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A liberal Coreia do Sul
Um elemento importante no desenvolvimento da Coreia do Sul é o setor financeiro. Todos os bancos são públicos. Na Coreia, banco privado não tem a menor relevância.
Edição: 417
Data da Publicação: 01/10/2022
Quando os EUA ocuparam a península da
Coreia, no período pós-colonização japonesa, a primeira coisa que eles fizeram
foi privatizar e desnacionalizar o sistema financeiro. Quando o presidente Park assumiu o
poder na Coreia do Sul, em 1961, uma das primeiras medidas foi estatizar e
nacionalizar o sistema financeiro coreano. Em seguida, Park criou quatro bancos
de desenvolvimento que existem até hoje. O primeiro foi o Banco KDB - Banco de
Desenvolvimento Sul Coreano, que financia grandes projetos de desenvolvimento e
é um dos maiores do mundo em termos de ativos, e o Banco Kenix, que estimula as
exportações e financia as importações, principalmente quando a Coreia precisava
importar para negociar a transferência e internacionalização de tecnologia, desenvolvendo
sua indústria. Hoje, o Kenix é fundamental para estimular mais a inserção
internacional das empresas Coreanas no mundo. O banco KDI - Banco de
Desenvolvimento Industrial tem com finalidade dar suporte às pequenas e médias
empresas ante os grandes conglomerados nacionais. Em seguida, a Coreia do Sul
cria mais quatro bancos, dessa vez, bancos comerciais, e o mais importante é o Banco
Shinhan.
Até então, as grandes empresas
coreanas nunca puderam participar do sistema financeiro, pelo menos até os anos
80, mas, depois de forte pressão do Banco Mundial e do FMI para que a Coreia do
Sul privatizasse o sistema público financeiro e abrisse o mercado para as
empresas estrangeiras, a Coreia cede, faz uma reforma, e alguns bancos foram
privatizados, mas ela não aceita privatizar todo o sistema financeiro e as
grandes indústrias do país.
Entretanto, por lei, somente empresas nacionais
puderam participar da privatização, empresas do grande capital, como Samsung,
Hyundai, LG etc., ou seja, alguns bancos deixaram de ser públicos, mas não
deixaram de ser nacionais. E, apesar da pressão, o mercado não foi
desnacionalizado e o governo manteve os grandes conglomerados construídos com
financiamento estatal e reserva de mercado.
Até hoje, a Coreia do Sul tem um
sistema público financeiro muito forte e muito relevante. Tudo isso prova que o
"demônio público" não é tudo que se fala. É o setor público que desenvolve o
país. Quando os liberais falam que foi o "mercado que fez", está lá a mão
invisível do estado fazendo a infraestrutura para o desenvolvimento do país e
correndo riscos no setor de pesquisa, ciência e tecnologia. O resto é blá, blá,
blá e muita hipocrisia.
Concluindo sobre o "liberalismo" da
Coreia do Sul, o atual presidente do país, Yoon Suk-yeol, que se
elegeu com o discurso liberal, redução de tarifas, estatização de empresas
públicas etc., quando tomou posse, viu que a realidade era outra. Hoje, em
função da crise e do processo inflacionário, teve que congelar as tarifas de
energia, para que as empresas não perdessem a competividade. Vale lembrar que o
setor elétrico do país é formado por empresas estatais. Subsidiou as pequenas
empresas e os desempregados (que hoje, o desemprego no país, está em apenas
3,4%). O cenário interno não está fácil para ele.
Enquanto isso, no Brasil, nos últimos
dois governos (Temer e Bolsonaro), tenta-se desmontar o único banco de fomento
que o país possui, o nosso fantástico BNDES. Não satisfeitos com a tentativa,
desejam transformar os dois maiores bancos brasileiros, Banco do Brasil e Caixa
Econômica Federal, em bancos privados, fechando agências Brasil afora. Mas, para
esses, a resposta virá domingo nas urnas.
Quem desejar conhecer mais sobre esse
assunto, indico o economista brasileiro Uallace Moreira, que, atualmente, mora
na Coreia do Sul, e o trabalho de Lavinia Barros de Castro sobre o "Financiamento
do desenvolvimento: teoria, experiência coreana (1950-80) e reflexões
comparativas ao caso brasileiro".