"Miguel Pereira elege mulher e fixa poder feminino" - Parte 1
Dona Aristolina no Jornal do Brasil em 23.11.1970
23/09/2022
Política
Edição 416
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Niterói
(Sucursal) - O matriarcado, que causa apreensão em muitas áreas de Miguel
Pereira, ganhou novo impulso com a eleição da Sra. Aristolina Queiroz de
Almeida para a Prefeitura num município que já conta no Poder Judiciário, com a
presença de uma juíza, uma promotora e uma escrivã.
Depois
de confirmar a vitória da candidata da Arena, a juíza Maria Helena Pelegrineti
Lourenço, a promotora Hermezinda Rocha e a escrivã Novinda de Carvalho
Filgueiras foram juntar-se à Dona Aristolina e percorreram, numa caravana de 40
carros, seis ônibus e seis caminhões, as ruas da cidade, onde os maridos
assistiram surpresos à festa de serpentinas e confete, que se estendeu até a
madrugada de ontem.
Festejos
Um
clima de euforia e comemorações invadiu a cidade de Miguel Pereira, desde a
tarde de sexta-feira até a manhã de ontem, quando mais de 2 mil pessoas
acompanharam a "caravana das mulheres sábias", conforme começaram a
chamá-las os habitantes do município. Foguetes que explodiram, grupos de
sambistas, serpentina e muitos confetes marcaram os festejos.
Das
sacadas das residências, os maridos acompanharam a passagem das manifestantes e,
em muitos, o clima era mesmo de surprêsa diante da ocupação paulatina das mulheres,
não só do Judiciário e Legislativo, como agora até mesmo no Poder Executivo.
Vitória
A
prefeita eleita de Miguel Pereira concorreu pela Arena e teve como companheiro
de chapa (vice-prefeito) o comerciante Nélson Watanabe. O segundo candidato
mais votado foi o comerciante Ainaro Pereira Leitão, que obteve 2.010 votos,
enquanto Dona Aristolina Queirós de Almeida conseguiu 2.052.
Conhecedores
da política do município disseram que não será surprêsa se, nas próximas
eleições, as mulheres "concorrerem em massa aos cargos eletivos, pois cada
vez mais cresce a confiança depois da experiência bem sucedida no Judiciário,
da população em sua capacidade de liderança, e ninguém se espante se elas
iniciarem a invasão do Poder Executivo."
O início
Tudo
começou em Miguel Pereira, por volta de 1955, quando Dona Norvinda de Carvalho
Filgueiras foi designada para chefe do Cartório Civil. Nascida em Paraíba do
Sul, mas radicada em Miguel Pereira há 30 anos, logo nos primeiros anos, tornou-se
muito querida da população. Sua indicação para o cargo foi decorrência natural,
dizem os antigos moradores, dessa sua receptividade junto aos habitantes.
Tamanha
foi sua penetração e, de resto, seu prestígio, que, em 1955, era nomeada também
escrivã-chefe do cartório eleitoral, cuja zona conta com aproximadamente 6.000
eleitores.
A Juíza
A
juíza Maria Helena Pelegrineti Lourenço, mineira de Paraguassu, é mãe de cinco
filhos, numa faixa que vai de cinco a 13 anos, e foi designada para a comarca
em 1968. Antes de exercer as funções em Miguel Pereira, já atuara como
magistrada no município de Santa Maria Madalena, onde teve oportunidade,
segundo revela, de aplicar seus conhecimentos e aprender as primeiras lições.
Ela
mora em Barra Mansa e visita Miguel Pereira para cumprir suas funções três vêzes
na semana, e, em sua opinião, não há nenhuma incompatibilidade entre a condição
de juíza e de dona de casa, pois esse é um tabu que "precisa ser
superado." Dona Maria Helena Pelegrineti Lourenço entende que a
participação da mulher na vida pública "tornar-se-á cada vez mais
acentuada, principalmente em decorrência da sua presença nas
Universidades."
A Promotora
A
promotora Hermezinda Rocha, há quatro anos, exerce as funções no Estado do Rio,
mas, somente a partir de dezembro, foi designada para servir em Miguel Pereira.
Casada também, é mãe de duas filhas, e "queiram ou não, as mulheres tendem
cada vez mais a participar da vida pública."
-
A sociedade moderna, com toda a sua complexidade - diz - não pode prescindir da
participação feminina no mercado de trabalho, pois isso seria desastroso e
pouco inteligente. Queiram ou não os conservadores, os que pararam no tempo,
será crescente a figura da mulher, não só na área privada, como, de resto, nos
setores Executivo, Legislativo e Judiciário da nação.
A Prefeita
A
Sra. Aristolina Queirós de Almeida é, segundo habitantes de Miquel Pereira,
"uma campeã contumaz". Sua vida política começou em 1956, porque o
prédio onde ela lecionava estava em situação precária. Os moradores do distrito
de Governador Valadares [Portela], onde nasceu e mora até hoje, incentivaram-na,
e ela se candidatou a vereadora na primeira legislatura do município de Miguel
Pereira, que antes era distrito de Vassouras.
Foi,
na ocasião, a mais votada, e o seu mandato teve a duração de dois anos. Em 1958,
seu marido, o Sr. Corinto de Almeida, a substituiu, elegendo-se também em
primeiro lugar, mas garantem os antigos moradores que sua eleição foi obra e
graça da professora Aristolina Queirós, que, embora derrotada para a
prefeitura, jogou todo o seu prestígio em cima da eleição do marido.
A vocação
O
marido da prefeita recém-eleita, Sr. Corinto de Almeida, é uma figura muito
estimada na região e exerce, há 30 anos, a função de barbeiro. Faz política desde
1934, mas confessa que a vocação "maior reside em minha esposa, que dispõe
de mais habilidade, mais picardia e, sobretudo, conta com maior cultura geral,
o que é por demais importante para essa atividade."
Dona
Aristolina Queirós de Almeida é mãe de quatro filhos, o mais velho com 30 anos -
Luis Carlos de Almeida - e o mais novo - Clésio Ricardo de Almeida - com 15
anos. Em sua opinião, a mulher, no exercício da atividade pública, "dispõe
do dom de minimizar a agressividade masculina, pois nós, mais do que ninguém,
somos abertas ao diálogo.".
Programa
A
prefeita eleita Aristolina Queirós de Almeida, em sua plataforma política,
anuncia que "desenvolverá, principalmente, o turismo do município, que,
atualmente, se apoia numa falsa estrutura, uma vez que não oferece aos que
visitam Miguel Pereira o que êle muito bem pode dar.".
Não
alimento a vaidade - afirmou - de imaginar um programa de grandes
empreendimentos, mas tenho a certeza de que, com a cooperação de todos, poderei
tomar iniciativas e promover realizações fundamentais para todos, desde o mais
humilde trabalhador do campo ao homem que vive na cidade.