Arraial de Sebolas e Santuário de Matosinhos

Sebollas tem suas origens calcadas em 1723

 14/12/2024     Historiador Sebastião Deister      Edição 515
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No município de Paraíba do Sul, o arraial de Sebollas tem suas origens calcadas em 1723, ano em que o reinol Francisco Fagundes do Amaral e sua mulher Águeda Gomes de Proença - irmã do Major Bernardo Soares Proença, construtor da estrada batizada cono Variante do Proença - receberam uma freguesia junto ao rio que logo depois foi batizado como Fagundes em homenagem àquele desbravador.

Anteriormente, entretanto, o local já era conhecido por esse curioso topônimo, uma corruptela da palavra "Sipollas" que, na língua provençal do Sudeste da França, na Idade Média, significava "região de lendária beleza e fertilidade, habitada por gente feliz." A lenda corrente na época dá conta de que alguns aventureiros, após passar por aquele local, acharam-no tão belo que o consideraram um verdadeiro eldorado em meio àquele sertão inóspito, logo consagrando-o como Sant'Anna (escolhida como padroeira) de Sipollas.

Lenda ou não, o fato é que a Freguesia incorporou essa inusitada denominação, e pela ligação de descendentes de Francisco e Águeda com os imigrantes Leandro Barbosa de Mattos (chegado de São João de Meriti) e Francisco Gonçalves Teixeira (vindo do Minho), formaram-se ali os troncos das três famílias fundadoras do arraial. Importante ainda a registrar é que a irmã de Leandro Barbosa de Mattos - D. Mariana Barbosa de Mattos - vinha a ser esposa de Francisco Gonçalves Teixeira, e esse casal aglutinou seu nome, em definitivo, ao crescimento daquela pequena vila.

Posteriormente, pelo casamento de José Antônio Barbosa Teixeira com a viúva do imigrante mineiro Antônio Barroso Pereira (ali estabelecido no ano de 1780) fundiram-se de vez as famílias que enfim tiveram o privilégio de criar um dos maiores latifúndios da região.

A primeira capela de Sebollas foi construída por Provisão de 1 de setembro de 1769 graças a um requerimento enviado por Caetano Borges da Costa e Francisco Gonçalves Teixeira ao Governo da Província, ganhando assim a imediata condição de Curato.

Pelo Decreto-lei nº 153, de 7 de maio de 1839, o Governo Provincial elevou Sebollas à categoria de Freguesia, anexando-a como Capela Filial do Milagroso Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, de Sardoal. Por seu turno, a Lei nº 2.999, datada de 3 de dezembro de 1869, mudava o nome de Santana de Sebollas para Santana de Tiradentes, concorrendo para tanto os trabalhos legislativos desenvolvidos pelo vereador Dr. Leopoldo Teixeira Leite e pelos deputados Diocleciano Alves de Souza e Sebastião Modesto.

Todavia, o termo Sebollas não seria apagado tão rapidamente da memória dos moradores locais. Apesar de todos os movimentos legislativos buscarem fixar a designação de Santana de Tiradentes para aquele logradouro, ele continuou a ser chamado de Sebollas, muito embora toda a população paraibana reconhecesse o mérito de ali se perpetuar o nome de um brasileiro tão ilustre quanto o fora o grande Alferes. Tempos depois, o Decreto estadual nº 641, de 15 de dezembro de 1938, mudava o quadro territorial a vigorar no quinquênio 1939-1943, alterando ao mesmo tempo o topônimo do lugar. Com isso, o Distrito de Santana de Tiradentes era rebatizado então com a designação de Distrito de Inconfidência, arrolado na Prefeitura Municipal como 3º Distrito do Município de Paraíba do Sul.

Francisco Fagundes do Amaral faleceu em 1732, sendo sepultado na Paraíba - ou mais exatamente no cemitério do adro da capela de Nossa Senhora da Conceição, na Ilha, levantada no ano de 1715. Por sua vez, sua esposa Águeda veio a falecer em 1740, tendo sido seu corpo inumado no cemitério da Fazenda de Sebollas, o mesmo que, em 1792, receberia parte do corpo de Tiradentes.

