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Do Japão à China: Como a Ásia Dominou a Indústria Automobilística mundial

Enquanto a América Latina ficou para trás

Edição: 517
Data da Publicação: 14/02/2025

A ascensão da indústria automobilística asiática é uma das histórias mais marcantes da economia global no século XX e XXI, impulsionada por políticas governamentais estratégicas, inovação e uma busca incessante por eficiência. Enquanto Japão, Coreia do Sul e, mais recentemente, a China dominaram a produção global de automóveis, a América Latina nunca conseguiu criar marcas locais relevantes no mercado internacional. Vamos explorar este contraste.

Japão: O Apoio do Governo e o Triunfo da Toyota

A reconstrução do Japão após a Segunda Guerra Mundial envolveu uma forte intervenção governamental na economia, com foco na industrialização e no crescimento das exportações. O governo japonês implementou políticas de proteção às montadoras nacionais, oferecendo incentivos financeiros e tarifas protecionistas para impedir a concorrência estrangeira nos primeiros anos.

A Toyota emergiu como o grande símbolo da indústria automobilística japonesa, impulsionada pelo Sistema Toyota de Produção, que revolucionou a manufatura global com o conceito de produção enxuta (lean manufacturing). Esse modelo reduziu desperdícios, aumentou a eficiência e melhorou a qualidade dos carros, tornando os veículos japoneses extremamente competitivos. Nos anos 1980, marcas como Toyota, Honda e Nissan já dominavam mercados internacionais, especialmente os Estados Unidos, onde os consumidores buscavam carros confiáveis e econômicos em meio às crises do petróleo.

Coreia do Sul: O Impulso do General Park e o Crescimento da Hyundai e Kia

A Coreia do Sul seguiu um caminho semelhante ao Japão, mas com ainda mais intervenção do Estado. Sob o governo do general Park Chung-hee (1961-1979), o país adotou uma estratégia de industrialização liderada pelo Estado, favorecendo grandes conglomerados (chaebols) como Hyundai, Kia e Daewoo.

O governo sul-coreano impôs barreiras à importação de carros estrangeiros e forneceu créditos subsidiados para as montadoras nacionais expandirem suas operações. A Hyundai, que começou fabricando carros sob licença da Ford, logo desenvolveu seus próprios modelos e, nas décadas seguintes, tornou-se um gigante global. Assim como o Japão, a Coreia do Sul investiu fortemente na qualidade e na eficiência da produção, conquistando mercados na Europa e nos EUA.

China: O Estrondoso Sucesso dos Carros Elétricos

A China entrou no jogo automobilístico mais tarde, mas com uma abordagem agressiva e altamente subsidiada pelo governo. O país começou como um grande montador de veículos de marcas estrangeiras, mas, nos últimos anos, tem se tornado líder global na produção de carros elétricos, desafiando empresas tradicionais.

O governo chinês ofereceu subsídios bilionários, incentivos fiscais e investimentos em infraestrutura para consolidar a indústria de veículos elétricos (EVs). Empresas como BYD, NIO e XPeng surgiram como potências do setor, aproveitando também a enorme demanda doméstica por veículos elétricos e as restrições ambientais impostas pelo governo chinês às montadoras tradicionais.

Hoje, a China não só domina a produção global de veículos elétricos, como também controla grande parte da cadeia de suprimentos de baterias e semicondutores, essenciais para a transição energética da indústria automobilística global.

O Contraste com a América Latina:

Por que Não Surgiram Grandes Montadoras Locais?

Enquanto a Ásia construiu gigantes da indústria automobilística, a América Latina nunca conseguiu criar marcas nacionais competitivas globalmente. Algumas razões explicam esse fenômeno:

1. Falta de Protecionismo Estratégico - Diferente de Japão, Coreia do Sul e China, que impuseram tarifas protecionistas e incentivaram a produção local, países latino-americanos frequentemente abriram seus mercados para montadoras estrangeiras sem exigir transferência de tecnologia ou fortalecimento da indústria nacional.

2. Dependência de Empresas Estrangeiras - Desde o início, a produção automobilística na América Latina foi dominada por filiais de montadoras dos EUA, Europa e Japão, como Volkswagen, GM, Ford e Fiat. Isso significava que a região produzia carros, mas não desenvolvia tecnologias próprias.

3. Instabilidade Econômica e Falta de Investimentos em P&D - Enquanto Japão, Coreia e China investiram pesadamente em pesquisa e desenvolvimento (P&D), a América Latina sofreu com crises econômicas recorrentes, hiperinflação e políticas industriais inconsistentes. Isso impediu a formação de conglomerados locais competitivos.

4. Baixa Escala e Mercados Fragmentados - Ao contrário da Ásia, onde grandes populações permitiram a formação de mercados domésticos robustos, a América Latina tem mercados fragmentados e, muitas vezes, instáveis. Isso dificultou a formação de montadoras locais com escala suficiente para competir globalmente.

Como resultado, enquanto marcas como Toyota, Hyundai e BYD conquistaram o mundo, a América Latina tornou-se um polo de montagem para marcas estrangeiras, sem criar campeões nacionais.

Conclusão

A ascensão da indústria automobilística asiática foi impulsionada por estratégias nacionais bem planejadas, com forte apoio governamental e uma busca incessante por inovação e qualidade. Japão e Coreia do Sul criaram gigantes como Toyota e Hyundai, enquanto a China, com sua revolução dos veículos elétricos, agora lidera a próxima fase da indústria global.

Em contraste, a América Latina permaneceu um mercado de montagem para multinacionais, sem marcas próprias relevantes. Isso ilustra como políticas industriais e estratégicas bem executadas podem transformar um país em potência global, enquanto a falta de visão e investimento pode deixar regiões inteiras dependentes de tecnologias e indústrias estrangeiras.

Fonte Paulo Gala