O Caminho novo de Minas

O Caminho Novo foi a primeira via de penetração do vale do Paraíba em sua seção sul fluminense e também das terras existentes no reverso da Serra do Tinguá.

 17/03/2017     Historiador Sebastião Deister      Edição 129
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Aberto entre 1700 e 1709, o Caminho Novo de Minas - assim denominado em contraposição ao antigo Caminho Velho que ligava São Paulo de Piratininga às Minas Gerais - tinha por objetivo principal estabelecer uma via de comunicação mais rápida e segura entre as ricas regiões auríferas do interior brasileiro e a cidade do Rio de Janeiro. Sua construção somente se tornou possível graças à coragem e à visão do bandeirante Garcia Rodrigues Paes, filho de Fernão Dias Paes, o famoso caçador de esmeraldas, em atenção a um pedido do então Vice-Rei de Portugal, D. Luís de Vasconcelos, que desejava não apenas encurtar as viagens entre as duas províncias, mas também evitar o trecho marítimo de interligação por Parati, sempre vítima de pirataria.

Organizando um canteiro de obras junto a um remanso do rio Pará-ibá em 1683, na grande esplanada onde hoje aparece a cidade fluminense de Paraíba do Sul, Garcia (então com apenas vinte anos) e seus comandados ali permaneceram por quinze anos consolidando os planos para sua notável empreitada. Em 1698 começou a abrir a picada que no tempo ficou conhecida como Caminho dos Cataguases e se destinava ao Rio de Janeiro. Comprometera-se com o Governador Artur de Sá e Meneses a colocar tais pontos em comunicação por meio de pouco mais de um mês de viagem e não três meses, como até então se despendia a partir de São Paulo. O ponto central de tal via era a Borda do Campo, hoje Barbacena, e em fins de 1699 concluiu uma estrada que ele próprio chamou de picadão. Consumindo nesse serviço quase todos os seus recursos financeiros, em carta de 10 de julho de 1701 deu conta ao governo sobre esse caminho, solicitando parte do pagamento acordado. Daí em diante, e até 1704, precisou se valer do trabalho de dezoito escravos do seu cunhado Domingos Rodrigues da Fonseca Leme e de grupos de índios puris que habitavam a região da Paraíba.

Em função do seu serviço, Garcia foi nomeado por Provisão Régia de 19 de abril de 1702 para o posto de Guarda-Mor das Minas, porém tal cargo não o obrigava a se afastar da empresa do Caminho dos Cataguases, porque a nomeação lhe outorgava o poder de designar guardas-mores distritais. Teve o privilégio da passagem dos rios Paraíba e Paraibuna (uma espécie de pedágio da época) e o título de Fidalgo da Casa Real por carta de 27 de março de 1702. Em 1703 foi também nomeado Administrador das Esmeraldas e teve mercê de qualquer vila que criasse. Em 1709, nova carta régia reconhecia e louvava os serviços que até então ele havia prestado ao Reino.

Ao se voltar para o caminho que devia seguir para o Rio de Janeiro, sua primeira providência foi rasgar uma variante que desembocava no chamado porto do Pilar (um pequeno afluente do Rio Iguassú), em terras hoje formadoras da cidade de Duque de Caxias. Dali, as mercadorias eram transportadas pela baía de Guanabara até seu desembarque à altura da Pavuna, para então continuar em direção ao centro da capital.

Numa segunda jornada de trabalho, Garcia seguiu de Paraíba para Minas, fazendo sua estrada penetrar por aquela província até atender Vila Rica (Ouro Preto), Mariana, Diamantina e outras cidades produtoras do cobiçado ouro. Assim, o Caminho Novo ou Caminho dos Cataguases reduziu as viagens entre Rio e Minas para apenas 35 dias, ao contrário dos 95 penosos dias consumidos pelas estradas que partiam de São Paulo. A promessa do bandeirante (patente datada de dezembro de 1683 e registrada na Câmara de São Paulo em 20 de janeiro de 1686) estava, portanto, devidamente cumprida.

O Caminho Novo foi a primeira via de penetração do vale do Paraíba em sua seção sul fluminense e também das terras existentes no reverso da Serra do Tinguá. Por conseguinte, um vastíssimo território acabou por ser beneficiado por essa estrada, em cujas margens nasceriam pousos de tropeiros, fazendas, arraiais, vilas e freguesias tais como Paraíba do Sul, Três Rios, Monte Serrat, Comendador Levy Gasparian, Werneck, Avelar, Fazenda Pau Grande, Fazenda da Piedade, Fazenda da Freguesia, Paty do Alferes, Nossa Senhora do Pilar, Iguassú (no seu flanco fluminense) e Congonhas do Campo, Barbacena, Santos Dumont, Fazenda do Juiz de Fora, Matias Barbosa, Simão Pereira e Paraibuna (pelo lado mineiro), entre tantas outras importantes e históricas localidades.

Com o passar dos anos, outros atalhos e estradas vicinais foram fendidos pelos montes e várzeas a partir do Caminho Novo. Por consequência, emergiu pelo vale do Paraíba e pelas serranias do Tinguá uma grande teia de veredas que iria proporcionar a fundação de dezenas de enormes fazendas e o nascimento de diversas vilas, entre as quais podemos lembrar Vassouras, Santa Cruz de Mendes, Rodeio, Barra do Piraí, Barra Mansa, Rio das Flores, Valença e o povoado de Barreiros (futura Miguel Pereira)...

Atualmente, a maior parte do pioneiro Caminho Novo adormece sob camadas de asfalto, mas em determinado trechos mineiros e em áreas periféricas de Paty do Alferes e Miguel Pereira é possível percorrer o solo tricentenário daquela notável obra de colonização.

Na próxima edição: A Variante do Proença