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A reforma agrária sempre foi um instrumento do capitalismo

A elite ranzinza que tem no Brasil, porém, nunca entendeu a lógica que está por trás dela, que é a mesma do fim da escravidão com o surgimento de homens livres, assalariados e consumidores. O Brasil prefere permanecer no século XVIII.

Edição: 511
Data da Publicação: 14/09/2024

A luta pela terra no Brasil existe há 524 anos, ou seja, desde o descobrimento. Ao contrário dos países desenvolvidos do mundo, o Brasil vem fazendo o caminho inverso até hoje. Inicialmente, foram as capitanias hereditárias, que dividiram o território brasileiro em imensas áreas, muitas vezes maiores que muitos países do mundo, e, até hoje, a luta pela terra em nada é pacífica.

Até os Estados Unidos fizeram sua Lei da Terra, sua reforma agrária, que é o que nós conhecemos romanticamente no cinema como a ocupação do oeste pelo faroeste, em que o estado americano garantiu ao cidadão americano que permanecesse por pelo menos 10 anos em cerca de 10 hectares (cerca de 100.000 m²). Não é preciso lembrar que esta ocupação se deu com o extermínio de populações inteiras de indígenas.

A reforma agrária sempre foi um instrumento do capitalismo, que via nela o surgimento de uma nova e forte classe de consumidores, de fogões, geladeiras, máquinas de lavar, veículos, tratores, caminhonetes etc. Foi ela que alavancou a indústria americana.

A luta pela terra no Rio

No Brasil, a elite ranzinza luta contra o desenvolvimento do Brasil, preferindo manter imensas áreas de terras na mão de poucos que acumulam riqueza e não forma consumidores. O estado do Rio de Janeiro também tem sua disputa pela terra. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Rio de Janeiro vem denunciando a tentativa de despejo do assentamento Osvaldo de Oliveira, localizado em Macaé, norte do estado. Com 63 famílias, a área é referência na produção de alimentos saudáveis e na proteção ambiental na região.

Diante da ameaça, o movimento vem buscando o apoio da sociedade em geral, aliados, parceiros e amigos do Movimento, para defenderem o assentamento e as famílias que nele vivem e trabalham. A permanência dessas famílias na terra é a garantia de que a justiça, de fato, atende àqueles que mais necessitam. 

O assentamento, cuja ação de desapropriação iniciou-se em 2012, é baseado em um Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS), modalidade na qual há a garantia de que as atividades produtivas estão combinadas com a conservação da natureza e a reorientação da ocupação do solo. Com um PDS, busca-se a recuperação do potencial ambiental original antes da degradação do latifúndio.  Desta forma, as 63 famílias do local têm uma vasta produção agroecológica, com a participação em feiras de cidades próximas e entrega de alimentos para Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) e para escolas públicas em Macaé. Entre toda a diversidade de alimentos produzidos, o feijão agroecológico destaca-se com a produção de 2,5 toneladas do item. Além disso, durante a pandemia de Covid-19, foram doados cerca de três toneladas de alimentos para cidades da região. 

Toda essa produção é realizada levando-se em consideração a necessidade do cuidado com os bens comuns da natureza e com a recuperação ambiental da área, que, antes, era usada para criação extensiva de gado. À época, laudos técnicos atestaram a improdutividade da propriedade.

Erros judiciais

A decisão pelo despejo baseia-se em uma série de erros judiciais, os quais violam garantias constitucionais fundamentais, como o respeito ao devido processo legal, a participação igualitária das partes envolvidas e a imparcialidade do juiz competente. Os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), Marcelo Pereira da Silva e Reis Friede, ignoraram o amplo debate público que foi realizado para a constituição do assentamento.

MPF, UFRJ e UFF

Tal debate envolveu diversos atores públicos, como o Ministério Público Federal (MPF), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Federal Fluminense (UFF), além das famílias acampadas na época. O resultado destes debates apontou para a viabilidade do Projeto, dando oportunidade das 63 famílias acampadas na margem da estrada terem acesso à terra.  

Aqueles desembargadores ignoram este processo amplo, público e democrático de debate sobre a necessidade da reforma agrária como uma forma de combater a desigualdade social, produzir alimentos saudáveis, proteger os bens comuns da natureza e combater a concentração de terras.

O MST no RJ reafirma seu compromisso com as famílias do PDS Osvaldo de Oliveira e seguirá na defesa do assentamento. Deste modo, convocamos a sociedade a apoiar estas famílias frente à ofensiva do latifúndio. O movimento não abre mão de reforçar o papel frente à sociedade de produzir alimentos, cuidar da natureza e combater as desigualdades. 

Com participação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra