Capítulo 18 - Dr. Paulo de Frontin e a ferrovia na serra do Tinguá

A Trajetória Histórica do Município de Miguel Pereira

 03/12/2021     Historiador Sebastião Deister      Edição 374
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O notável engenheiro André Gustavo Paulo de Frontin nasceu na Raiz da Serra de Petrópolis em 1860, tendo falecido no Rio de Janeiro no ano de 1933. Diplomado pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro em 1879 (quando contava apenas 19 anos), já era catedrático da mesma escola e também do renomado Colégio D. Pedro II aos 21 anos, o que bem atesta sua inteligência invulgar e seu profundo talento na área de engenharia. No início de 1889, propôs ao Governo Imperial aumentar em mais de 15 milhões de litros o potencial de abastecimento de água da cidade do Rio de Janeiro em apenas uma semana, para evitar a ameaça iminente de sede e de epidemias que rondavam a população carioca. Apesar da descrença de muitas autoridades e do deboche de jornalistas e opositores de sua ideia, o êxito da operação foi retumbante e o incrível empreendimento ficou conhecido como "água em seis dias", projetando em plano nacional o nome do jovem engenheiro.

Frontin também estruturou a Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil - da qual seria seu presidente de 1896 a 1897 e depois de 1910 a 1914 -, empresa fundada no Rio de Janeiro em 17 de maio de 1890 em parceria com os amigos e companheiros de trabalho Bicalho, Niemeyer, Hargreaves, Vieira Souto e outros. Destinada a implantar na Serra do Tinguá a chamada Linha Auxiliar tão desejada pelo Imperador Pedro II e cujo contrato de construção com o governo da Província já se encontrava assinado desde 15 de março de 1882, a ferrovia previa a construção de um leito em bitola estreita, isto é, largura máxima entre os trilhos de 1 metro. Com a Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil, Frontin realizou inúmeras obras importantes no país, como a duplicação das linhas da Serra do Mar (entre 1913-1914), o estudo de ligação Pirapora-Belém e a iluminação até Belém (então Japeri), Barra do Piraí e Cruzeiro (SP).

Antes de vermos seus trabalhos pela Linha Auxiliar, tracemos um pequeno perfil biográfico de Frontin em relação ao Rio de Janeiro. Durante o governo de Rodrigues Alves (de 1903 a 1906), o engenheiro notabilizou-se como um dos mais constantes e profícuos colaboradores do prefeito Pereira Passos na remodelação da cidade carioca, chefiando a comissão construtora da Avenida Central, atual Rio Branco. O projeto e a conclusão dessa via pública de 33 metros de largura constituíram empreendimento de vulto, pois foi entregue ao público em apenas 22 meses, após cortar morros e demolir mais de 600 prédios no coração do Rio de Janeiro.

Em 1917, Frontin foi eleito senador pelo antigo Distrito Federal, porém renunciou logo ao cargo para poder assumir a cadeira de prefeito do Rio de Janeiro. Em cerca de seis meses apenas, realizou um conjunto de trabalhos que proporcionou um desenvolvimento extraordinário à cidade. Destacaram-se, nesse período, obras como as avenidas Atlântica, Delfim Moreira, Niemeyer e Rodrigues Alves; a definição do contorno e a dragagem da Lagoa Rodrigo de Freitas e a construção do canal de ligação com o mar do Leblon; a abertura da avenida do Rio Comprido - hoje avenida Paulo de Frontin - com a canalização do rio do local e a urbanização de sua área de entorno; o prolongamento da avenida Beira-Mar; a construção do túnel João Ricardo, ligando o Cais do Porto à Praça da República e às adjacências da estação ferroviária D. Pedro II; a remodelação do Largo de Santo Cristo, na Gamboa; a construção do Jardim do Méier e dezenas de outros serviços que colocaram seu nome eternizado nos anais políticos e administrativos do Rio de Janeiro.

Exerceu ainda o cargo de presidente do Clube de Engenharia em 1903, período que aproveitou para erguer a sede dessa entidade na Avenida Central. Pela dedicação prestada à instituição, veio a ser homenageado pelos seus demais membros com o título de Presidente Perpétuo.

Reconhecido internacionalmente pela sua competência, honestidade, visão administrativa e incansável capacidade de trabalho, André Gustavo Paulo de Frontin foi agraciado em 1909 com o título de Conde de Frontin pelo Papa Pio X.

Paulo de Frontin casou-se com D. Maria Leocádia de Toledo Dodsworth, a terceira filha de Jorge João Dodsworth, o barão de Javary.

Na visita de reconhecimento logístico que fizeram à Serra do Tinguá, Frontin, Bicalho, Hargreaves, Niemeyer e Vieira Souto sensatamente optaram por usar as estradas de terra recém-abertas pelos caboclos serranos como acesso mais prático às encostas daquelas colinas, em cujos flancos menos agressivos seriam cravados os trilhos da estrada de ferro desejada, com tal decisão determinando que o leito da ferrovia deveria sempre acompanhar as águas do rio Santana. Essa escolha explica a razão pela qual os trilhos que partem de Japeri seguem criteriosamente o rio até a localidade de Vera Cruz, somente aí abandonando aquelas águas para desbravar as montanhas em direção a Fragoso e Portela, já que, para Leste, o rio Santana volta-se para suas seculares nascentes nos limites que se voltam para Petrópolis.

No dia 15 de fevereiro de 1893, iniciou-se a construção da Linha Auxiliar na Estação de Mangueiras; em 1 de novembro de 1895 os trilhos já alcançavam Honório Gurgel (km 17), daí destacando-se um ramal em linha reta, com 3 km, para a estação de Sapopemba (hoje Deodoro).

No dia 29 de março de 1898, a Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil realizou uma série de inaugurações de estações pela nossa região, a saber: Paes Leme, Sertão (Conrado), Bomfim (Arcádia), Vera Cruz, Conrado Niemeyer (Francisco Fragoso), Governador Portela, Estiva, Paty do Alferes, Arcozelo, Avelar, Andrade Costa, Cavaru e Barão de Werneck, além de diversas paradas de reabastecimento, como Santa Branca, Engenheiro Adel, Barão de Javary, Bueno de Andrade, Mestre Xisto e Taboões. Nesse auspicioso dia, os orgulhosos diretores da Estrada de Ferro entregavam sua maravilhosa obra aos moradores da Serra, precedidos em sua marcha pela Maria Fumaça elegante, polida e embandeirada, a qual, por décadas, foi motivo de regozijo e fator de prosperidade para todas as localidades emergentes do Tinguá.

Devemos registrar que a chegada dos trilhos ao cume da serra somente se tornou possível com a construção de pontes e viadutos de alta segurança por sobre o rio Santana e por vezes a cavaleiro das profundas e desafiadoras gargantas das colinas. Assim, além das estações de embarque, a ferrovia entregava à Linha Auxiliar a bela ponte de Santa Branca e o admirável viaduto batizado com o nome do Dr. Paulo de Frontin, em Vera Cruz, entre outras obras de acabamento estrutural e a plena sinalização do leito ferroviário.

 

Na próxima edição: Dr. Francisco Portela e a Ferrovia