Um terço dos municípios do RJ atrasam salários e paralisam obras

Além da redução no repasse de verbas, queda de ganhos com royalties sufoca prefeituras

 18/11/2016     Servidor Público   
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O servente Júlio César Bernardes, de 58 anos, trabalha desde 1974 em postos de saúde de Sapucaia, cidadezinha fluminense com pouco mais de 17 mil habitantes, na divisa com Minas Gerais. Mas, apesar de toda a aparente tranquilidade que o cerca, ele mantém a expressão fechada, e com motivos. No último dia 10, ainda não tinha recebido seu salário, atrasado pelo quarto mês consecutivo. No mesmo dia, o telefone da unidade onde dá expediente foi cortado por falta de pagamento, para deixá-lo ainda mais aborrecido.

— E se alguém precisar ligar? Dá para ver o fundo do poço — reclamou.

Adversidades como essa, no entanto, não têm sido exclusividade de Júlio nem de Sapucaia. Longe da capital, epicentro das decisões do governo de Luiz Fernando Pezão, a crise do estado afeta várias cidades da Região Metropolitana e do interior. Em pleno ano eleitoral, os mimos a funcionários públicos, que costumam ser a regra, deram lugar a contas bancárias vazias. O GLOBO procurou prefeituras e sindicatos de servidores de todos os 92 municípios fluminenses. Pelo menos 30 (ou 32% do total) precisaram mudar seu calendário habitual de depósitos e adiar os pagamentos de seus servidores em uma semana ou, às vezes, até meses. Em outras 14 cidades, que detêm juntas menos de 1% dos 16,6 milhões de habitantes do estado, como Macuco e Laje do Muriaé, a reportagem não obteve respostas.

Sem receita, sem salário

Além da falta de repasse dos convênios, a própria queda do preço do barril do petróleo — a que o governo atribui a gênese da crise que vive — sufoca prefeituras. Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP), a soma dos ganhos dos municípios do Rio com royalties caiu de R$ 2,8 bilhões entre janeiro e outubro de 2014 para R$ 1,7 bilhão no mesmo período de 2016, uma redução de quase R$ 40%. Para completar, os repasses obrigatórios da União também minguaram. Em 2014, todos os municípios do Rio somaram R$ 16,5 bilhões em transferências obrigatórias. Em 2015, foram R$ 14,9 bilhões. Este ano, apenas R$ 9,6 bilhões.

Com a queda generalizada de receitas, até as maiores cidades têm tido problemas para pagar seus servidores, seja adiando por uma semana a data habitual ou até por quatro meses, caso dos funcionários da saúde de Belford Roxo. Duque de Caxias vem parcelando vencimentos há três meses. Araruama só quitou os pagamentos de setembro no último dia 10. Já Angra dos Reis, até a última sexta-feira, não havia depositado os salários dos funcionários da saúde. Na cidade, o Hospital Municipal da Japuíba pede socorro: sem insumos básicos e médicos de plantão por falta de horas adicionais pagas, vem internando pacientes nos corredores.

—A gente brinca que a única coisa que está sobrando é paciente, porque os corredores estão lotados — contou uma médica.