Em tempo, devemos registrar que Tiradentes costumava hospedar-se no sobrado de Sebollas, de propriedade de D. Mariana Barbosa de Mattos, quando de suas andanças em serviço de patrulha por aqueles históricos caminhos. Após seu horrível suplício, os despojos de Joaquim José da Silva Xavier foram distribuídos, em mórbida exposição, junto aos pontos mais importantes e visíveis do Caminho Novo de Minas, para assim desestimular futuros conspiradores. Coube a um tosco mastro de madeira, cravado próximo à antiga Capela de Santana de Sebollas alocada no interior do cemitério do arraial, receber uma perna do Mártir da Inconfidência, para ali enviada pelo próprio vice-Rei D. Luiz de Vasconcelos. Transcorridos vários dias, e estando o membro em avançado estado de decomposição, os filhos de D. Mariana, em altas horas da noite, fizeram-no descer do poste de onde pendia e de pronto sepultaram-no dentro da capela, com as exéquias sendo proferidas pelo padre Manuel Barbosa, irmão de D. Mariana.

Hoje, tantos os restos mortais de Tiradentes quanto uma coroa e um cetro que ele pretendia doar como voto de fé ao Divino Espírito Santo encontram-se sob a guarda do Museu Sacro-Histórico do Distrito de Inconfidência, inaugurado em 21 de abril de 1972 pelo governador do estado do Rio, Raymundo Padilha, e pelo senhor Nelson Aguiar, então prefeito de Paraíba do Sul, como parte das comemorações do sesquicentenário da Independência do Brasil.

O Museu Sacro-Histórico de Inconfidência consta hoje da Igreja de Nossa Senhora de Santana de Sebollas, do marco erigido pelo Exército em homenagem a Tiradentes, da placa comemorativa dos 150 anos de Independência do Brasil e do Museu Histórico propriamente dito, tudo sob a administração da Prefeitura de Paraíba do Sul.

Sebollas foi também o berço do Coronel Luís Alves de Freitas Belo, que emigrou para Monte Serrat e veio a ser o avô do Duque de Caxias. Ali ainda surgiram os Cerqueira Leite, família formada pelo casamento de Manuel Cerqueira de Souza e D. Maria Leite, oriundos de Fervença, no Minho.

Quanto a Matosinhos, devemos lembrar que a devoção prestada ao Bom Jesus Crucificado sempre foi uma atividade religiosa firmemente arraigada aos típicos e seculares costumes dos camponeses de Portugal. Nada mais natural, portanto, que lá pelos anos quarenta do século XVIII alguns imigrantes chegados da Vila de Matosinhos, situada nas cercanias da cidade do Porto, trouxessem para o Sertão da Paraíba a liturgia por eles celebrada na pátria-mãe, erguendo nas faldas orientais da Serra da Sucupira uma pequena ermida dedicada ao Bom Jesus. Assim, de 1773 em diante aquele Curato, com um peculiar esboço de santuário, passou a se caracterizar pelo hábito de romarias e pagamentos de promessas, devendo-se a Pedro da Costa Lima o início das atividades religiosas mais elaboradas do templo.

A modesta capela, consagrada em 1773, serviu a todos os habitantes da região de maneira bastante adequada até 1862, quando foi então substituída por um templo maior levantado por Martinho Álvares da Silva Campos (1816-1887), proprietário da Fazenda do Engenho de Matosinhos de Sardoal (fundada em 1818 para produzir açúcar). Famoso líder do Partido Liberal, Martinho chegou ao cargo de Chefe de Ministros do Império no ano de 1881.

Credita-se ao padre italiano Luigi Raymondo (1912-1992) - para quem foi erigida uma estátua próxima à fonte de água do santuário - a atual e belíssima Igreja de Matosinhos, na qual realizam-se missas e batizados todos os domingos. Localizado a 19,5 quilômetros do centro de Paraíba do Sul, o Santuário - que pode ser acessado por estrada asfaltada - recebe dezenas de milhares de romeiros e fiéis em sua festa anual, realizada sempre no último domingo de agosto.