O Santuário de Bom Jesus de Matosinhos

A devoção prestada ao Senhor Bom Jesus de Matosinhos tem suas raízes voltadas para os primórdios do ano de 1744, época em que a imagem, depositada à beira de um ribeirão

 03/02/2017     Historiador Sebastião Deister      Edição 123
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A devoção prestada ao Cristo Morto sempre constituiu uma atividade religiosa enraizada nos seculares costumes dos camponeses de Portugal. Nada mais natural, portanto, que lá pelos anos quarenta do século XVIII alguns imigrantes chegados da Vila de Matosinhos - situada nas cercanias da cidade do Porto - trouxessem para o Sertão da Paraíba a liturgia por eles celebrada na pátria-mãe, erguendo nas faldas orientais da Serra da Sucupira uma pequena ermida dedicada ao Bom Jesus Crucificado.

A devoção prestada ao Senhor Bom Jesus de Matosinhos tem suas raízes voltadas para os primórdios do ano de 1744, época em que a imagem, depositada à beira de um ribeirão, foi encontrada de maneira quase milagrosa por escravos alocados na Fazenda Matosinhos, em Paraíba do Sul. Entretanto, já em 1741 fora consagrada a Ermida de Nosso Senhor Bom Jesus, uma das mais tradicionais e conhecidas capelas do interior do estado do Rio de Janeiro, tal o número de milagres atribuídos a esse santo. Na verdade, a primeira capela fora construída no sistema de pau-a-pique e madeira roliça de pouca qualidade, razão pela qual resistiu, apesar das dificuldades estruturais, até a conclusão do santuário. Consta, inclusive, que suas precárias paredes somente resistiram até o dia em que terminaram as obras do templo, todas elas desabando de maneira inexplicável após o assentamento e consagração da imagem no novo altar.

De 1773 em diante, o Curato de Matosinhos (já com seu característico esboço de Santuário), ganhou fama e prestígio em face do hábito ali existente de receber romarias e pagamentos de promessas, A capela consagrada em 22 de junho de 1776 serviu a todos os habitantes da região paraibana de 19 de dezembro de 1777 até 1862, quando foi substituída por uma igreja maior levantada sob os auspícios de Martinho Álvares da Silva Campos (1816-1887), então proprietário da Fazenda Engenho de Matosinhos do Sardoal (fundada em 1818 para produzir açúcar em terras desmembradas da antiga Fazenda da Várzea deixada por Garcia Rodrigues Paes em Paraíba do Sul). Famoso líder do Partido Liberal, Martinho inclusive chegou ao cargo de Chefe de Ministros do Segundo Império no ano de 1881.

Credita-se ao padre Luigi Raymondo (1912-1992) e a Pedro da Costa Lima a atual e belíssima Matriz de Matosinhos, na qual se celebram missas em finais de semana. Localizado cerca de 18 quilômetros do centro de Paraíba do Sul e a cinco quilômetros e meio do distrito de Werneck (por estrada asfaltada), o Santuário recebe dezenas de milhares de romeiros e fiéis em sua festa anual, realizada sempre no último domingo do mês de agosto. Com efeito, a fama dos milagres e das graças alcançadas por intercessão do Bom Jesus foi ganhando regiões cada vez mais distantes e de todas elas começaram a vir peregrinos em romaria para venerar a imagem do Bom Jesus. Desse modo, houve a necessidade de se fazer uma igreja maior para atender aos peregrinos.

Na sala dos milagres organizada na parte posterior do altar-mor, existem dois quadros ofertados por devotos como prova de graças alcançadas e pinturas encontradas no subsolo da Igreja na área onde fora levantada a primeira capela. A bela matriz hoje ocupa um confortável espaço, e suas linhas neomodernistas são ainda mais acentuadas pelo belo conjunto de palmeiras que ladeiam sua principal rampa de acesso.

Já a área média do rio Fagundes - numa altitude aproximada de 300 metros, por onde também surgiu o arraial de Sebollas - caracterizou-se, desde os primórdios do século XVIII, por uma proveitosa e diversificada atividade agrícola, até mesmo por influência dos movimentos de circularidade humana verificados em torno da presença do Santuário. As belíssimas e agradáveis várzeas ali existentes - com acentuado destaque para Membeca, Rio Manso, Sertão do Calixto e Matosinhos - foram o berço de muitas famílias importantes no processo de ocupação do sertão paraibano, como, por exemplo, as estirpes de Caetano Borges da Costa, Calixto Cândido Gonçalves, Francisco Rodrigues Manso, Joaquim José dos Santos Silva e, em especial, Pedro da Costa Lima, este considerado o pioneiro que conferiu ao Santuário do Bom Jesus de Matosinhos o aspecto e a estrutura de que é dotado atualmente e também a ampla divulgação dos milagres efetuados pelo padroeiro.

Por outro lado, na larga esplanada englobada sob o nome genérico de Sardoal, nas glebas infletidas para o alto da Serra da Estrela, Manuel Vieira Afonso adquiriu, em 1768, um sítio às margens da variante do Proença, ampliado em 1780 para constituir a fazenda batizada como Córrego Seco, esta vendida em 1830 a D. Pedro I e posteriormente urbanizada por Júlio Frederico Köeller para arruar a cidade de Petrópolis sob os auspícios do Imperador Pedro II. Portanto, do Santuário de Matosinhos é possível também estabelecer contato rodoviário com Petrópolis, pois partindo da igreja basta seguir em direção ao logradouro de Secretário e ao Distrito de Pedro do Rio para se chegar à Cidade Imperial. Registre-se, a propósito, que Bom Jesus de Matosinhos encontra-se sob a administração eclesiástica da Diocese Petropolitana.

 

Na próxima edição: A Casa da Hera