, dali até Governador Portela impunha-se o inclemente
desnível das encostas das serras da Viúva e do Couto.
Com efeito, em Bom Fim um cuidado especial era
concedido às conexões hidráulicas de pressão e à lubrificação de todos os
elementos de sustentação dos componentes do comboio, além da supervisão do
funcionamento do sistema de freios e engates entre os vagões e verificação dos
recipientes de areia na parte inferior da locomotiva. Este material era
eventualmente espargido por sobre os trilhos para facilitar seu atrito contra
as rodas de ferro da locomotiva, em especial no caso de uma encosta mais agressiva,
de umidade excessiva em época de chuvas e mesmo quando dos dias mais frios no
alto das montanhas. No inverno, principalmente, o uso de areia nos trilhos,
despejada habilmente através de um bombeamento manual efetuado pelo maquinista
do interior da cabine da Maria Fumaça, era uma prática inteligente e
corriqueira sempre recomendada pelos administradores da ferrovia e gerentes de
tráfego - fosse em subidas mais fortes, fosse em declividades mais ásperas -,
uma vez que na serra a garoa dos constantes nevoeiros e o onipresente orvalho
noturno produzido pelas gélidas noites serranas em geral deixavam a superfície
dos trilhos extremamente escorregadia, fenômeno que por vezes interrompia a
subida de comboios em direção a Portela dando margem, muitas vezes, a pequenos
descarrilamentos quando de suas descidas para Arcádia.
Lembre-se que tais fenômenos prejudicavam tanto o
movimento das grandes rodas da Maria Fumaça que, entre Fragoso e Portela, havia
a chamada cremalheira, ou seja, um terceiro trilho central ajustado na bitola
normal entre os dois trilhos do leito férreo. Outra peça mecânica circular e
dentada fixada junto ao eixo frontal da locomotiva encaixava-se à cremalheira
e, em constante movimento rotacional, projetava a locomotiva à frente com
destreza e segurança.
Imagem:
Estação de Arcádia que hoje atende à Secretaria Municipal de Saúde de Miguel
Pereira
Na próxima edição: As Origens de Arcádia -
Parte 4: O Grande Armazém