A ditadura do orgasmo II

É normal não gozar?

 07/01/2022     Sexóloga Clarissa Huguet      Edição 379
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Vocês já sabem que o clitóris é o órgão sexual feminino que possui a função única e exclusiva de nos dar prazer.

Mas eu quero abordar a tão falada "ditadura do orgasmo". A capacidade prazerosa do nosso corpo é de fato incrível e concordo que devemos buscar sentir todas as sensações que nosso corpo pode nos proporcionar. Contudo, não é normal não gozar.

Todas nós, mulheres, sabemos que às vezes o orgasmo não acontece; seja na masturbação ou na relação a dois. Seja porque temos muitas preocupações na nossa cabeça e não conseguimos relaxar o suficiente, porque não estamos em um bom dia ou, simplesmente, porque falta autoconhecimento sobre nosso próprio corpo e zonas de prazer. Há ainda os casos em que não há mais qualquer conexão com a parceria e, mesmo nos empenhando, o ápice não acontece.

Assim, a anorgasmia (disfunção sexual que causa dificuldade ou incapacidade de chegar ao orgasmo) não é algo natural, por outro lado, também não é saudável que o orgasmo se torne uma obrigação. Mas por que tantas mulheres vivenciam essa dificuldade em atingir o ápice de prazer?

Pode-se atribuir ao tipo de criação que as mulheres recebem em um mundo dominado por homens? Mundo este de cultura machista e patriarcal onde imperam os tabus ligados à sexualidade feminina, o desejo de controle sobre nossos corpos, as normas sociais e a definição de formas como devemos nos comportar?

Sim, também há a falta de informação, as proibições e as características atribuídas ao gênero desde o nascimento, tudo isso faz com que muitas mulheres demorem para entrar em contato com o próprio corpo e a própria sexualidade, criando bloqueios e questões de ordem emocional. Assim, se te causa sofrimento não conseguir chegar ao orgasmo, estou aqui para te dizer que dá para mudar esta realidade. Seja a questão de ordem física e/ou psicológica, sempre há um caminho para que você acesse o seu potencial prazeroso.

 

Um caso prático

 

Vou trazer um caso prático que vivenciei em um dos meus atendimentos que irá ilustrar perfeitamente o que citei acima: a mãe de uma paciente é psicanalista e sempre se preocupou em ensinar a ela sobre seu corpo, métodos contraceptivos, menstruação etc. Porém, esta mulher com idade na casa dos 40 anos não sabia, até começarmos nosso trabalho juntas, que o clitóris é um órgão muito maior para dentro do corpo do que o que fica aparente para fora, que é apenas a glande e o prepúcio (capuz que cobre a glande).

Após esta paciente aprender sobre isto nas nossas sessões e ficar encantada com a descoberta, foi perguntar para a mãe dela o porquê de ela não ter ensinado sobre esta parte da anatomia tão importante. Sabem qual foi a resposta da mãe? Ela disse que não ensinou porque nunca soube sobre isso, ela, até aquele momento, ignorava como é de fato o clitóris. Na realidade, havia acabado de aprender com a filha dela que havia aprendido comigo.

Quando eu me tornei sexóloga e criei o Instagram @sexualize_se, percebi o nível de desconhecimento sobre coisas básicas como a anatomia do nosso próprio corpo. E para vocês compreenderem o grau de dificuldade, esta mãe acima citada nunca havia ensinado à filha porque ela mesma não sabia!

 

Para educar diferente, é necessário ter o conhecimento

 

Hoje, eu acredito que a geração atual, com tamanho acesso à informação, já deve atuar de forma diferente. E é por isso também que estamos aqui. Queremos ajudar a naturalizar o tema sexualidade e isso não se faz sem informação, troca e acolhimento. Apenas criando uma nova relação das mulheres com seus corpos, com muito mais conhecimento e naturalização do prazer, poderemos mudar a geração atual e futuras de novas mulheres que, além de saberem como ter um orgasmo, se orgulham dele.


Clarissa Huguet é bacharel em Direito, mestre em Direito Internacional pela Universidade Utrecht, pós-graduada em Educação Sexual pela Unisal e idealizadora do perfil no Instagram @sexualize_se - Contato (21) 99701-7225