O cavalo Mangalarga em Paty do Alferes
Memórias de Paty do Alferes
12/04/2024
Historiador Sebastião Deister
Edição 496
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Há várias versões - e até lendas - para a
denominação do famoso animal de montaria conhecido como "cavalo mangalarga".
A mais verossímil e historicamente plausível, segundo muitos pesquisadores dessa
raça, relaciona-se com a Fazenda Manga Larga, localizada em Paty do
Alferes. Seus primeiros proprietários eram ricos fazendeiros que,
impressionados com a beleza e qualidade de tais animais, adquiriram alguns
exemplares do criador Gabriel Francisco Junqueira, o 1º barão de Alfenas,
fazendeiro do Sul de Minas e deputado na Corte estabelecida no Rio de
Janeiro.
Eventualmente, os proprietários da Fazenda Manga
Larga visitavam a capital montando seus belos e elegantes cavalos. Quando
alguém se interessava pelos animais, eles indicavam as fazendas do Sul de Minas
(em especial aquelas instaladas na área do município de Cruzília) como sendo as
grandes produtoras iniciais da raça, mas com o tempo a denominação Manga Larga
tornou-se uma referência única para a fazenda de Paty (que estava bem mais
próxima do Rio de Janeiro) e para os animais que ali eram criados com
esmero e excelente pedigree.
De qualquer modo, sabe-se que a raça mangalarga marchador
é tipicamente brasileira e surgiu no Sul de Minas, através do cruzamento de
cavalos da raça Alter - trazidos da Coudelaria de Alter do Chão, em
Portugal - com éguas selecionadas pelos criadores daquela região mineira,
principalmente Gabriel Francisco Junqueira. A base de formação dos cavalos
Alter é a raça espanhola Andaluza, cuja origem vem de cavalos nativos da
Península Ibérica. Quando Portugal foi tomado pelas tropas francesas de
Napoleão Bonaparte, inúmeras fazendas de criação de cavalos da raça Alter,
inclusive a Coudelaria Alter do Chão, foram saqueadas. Ao abandonar
Portugal por conta de sua invasão, D. João VI trouxe para o Brasil alguns dos
melhores exemplares da sua Coudelaria. Por outro lado, dos espécimes que vieram para o Brasil descende
o garanhão Sublime, considerado o marco inicial da raça mangalarga marchador.
Algumas pesquisas contam que, em 1812, Gabriel
Francisco Junqueira, o barão de Alfenas, teria recebido como presente do
Regente D. João VI o garanhão Sublime.
Gabriel Francisco teria usado esse reprodutor em suas éguas na Fazenda Campo
Alegre, no Sul de Minas, daí resultando a base do que viria a ser o mangalarga marchador.
Desde o início dos seus trabalhos de seleção, Gabriel Francisco Junqueira levou
em consideração o andamento cômodo, a resistência, a frugalidade, a rusticidade
e o brio dos animais de sua criação. Naquela época, como o cavalo era o único
meio de transporte no Brasil, a notícia da existência de cavalos de marcha
segura e resistente na Fazenda Campo Alegre despertou um grande interesse em
todo o Sul de Minas e em parte do Rio de Janeiro (aí se incluindo Paty do
Alferes), e vários criadores adquiriram animais do barão de Alfenas.
A Sesmaria de Manga Larga
Nascida ao longo do Caminho Novo de Minas, a
Sesmaria de Manga Larga (palco da futura Fazenda Manga Larga de Baixo) foi
doada em 29 de outubro de 1715 a José Mendes de Carvalho, a quem, em 23 de maio
de 1735, associou-se Francisco Gomes Ribeiro, "o Moço". Em 23 de maio de
1725, Francisco ligou-se então a José Mendes de Carvalho e assumiu de vez toda
a Manga Larga, em cujos domínios seria erguida a fazenda e surgiria, anos
depois, a criação dos ótimos animais de marcha batizados com o mesmo título do
patrimônio deixado por Francisco: o cavalo mangalarga.
