A família Xavier em Paty do Alferes

Memórias de Paty do Alferes

 19/04/2024     Historiador Sebastião Deister      Edição 497
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O Capitão-mor Manuel Francisco Xavier e a esposa Francisca Elisa Xavier criaram e educaram oito jovens considerados enjeitados em Paty do Alferes, mas supostamente filhos bastardos do capitão. Como curiosidade, este dizia ser descendente direto de Joaquim José da Silva Xavier (o Tiradentes), talvez pela homonímia do sobrenome, porém não há registro cartorial ou documental que comprove tal alegação.

Francisca Elisa, agraciada por D. Pedro II com o título nobiliárquico de Baronesa de Soledade, morreu em 1855 em seu grande palacete em Niterói, repassado, após seu falecimento, ao Bispado do Rio de janeiro, que ali instalou o Seminário Episcopal. Além das fazendas deixadas para o filho Gil Francisco Xavier, a baronesa destinou Rs. 25:000$000 (vinte e cinco contos* de réis) para cada um dos outros sete filhos adotivos.

Os oito acolhidos pelo casal foram batizados como:

1 - Manuel Francisco Xavier (filho)

Faleceu no Rio de Janeiro, onde trabalhou por muitos anos na Casa de Correção, também denominada Casa de Correção da Corte, criada pelo decreto 678, de 6 de julho de 1850. Destinava-se à execução de penas de prisão com trabalho no próprio estabelecimento. No último regulamento do período imperial, foi então adotado o sistema penitenciário que prescrevia o isolamento celular** durante a noite e o trabalho coletivo durante o dia sob o regime de rigoroso silêncio (Brasil, 1883). No período republicano, a Casa de Correção teve sua competência alterada pelo regulamento aprovado pelo decreto 3.647, de 23 de abril de 1900, que definiu como sua competência a execução da pena de prisão celular enquanto não fossem criadas no país instituições prisionais conforme o sistema penitenciário prescrito pelo Código Penal de 1890. Manuel não deixou descendentes.

2 - TENENTE-CORONEL GIL FRANCISCO XAVIER

Mais conhecido com Gil da Freguesia, administrou por muitos anos as fazendas Freguesia (atual Aldeia de Arcozelo) e Maravilha, legadas, em testamento, por sua mãe adotiva e madrinha, a baronesa da Soledade (Francisca Elisa Xavier). O tenente casou-se em 13 de fevereiro de 1851 com Enídia Francisca Feijó Xavier. O casal não gerou filhos. Por outro lado, Gil fixou seu nome na região como um dos mais eficientes Comandantes da Guarda Nacional, apelidado como Espora de Ouro. A formatura de duzentos cavaleiros para a corporação, sob sua chefia, foi um acontecimento único e diferenciado na metade do século XIX na sede daquele município.

Foi batizado em 11 de maio de 1824, tendo como padrinhos Francisca Elisa Xavier e o vigário Manuel Felizardo Nogueira. Já adulto, Gil fez parte da Irmandade de Paty, fundada em 1840, e abandonou a entidade quando exercia o cargo de tesoureiro, deixando, inclusive, de prestar contas das arrecadações e despesas, o que provocou uma cobrança judicial dos valores. Era um jogador compulsivo, tanto que hipotecou a fazenda Freguesia em favor do visconde de Arcozelo (Dr. Joaquim Teixeira de Castro) e não a resgatou, perdendo, assim, a grande propriedade e outros bens.

Endividado e esquecido, morreu em estado de extrema pobreza em 19 de novembro de 1880, aos 56 anos de idade. Seus últimos dias foram vividos em absoluta solidão em um casebre miserável. Teria sido enterrado como indigente, não fosse a humana atitude do coronel Manuel Francisco Bernardes, que comprou uma rica farda da Guarda Nacional para vesti-lo, providenciando, também, um enterro digno e justo para o ex-militar.

3 - CÔNEGO FRANCISCO MANUEL DAS CHAGAS XAVIER

Foi batizado em 6 de novembro de 1827. Criou e dirigiu por três anos uma escola chamada Liceu Patiense instalada em um grande prédio conhecido como Pensão do Rocha que muitos anos depois abrigaria o Hotel do Imperador (visitado por D. Pedro II em 1857). Tal colégio foi responsável pela educação de muitos jovens, não apenas da freguesia, como de outras localidades como Vassouras, Valença e Paraíba do Sul.

Administrou, ainda, um grande colégio em Barra do Piraí, dali se retirando em 1865 para o Rio de Janeiro, onde recebeu a patente de Capelão do Exército. Em seguida foi lutar na Guerra do Paraguai no batalhão Voluntários da Pátria. Retornando em 1870, após o término do conflito, continuou prestando serviços no campo militar. Faleceu completamente louco no Hospital dos Alienados.

4 - JOSÉ MARIA XAVIER

Telegrafista aposentado da antiga instituição Telégrafo Nacional. Casado, deixou três filhos, sete netos e um bisneto. Residiu por anos em Niterói.

5 - CAROLINA FRANCISCA XAVIER

Batizada em 28 de março de 1838. Casada em primeiras núpcias com Antônio de Lima. Deixou filhos de um segundo casamento com o fotógrafo João do Monte Cristo. Alguns descendentes permaneceram no Rio de Janeiro, porém outros seguiram para Paracambi.

6 - BELMIRA FRANCISCA XAVIER

Casou-se com Antônio Vianna (conhecido como Viana Bilheteiro). Um dos seus filhos, chamado Cisalpino, morou por muitos anos em Paty do Alferes.

7 - LUZIA FRANCISCA XAVIER

Contraiu um primeiro matrimônio com Francisco Curto. Enviuvando, casou-se com o português de sobrenome Azevedo. Deixou filhos de ambos os maridos,

8 - FRANCISCA ELISA XAVIER

Homônima da mãe adotiva. Faleceu em 1916. Casou-se com o major Joaquim Mariano Coelho quando este residia na fazenda Pau Grande. Tiveram descendentes.

 

*Entre 1856 e 1862, em Vassouras, 1 conto de réis equivalia a 1 kg de ouro ou 1 escravo.

Imagem: O casal Xavier (quadro resguardado na Igreja de Paty do Alferes)

**No século XIX o termo era usado para designar prisão em cela comum e individual. Celular deriva de cela, cárcere.