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O que os presidentes marechal Castelo Branco e Abraham Lincoln têm em comum?

A reforma agrária é um instrumento da burguesia e não do pobre. Por quê?

Edição: 453
Data da Publicação: 10/06/2023

Os EUA não são um país rico por acaso. Muitos fatores contribuíram para o que o país é hoje. Um deles foi a reforma agrária, feita logo após o fim da escravidão, que aconteceu com a vitória do norte sobre o sul na guerra civil de 1860 a 1865. Foram mortas cerca de meio milhão de pessoas. Em seguida, o presidente norte-americano Abraham Lincoln fez a lei da reforma agrária, que consistia na concessão de 100 acres para cada família, nem mais nem menos.

 

O PIB americano era menor que o do Brasil

 

O PIB americano, em 1865, era menor que o do Brasil. Sua agricultura era menor que a brasileira. O que diferenciou foi que eles fizeram a reforma agrária (e nós não), democratizaram o acesso à terra, distribuíram terras para 13 milhões de famílias, (se hoje esse número é grande, imagina naquela época), 13 milhões de famílias estavam "a ver navios" e, com a reforma, passaram a produzir trigo, milho, virando uma pujança e que, inclusive, financiou a industrialização estadunidense, de que Abraham Lincoln era representante e que fizeram a guerra contra o sul escravista.

Os agricultores norte-americanos receberam 100 acres de terra (404.686 m²). Em seguida, precisaram de tratores para lavrar a terra. Pois é, de tratores e implementos agrícolas. A indústria, então, começou a vender milhões de tratores e alimentou a indústria do norte, que deu um salto de qualidade, quantidade, geração de empregos e impostos.

 

O Brasil e suas dificuldades

 

Em 500 anos o Brasil sempre teve muita dificuldade de parcelar seu solo. A experiência que chegou mais perto disso foi com o marechal Castelo Branco, em plena ditadura militar, quando, na Presidência da República, ele instituiu o Estatuto da Terra. Por que Castelo elaborou um estatuto tão avançado? A resposta é simples: porque ele estudou na academia militar americana e, lá, percebeu que, na base econômica dos americanos, todo mundo é igual quanto aos direitos do acesso à terra, e foi isso que deu a pujança dos EUA. Além disso, o marechal Castelo Branco, que tinha uma visão nacionalista, disse que esse país só iria se levantar se tivesse uma reforma agrária grande, assim como a americana e, por isso, assinou o Estatuto da Terra, em 1964, que é uma referência até hoje.

Para o Estatuto da Terra, toda propriedade com tamanho acima de 1.500 hectares (cerca de 312 alqueires mineiros) tinha que ser destinada à reforma agrária. O pacto do Castelo Branco era de enriquecer todo aquele que passasse a possuir seus 1.000/1.500 hectares.

 

Atrás do fio elétrico vem a televisão, a geladeira, a máquina de lavar etc.

 

A ideia do economista Celso Furtado é que esse processo tivesse início ao longo das rodovias federais (BRs), ferrovias e nas margens dos lagos artificiais, para que pudesse dar vazão à produção; e mais, se você está perto da estrada, também está perto da energia elétrica e, se você levar energia elétrica para o camponês, atrás do fio elétrico vem a televisão, a geladeira, o rádio, a máquina de lavar, e quem vai vender isso? A indústria.

Por isso que, tecnicamente, se considera que a origem da reforma agrária é da burguesia e não dos trabalhadores. A origem está na criação de um gigantesco mercado interno para a indústria. Essa tese deixou de ser teoria há muito tempo, basta percorrer os municípios onde só tinha latifúndio e agora tem mais de 4.000 assentados. Quem mais bate palma para os assentamentos são os comerciantes que passaram a ter 4.000 novas famílias de consumidores, mesmo porque o latifundiário mora na capital, não gasta o dinheiro dele na cidade, mas no exterior. Agora, quando chegam os "sem-terra" a primeira coisa que ele faz é ir lá na loja da cidade e comprar televisão, máquina de lavar, comprar uma bicicleta, celular, roupas, comprar uma motinha etc., o que ativa o comércio da região, e esse é o sentido da reforma agrária.

 

O Brasil e seu tamanho

 

O Brasil tem 800 milhões de hectares (dimensão total do país) e, como é um país urbano, mais da metade é ocupado pelas cidades, estradas, Amazônia etc. Assim sendo, sobraram 360 milhões de hectares, dos quais o Brasil cultiva 80 milhões com soja, milho etc.; desses 80 milhões, o agronegócio fica com 60 milhões e 20 milhões com a agricultura familiar, inclusive os assentamentos rurais de sem-terras. Então temos 280 milhões, dos quais 160 milhões estão com a pecuária extensiva (inclusive a que desmata), sobrando 120 milhões de hectares.

 

Vai faltar sem-terra no Brasil

 

Segundo o Incra, órgão do governo federal, pegando esses 120.000 hectares de propriedades improdutivas e dando 10 hectares para cada família de sem-terra, vai faltar "sem-terra" no Brasil, porque, hoje, eles são apenas 4.000.000 no país e tem terra para de 10 a 12.000.000 de sem-terra.

Esse é um tema que precisa ser debatido e entrar em pauta, afinal ele não é da esquerda, mas sim da direita e da indústria como um todo. Enquanto os EUA distribuíram suas terras para 13 milhões de famílias em 1865, o Brasil ainda caminhava no tratado de Tordesilhas para algumas famílias ligadas ao Rei.