A Emancipação do município de Paty do Alferes
Memórias de Paty do Alferes - 16
07/06/2024
Historiador Sebastião Deister
Edição 503
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Desde 15 de janeiro de 1833 - data em que sua vila
passara para o domínio de Vassouras - os moradores de Paty do Alferes viam na
emancipação político-administrativa a única solução de seus problemas sociais e
de infraestrutura. Contudo, apesar de lutas pessoais e coletivas de muitos
moradores ilustres do lugar, um movimento separatista de tal natureza sempre
esbarrava em questões legais e encontrava nos chefes vassourenses um obstáculo
político difícil de ser ultrapassado, já que estes não admitiam sequer pensar
na possibilidade de ter seu vasto e rico território desmembrado em células
menores e autônomas.
De fato, nas esferas administrativas estaduais,
Vassouras combatia-se com intransigência a indesejada ideia de emancipação de
um de seus mais ricos territórios distritais, sempre minando a febre de
separação dos patienses, levando a cidade a amargar um século e meio de espera
para constituir sua própria célula autônoma. Embora frustrada, a população
nunca se deixou abater pelos reveses políticos que a cerceavam. Mesmo
abandonada por sucessivas administrações vassourenses, a vila buscou no
profundo alento trabalhista e na insuperável vontade de seu povo lutador os
meios seguros de prosperar financeiramente para assim se afirmar como unidade
municipal capaz de ter um desenvolvimento jurídico, social, cultural e político
totalmente seguro e independente.
Ao longo das décadas iniciais do século XX, a
população patiense foi se adaptando aos novos tempos, balizados, em especial,
pela decadência das antigas fazendas de café, já desmembradas em glebas menores
nas quais modestos grupos de lavradores tentavam manter suas culturas de
subsistência ou buscando, na zona urbana, negócios diversificados que se
mostrassem interessantes e lucrativos para suas famílias. Dessa maneira,
lentamente surgiram escolas, levantaram-se casas, fundaram-se clubes e
associações, inauguraram-se alguns hotéis e abriram-se diversos entrepostos
comerciais importantes, lavraram-se planícies e encostas e demarcaram-se
loteamentos inéditos e vistosos nas periferias de Paty e Arcozelo, atividades
que acabaram por incutir no seu povo um irreprimível sentimento nativista e um
intenso e imorredouro amor à terra, peculiaridades e virtudes que fazem dos
patienses, até hoje, a população mais ligada à produção rural entre todas as
demais que habitam a nossa antiga e histórica região serrana.
A despeito de alguns movimentos de emancipação
levados a efeito por Paty e Avelar em determinados períodos do século XX, nada
de concreto advinha para a cidade, pois a Câmara de Vereadores de Vassouras
abortava de pronto qualquer sugestão neste sentido. Cedo ou tarde, entretanto,
o divórcio político e administrativo teria de chegar. Afinal, a população
economicamente ativa da região já era numerosa, a arrecadação financeira -
sustentada principalmente pela produção agropecuária de vastas proporções, na
qual o tomate já exibia um destaque notável em todo o estado - superava todos
os parâmetros determinados pelas leis de emancipação e o número de eleitores já
ultrapassava o teto jurídico mais otimista.
Pressionada pela opinião pública, criticada pela
imprensa local e desprovida de argumentos sociais, políticos e econômicos
capazes de bloquear mais uma vez um plebiscito, a Câmara de Vassouras, enfim,
autorizou uma consulta popular que abrangesse os logradouros de Paty do
Alferes, Avelar, Pedras Ruivas, Palmares e Arcozelo, sendo agendado o domingo
de 6 de setembro de 1987 para o referendo.
Tal dia amanheceu melancólico e chuvoso, a lama tomava conta das ruas, o
vento atípico para a estação e o frio incomodavam a quase primavera serrana. A
Natureza não estava colaborando, a chuva assustava de vez em quando, mas nas
seções eleitorais espalhadas pelos bairros do futuro município chegavam os
eleitores a pé, a cavalo, de carroça, de bicicleta, charrete, e todos - pobres
ou ricos, ilustres figuras públicas ou simples filhos da terra, comerciantes,
lavradores ou pecuaristas, jovens e idosos, caminhoneiros ou colonos,
professores e donas de casa - levavam a esperança na alma e um pronto
convencimento aos indecisos: ali estava a certeza da liberdade e o passo
definitivo para o futuro. Numa inequívoca demonstração de civismo, educação e
democracia, o plebiscito transcorreu dentro da maior normalidade.
Ao final do dia, até mesmo os adversários políticos
cumprimentavam-se pela beleza daquele ato cívico e sentiam que, fosse qual
fosse o resultado, Paty jamais voltaria a ser a mesma cidade. Com efeito, ali
se instalara algo intangível que, em breve, mudaria sua face e seu estilo de vida.
Com o encerramento da votação, as urnas foram transportadas até a sede da
Associação de Amigos de Paty (AMIPA), daí seguindo para Vassouras.
Presidida pelo então Juiz de Direito da Comarca de
Vassouras, Dr. Paulo Nader, a apuração foi realizada no Dia da Pátria, 7 de
setembro. Nervosos e ansiosos, todos os presentes acompanharam o escrutínio no
Fórum vassourense, e às 13 horas anunciava-se, com justificada euforia, o
resultado da apuração.
O
resultado do plebiscito
Para delírio dos patienses e decepção dos
vassourenses contrários àquela causa, votaram 6.445 eleitores (sendo 5.266 em
Paty e demais bairros e 1.179 em Avelar), com o SIM obtendo 5.904 votos contra apenas 541 indicações para o
indesejado NÃO. A ruidosa festa de
comemoração começou ali mesmo, junto ao Fórum. Uma estrepitosa carreata partiu
então para Paty, atravessando inclusive terras de Massambará, Horizonte,
Fazenda das Antas, Avelar, Granja Califórnia e Arcozelo.
O 1º
Prefeito
No dia 15 de dezembro de 1987, a emancipação foi
definitivamente selada com a assinatura da Lei n° 1.254 sancionada pelo governador
Wellington Moreira Franco. A partir daí, o município de Paty do Alferes de
pronto mergulhou no processo de campanha política que acabaria por eleger, em
15 de novembro de 1988, Eurico Pinheiro Bernardes Junior como seu primeiro
prefeito, tendo como vice Alexandre Veiga Lisboa.
Imagem:
Centro de Paty anos antes da emancipação