Cap. 11 - A Fazenda do Retiro e a família Bernardes
A Trajetória Histórica do Município de Miguel Pereira
15/10/2021
Historiador Sebastião Deister
Edição 367
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Consoante registros bem antigos, a Fazenda do Retiro
teria pertencido primeiramente ao mesmo Joaquim Pinheiro de Souza que, em
meados de 1864, administrava a Fazenda da Estiva. Dono de muitas extensões de
terra em Barreiros, Joaquim resolveu, pelos idos de 1890, desmembrar parte da
Retiro, concluindo negócios, nesse mesmo ano, com os senhores José Joaquim da
Fonseca, capitão José Narciso de Lima e Major Manoel Pinheiro de Souza Sobrinho
no intuito de aproveitar de maneira mais racional algumas datas de terrenos
naquela fértil propriedade.
José Joaquim e José Narciso eram fazendeiros
recém-chegados à Serra do Tinguá, mas Manoel Pinheiro de Souza Sobrinho vinha a
ser filho de Joaquim Pinheiro de Souza, e, portanto, comprador de frações das
terras do próprio pai, o que lhe permitiu manter grande parte da Fazenda do
Retiro em mãos da família. Durante as negociações, ficou estabelecido que, a
Manoel Pinheiro, caberia um terreno inserido na Freguesia de Ferreiros, à
direita da Variante da Estrada do Comércio. Mais uma vez é preciso lembrar que,
embora pareça estranho a menção da Freguesia de Ferreiros como administradora
de áreas situadas no âmago do distante povoado de Barreiros - em glebas
atualmente circunscritas pelo loteamento Retiro das Palmeiras -, tais terras,
na época, encontravam-se sob jurisdição eclesiástica daquela Paróquia, conforme
pudemos constatar nos estudos da Fazenda Pantanal. Acresce ainda o fato de que,
na ocasião de tais ajustes imobiliários - 1890 -, toda a região pertencia ao município
de Vassouras, com a Paróquia de São Sebastião de Ferreiros estendendo-se até os
limites de Paty e cingindo em seus domínios o incipiente arraial de Barreiros.
Devemos também atentar para o fato de a escritura
mencionar "... à direita da Variante da Estrada do Comércio...", o que
nos permite concluir que as terras do Retiro derramavam-se até as linhas
divisórias da Pantanal, muito provavelmente seguindo um caminho que hoje
corresponde à Rua Cipriano Gonçalves no chamado bairro Buraco dos Burros.
Em 1892, o capitão José Narciso de Lima vendeu um
alqueire de sua propriedade para o major Manoel Pinheiro de Souza Sobrinho,
vindo esse militar possuir praticamente todas as terras da Fazenda do Retiro.
Os demais lotes teriam como donos, por volta desse mesmo ano, Francisco José da
Silva e José Ferreira de Oliveira.
No segundo semestre de 1892, grande parte da Retiro
foi repassada para Manoel Francisco Bernardes, então coronel da Guarda-Nacional
de Paty do Alferes. Vários descendentes da família desse importante militar e
político patiense nasceram e foram criados naquela fazenda, destacando-se entre
eles a estirpe de seu quarto filho, de nome Antão Bernardes, casado com D.
Luiza Pinheiro. O casal deu ao coronel Manoel Francisco Bernardes os seguintes
netos: Antão Pinheiro Bernardes Filho; Eurico Pinheiro Bernardes; Hilda
Pinheiro Bernardes; Carmem Pinheiro Bernardes; Lauro Pinheiro Bernardes e Rubem
Pinheiro Bernardes.
Também na Fazenda do Retiro viveu por muitos anos
Dulce Pinheiro Bernardes, filha do segundo descendente do coronel, o senhor
Benjamim Francisco, casado com D. Arinda Pinheiro. Caprichosa, culta,
inteligente e dona de cativante simpatia, D. Dulce Bernardes tornou-se um dos
mais completos e notáveis repositórios de conhecimentos referentes à bela
história de Paty, sem os quais dificilmente alguns capítulos desta pretensiosa
obra hoje estariam sendo escritos. Teve ela, sob sua guarda, o mais admirável
acervo documental sobre os tempos de colonização e urbanização dos povoados
serranos, e em suas gavetas bem organizadas e prateleiras centenárias sempre se
mostrava possível descobrir documentos, fotos, plantas de fazendas, cópias de
escrituras, mapas, cartas e gráficos que - junto a alguns livros antigos e maravilhosos
- por certo renderiam a Paty um arquivo municipal de incalculável valor
histórico e cultural. Com sua morte, aquele município perdeu não apenas uma
filha ilustre e pouco reconhecida, mas também parte de suas invejáveis raízes. Já
na área política da região, os Bernardes foram representados, no século
passado, por dois irmãos de grande influência em Paty do Alferes: Manoel
Francisco Peralta Bernardes (Manduquinha) e Edmundo Peralta Bernardes.
