As origens do Miguel Pereira Atlético Clube
Primeira Parte - Nascimento
15/12/2023
Historiador Sebastião Deister
Edição 479
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Se o Portela Atlético Clube detém a primazia da
introdução do futebol em nosso município lá pelos idos de 1911, e o Miguel
Pereira Atlético Clube passou à História por ter sido um dos mais famosos e
admirados clubes sociais de nossa cidade, o Estiva - origem do atual Estrela
Futebol Clube - guarda a lembrança e o privilégio de ter sido o primeiro clube
de futebol da vila, justamente durante os anos em que ela perdia a denominação de
Estiva para se transformar em Professor Miguel Pereira.
Fundado em 4 de setembro de 1928, graças à união de
uma humilde, porém significativa parcela da população da vila, na qual
destacavam-se comerciantes, ferroviários e criadores de gado, o clube - então
sem sede, estatutos e sem dinheiro, representado unicamente por vinte e poucos
jogadores de futebol que desejavam medir forças com o Portela Atlético Clube -
conseguiu motivar e arregimentar para os seus quadros alguns dos mais
expressivos nomes da localidade na época, como Bonifácio de Macedo Portella,
Aurélio Barile, Geraldino Caetano da Fraga (Dino), Nagib Ahouage, Rigoletto
Cristofaro e Manoel "Manduca" Bernardes Sobrinho, todos muito preocupados com a
ausência daquele esporte no lugar e, certamente, roídos por uma justificável
inveja ao ver a ascensão do Portela Atlético Clube na região.
Durante dois anos, reinou na recém-batizada Miguel
Pereira uma forte unanimidade em torno do Estiva Atlético Clube, até porque
seus próceres assim deviam agir em contraposição direta ao prestígio
portelense. Em 1930, porém, uma incontornável divergência, envolvendo a escolha
da madrinha do clube, dividiu seus dirigentes. A situação mostrou-se muito
delicada, visto que o cargo de madrinha possuía uma dimensão social
extraordinária naqueles tempos de pioneirismo, sendo bastante ambicionado pelas
senhoritas da localidade, até porque havia entre os desportistas um acordo
tácito de anualmente renová-lo, dando assim oportunidade para que outras jovens
da vila ocupassem um posto tão prestigioso. Assim, naquele ano, os mais
influentes conselheiros do Estiva Atlético Clube indicaram para o ambicionado
cargo a senhorita Conceição Setúbal Ritter, irmã do Dr. Oscar Setúbal Ritter,
médico que frequentava Miguel Pereira com assiduidade e que também exercia uma
cargo na direção daquela agremiação.
Tal escolha causou um profundo desagrado à numerosa
família Bernardes, comandada por Manoel Francisco Bernardes Sobrinho, o
Manduca, que já demonstrara o desejo de ver sua filha, Maria Ramos Bernardes, a
Mariquita, ocupando solenemente aquela função social na cidade. Além do mais, a
primeira indicação fora feita à revelia dos Bernardes, e Manduca, seu
respeitado patriarca, jamais aceitaria uma imposição de tal natureza.
Esse choque de interesses provocou uma cizânia
irremediável nas hostes do Estiva Atlético Clube, -mesmo porque os demais
dirigentes eram tão teimosos quanto o próprio Manduca. O conflito durou alguns
dias e os dois lados não abriam mão de suas intransigentes posturas pessoais.
Assim, quando o nome de Conceição Setúbal Ritter foi plenamente referendado em
Assembleia Geral do Estiva, os Bernardes rebelaram-se em definitivo, e
aliando-se a Calmério Rodrigues Ferreira, o Juju - que, por sua vez, não via
com bons olhos a subida de prestígio de Dino Fraga -, decidindo então fundar o
Miguel Pereira Atlético Clube em 26 de abril de 1930.
Numa fria análise da
situação social que imperava na época, é válido afirmar que o nascimento do
MPAC se deveu basicamente à atitude vaidosa e ciumenta de Manduca. Homem
decidido, líder social naquela comunidade incipiente e desacostumado a ser
contrariado, ele jamais poderia admitir que uma decisão sua fosse contestada ou
recusada por outros homens do lugar. A nomeação de outra jovem da vila para
ocupar o posto de madrinha de um clube que ajudara a fundar foi tomada por ele
como uma ofensa pessoal e inaceitável.
Assim, dono de um imenso
prestígio na cidade, provido de recursos humanos e financeiros e sempre levado
pelo seu temperamento impulsivo, não lhe foi difícil aliciar vários outros
influentes comerciantes locais para segui-lo na calculada decisão de trazer à
luz outro clube de futebol, cuja madrinha, evidentemente, seria sua querida e
então desconsiderada filha Mariquita Bernardes.
Isto posto, podemos
asseverar que o MPAC não foi criado para atender às necessidades de existência
de um novo clube de futebol na cidade, mas sim para agasalhar o amor-próprio e
o orgulho atingidos de um único homem. De qualquer maneira, essa egoística
ostentação de Manduca acabou por beneficiar a emergente Miguel Pereira, pois
graças a seu irreversível comportamento surgiu na região outro clube social e
esportivo.
A primeira providência de
Manduca foi reunir em sua residência os homens que o haviam apoiado em sua
decisão de se desligar do Estiva Atlético Clube e alguns outros convidados
especiais, cujo prestígio na vila pudesse manter viva a sua ideia. Lá
compareceram Calmério Rodrigues Ferreira, o Juju, e seus irmãos Adalvet
(Vevete) e Alzino Tintas, Felipe Carvalho, Dr. João Alberto Masô, Antônio
Ferreira Real, Domingos Leitão, Francisco Peralta, Daniel Bernardes e dezenas
de outros solidários amigos.
O primeiro encontro, em
face da indignação reinante contra a diretoria do Estiva Atlético Clube - em
especial os adversários Geraldino Fraga e Bonifácio de Macedo Portella -, logo
transformou-se numa agitada assembleia, e de imediato os presentes procederam à
escolha da primeira diretoria do novo clube, cujas providências mais urgentes
objetivavam a formação de uma equipe de futebol e o planejamento da construção
de seu campo de futebol. Na próxima edição, relacionaremos os membros da
primeira diretoria do Miguel Pereira Atlético Clube.
IMAGEM: "Manduca"
Bernardes, um dos mentores da criação do MPAC.
Na próxima edição: Parte 2 - A Primeira Diretoria e
a Construção do Campo de Futebol