Um terço de São Paulo para de respirar durante o sono
Pesquisa da Unifesp na capital paulista confirma aumento vertiginoso de distúrbios do sono principalmente entre os mais jovens
02/08/2019
Planeta Colabora
Edição 253
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Foto
1 - Adolescente com smartphone na cama: internet fez explodir incidência de
distúrbios do sono entre os mais jovens (Foto: Godong/ BSIP/AFP)
Elton
Alisson, de Campo Grande (MS)*
O
número de pessoas, de diferentes faixas etárias, que apresentam distúrbios do
sono tem aumentado vertiginosamente em diversas partes do mundo nas últimas
décadas. Na cidade de São Paulo, por
exemplo, uma em cada três pessoas tem apneia obstrutiva do sono, condição em
que a respiração para e volta diversas vezes enquanto se está dormindo. Os dados, que fazem parte da pesquisa
"Episono São Paulo", foram apresentados por Monica Levy Andersen, pesquisadora
do Instituto do Sono da Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp),
durante palestra na 71ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso
da Ciência (SBPC), realizada esta semana no campus da Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul (UFMS), em Campo Grande, com o tema "Ciência e inovação nas
fronteiras da bioeconomia, da diversidade e do desenvolvimento social".
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"Conhecemos
mais de 80 distúrbios do sono, como a apneia obstrutiva, insônia, bruxismo,
sonambulismo e parassonia [caracterizada por movimentos anormais durante o
sono], que são os mais prevalentes", disse Andersen. "Além de preexistir em
algumas pessoas, esses distúrbios ainda podem ser agravados pelo ritmo de vida
da sociedade atual, denominada 24/7/365 - em que as pessoas não funcionam bem
durante as 24 horas dos sete dias da semana e dos 365 dias do ano", acrescentou
a professora da Unifesp.
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"Nada foi mais
revolucionário e teve um impacto tão grande na privação do sono como a
internet, e a geração Z é a mais permeada por ela" - Monica
Levy Andersen, pesquisadora do Instituto do Sono
da Unifesp
Ela
destaca que a geração Z - composta por pessoas nascidas entre meados dos anos
1990 até o início dos anos 2010 - é a mais acometida pela falta de sono.
Algumas das razões para isso seriam que essa geração foi diretamente atingida
pela quarta e última grande onda causadora da privação do sono na sociedade
moderna: a criação da web e a popularização da internet a partir de 1995. As
outras três ondas foram a Revolução Industrial - com o surgimento de mais um
turno de trabalho -, o advento da luz elétrica, em 1879, e o advento da
televisão, na década de 1920. "Nada foi
mais revolucionário e teve um impacto tão grande na privação do sono como a
internet, e a geração Z é a mais permeada por ela", disse Andersen.
É
nessa geração que também se observa o maior consumo de substâncias para inibir
ou retardar o sono, apontou a pesquisadora. Entre os jovens, tem crescido o consumo de bebidas energéticas, por
exemplo, juntamente com bebidas alcoólicas.
As bebidas energéticas têm poucas substâncias estimulantes, como a
taurina e a cafeína. O efeito delas na privação do sono, contudo, é
potencializado pela ação do álcool das bebidas destiladas com as quais são
misturadas, explicou Andersen. "O álcool priva a execução dos sonhos, que
ocorrem durante quatro ou seis vezes durante o sono e têm duração total de,
mais ou menos, 90 minutos. E os sonhos são importantes porque proporcionam o
bem-estar físico e psicológico. Mas não se sabe ainda qual o mecanismo que faz
com que o álcool prive as pessoas dos sonhos", disse.
Foto
2 - A professora Monica Levy Andersen durante palestra na Reunião Anual da
SBPC: pesquisa indica que um terço dos moradores de São Paulo sofre de algum
distúrbio do sono (Foto: Elton Alisson/Agência Fapesp)
Privação
do sono em crianças
As
crianças representam outra parcela da população que tem sido muito acometida
pela privação do sono e que mais tem preocupado os pesquisadores da área.
Andersen citou estudos que apontam que 60% das crianças são privadas de sono
atualmente. Entre as principais causas estariam o uso excessivo de dispositivos
eletrônicos, como tablets e smartphones.
"Uma criança com 5 a 7 anos deveria dormir entre 9 e 11 horas por noite,
mas a maioria dorme muito menos do que isso", disse.
Algumas
das consequências do sono insuficiente em crianças são a piora do rendimento
escolar, aumento de peso, risco de desenvolver doenças cardiometabólicas na
vida adulta e alterações comportamentais, como hiperatividade. Enquanto em
adultos a privação do sono causa sonolência e a pessoa se torna menos
produtiva, em crianças a insuficiência de sono as torna hiperativas, comparou
Andersen. "Crianças muito irritadas ou muito ativas sinalizam privação de
sono", disse.
Um
estudo feito nos Estados Unidos mostrou que crianças que foram privadas de sono
durante uma semana, em que dormiram cinco horas por noite, pioraram o
desempenho em testes de atenção e tiveram menor nota do que tinham antes em
testes aritméticos. Outro trabalho mostrou que crianças com restrição de sono
por mais tempo começaram a ingerir maior quantidade de alimentos e bebidas
açucarados. "A privação do sono aumenta a preferência por alimentos calóricos e
a percepção da fome em razão do incremento da produção do hormônio da fome e a
diminuição do hormônio da saciedade", explicou Andersen. Além de alterar o humor, afetar a memória e a
atenção e aumentar a predisposição a doenças cardiometabólicas, como o
diabetes, a privação de sono pode afetar o sistema imunológico.
*Agência
FAPESP
"70/100 A série
#100diasdebalbúrdiafederal pretende mostrar, durante esse período, a
importância das instituições federais e
de sua produção acadêmica para o desenvolvimento do Brasil"