Cabe aqui lembrar que a designação Manga Larga
(grafada documentalmente em termos isolados quando se refere a terras e
propriedades e aglutinada ao mencionar o cavalo) foi bastante utilizada no
século XVIII pelos sesmeiros agraciados pela Corte, especialmente aqueles
alocados no reverso da Serra do Tinguá.
Em 1853, o Sargento-mor José Maria de Guadalupe,
então proprietário da fazenda, vendeu parte da Manga Larga de Cima ao
Comendador Francisco das Chagas Werneck, seu primo direto, traçando assim uma
linha divisória com a cachoeira da Manga Larga, porém mantendo a Manga Larga de
Baixo sob sua administração direta.
Francisco, entretanto, pouco tempo permaneceu na
propriedade em virtude de sua idade já avançada, repassando-a três anos depois
a seu filho José Inácio dos Santos Werneck, casado com Carolina Isabel Peixoto
de Lacerda Werneck, a quinta filha do 2° barão de Paty do Alferes (Francisco
Peixoto de Lacerda Werneck). Em 1859, as terras da Manga Larga foram compradas pelo
2º Barão de Paty, que ali implementou vastas plantações de café, agregando-as
ao cultivo já bastante lucrativo das demais propriedades que possuía. Por outro
lado, a criação dos famosos cavalos mangalarga manteve-se em atividade, e a fazenda
passou à História como um dos centros mais capacitados na produção destes
animais. Tal atividade somente perdeu fôlego após a morte do barão, em 22 de
novembro de 1861, e especialmente depois da Abolição da Escravatura, quando a
família Werneck entrou em declínio financeiro em face da perda da qualificada
mão-de-obra escrava.istóia comomum dos
centos mais qualificadosHistória
Primeira usina de energia elétrica da região
Daí para frente, o complexo fazendário conhecido
como Manga Larga passou por várias mãos abrigando algumas famílias e chegando
ao século XX tão-somente como uma pálida lembrança de seus gloriosos tempos de
produção. A pioneira Manga Larga de Baixo foi sendo lentamente deixada de lado,
entrando em deterioração e quase desaparecendo dos ares patienses. Por outro
lado, a Manga Larga de Cima conheceu um período melhor entre os anos 1920 e
1930. Com efeito, nessa época os empresários Dr. Ângelo Lagrotta e Edmundo
Peralta Bernardes, aproveitando a cachoeira formada pelo rio Manga Larga junto
ao imóvel, ali implantaram a primeira usina de energia elétrica da região
batizada como Companhia Força e Luz Vera Cruz, inaugurando-a em 27 de junho de
1927. Durante muitos anos, a empresa forneceu energia para as áreas de Paty,
Miguel Pereira e Governador Portela, só desaparecendo após a grande enchente de
26 de março de 1945 que destruiu totalmente suas pioneiras instalações. Por
conseguinte, a companhia transferiu-se para o logradouro de Vera Cruz, em
território de Miguel Pereira, ali executando seus serviços até 1976, quando
então foi encampada pela Light.
Atualmente, a Manga Larga
de Cima constitui um hotel moderno e de excelentes instalações, ao passo que a
Manga Larga de Baixo ganhou uma restauração estrutural e arquitetônica completa
e modernizante, constituindo hoje uma célula de um parque turístico, hoteleiro
e ecológico de largas proporções e muito bom gosto no coração da cidade de Paty
do Alferes
O mangalarga reúne todas as qualidades desejadas em um cavalo de sela,
como docilidade, versatilidade, rusticidade, resistência e boa morfologia. No
entanto, o grande diferencial desta raça genuinamente brasileira está no seu
andamento, conhecido como marcha trotada. Afinal, é esta característica que
permite ao mangalarga conjugar a agilidade dos equinos de trote com a
comodidade dos animais marchadores. Tais qualidades proporcionam ao mangalarga
uma grande aptidão tanto para o trabalho como para o esporte e o lazer. Nas
fazendas, seu andamento e bom temperamento são características muito apreciadas
pelos peões, pois possibilitam que os trabalhos sejam realizados de uma forma
ágil e eficaz, com menor desgaste tanto para o cavaleiro como para a montaria.
Imagem: Cavalo Mangalarga