Por seu turno,
Manoel Francisco Bernardes Sobrinho - como o nome já diz, sobrinho do comandante
Manoel Bernardes - alocou-se em Miguel Pereira, desenvolvendo no local suas
atividades comerciais e pecuárias. Mais conhecido como Manduca, ergueu uma bela
e elegante casa na atual Rua Luiz Pamplona - por sinal, ainda existente, mas
não habitada -, ali criando sua numerosa prole: Mariana (Mariquita), casada com
Silvio, pais de Silmar, Marcil, Wilson, Ilmar, Marcos Vinícius, Mitzuque, Vera
Lúcia, Márcia e Suzimar; Alcina (Batuta), casada com Waldomiro, mas sem filhos;
Manoel, casado com Ernestina. Filha: Maria Alcina; Francisco, marido de Lígia,
com os filhos Jussara, Cláudio e Márcio; Marina, solteira, porém mãe adotiva de
Célia; Marilda, esposa de Antônio José, com os filhos Dalmo e Cláudia;
Maurício, casado com Eni. Filhos: Luzia, Luciana e Liliane; Mariana (Miralda)
casada com Álvaro, pais de Alvimar, Vilmar, Rosimar, Álvaro José, Lucimar,
Gilmar e Ribamar; Miécio, esposo de Marlene, com os filhos Luiz Otávio, Betina,
Carlos Eduardo e Daniela; Milton, solteiro; Marlene, esposa de Wolgran, pais de
Wolmar, Sandra, Marcelo e Fernanda.
Estiva Futebol
Clube
Manduca Bernardes
exerceu forte autoridade em Miguel Pereira, participando sempre de atividades
sociais, comerciais e até mesmo políticas lá pela metade do século XX.
Colaborou decisivamente para o engrandecimento do primeiro clube de futebol da
Vila - o Estiva FC - militando ao lado de homens como Bonifácio Portela,
Aurélio Barile, Dino Fraga, Calmério Rodrigues (Juju), Dr. João Alberto Masô,
Domingos Leitão e outros.
Vaidoso, gostava de
se exibir ao lado da filha Mariquita, quando esta ostentava o título de
madrinha do time de futebol. Contudo, em princípios de 1930 a direção do Estiva
lançou o nome de Conceição Setúbal Ritter para o posto então ocupado por
Mariquita, filha do Dr. Oscar Setúbal Ritter, Conceição de pronto aceitou a
indicação, o que contrariou Manduca profundamente, levando-o a se desligar do
Estiva em sinal de protesto.
Miguel Pereira
Atlético Clube
Em represália,
procurou seus mais íntimos amigos e, principalmente, aquele que o apoiaria de
maneira incondicional: Juju. Juntos, reuniram um grupo apreciável de homens
influentes e solidários e fundaram então um clube rival em 26 de abril de 1930:
O Miguel Pereira Atlético Clube, cuja primeira diretoria agregou os senhores
Dr. João Alberto Masô (vice-presidente); Felipe de Carvalho (1° secretário);
Alzino Ferreira "Tintas" (2º secretário); Daniel Bernardes (1º diretor
esportivo); Francisco Villet Peralta (2º diretor esportivo); Calmério Rodrigues
Ferreira (tesoureiro); Adalvete Rodrigues Ferreira (fiscal de campo) e Daniel Bernardes
(zelador), tendo, naturalmente, Manduca como seu presidente.
O campo de futebol
foi construído no terreno onde agora se localiza o Colégio Estadual Dr. Antônio
Fernandes, mas a sede do clube funcionou durante anos à Rua General Ferreira do
Amaral (no espaço hoje ocupado pela loja GasparzinhoTintas). Em 1964, durante a
gestão do presidente José Tertuliano Gomes, finalmente a grande associação
ganharia sua sede definitiva ao final da Rua Prefeito Manoel Guilherme Barbosa,
bem no coração de Miguel Pereira, agora vizinha da Prefeitura Municipal e do
Pavilhão de Promoções. O Miguel Pereira Atlético Clube é hoje, sem favor, uma
das importantes referências populares do município, oferecendo a associados,
visitantes e turistas inúmeras atrações culturais e esportivas.
Na próxima edição: A
Fazenda Cabral e a Família Fraga