Fazenda Mulungu Vermelho, Vassouras

As origens dessa propriedade remontam aos primórdios do século XIX, quando suas terras, através do então costumeiro processo de doação de sesmarias, foram entregues ao capitão Antônio Luís dos Santos Werneck e à esposa Luiza Maria Angélica Werneck

 23/08/2019     Historiador Sebastião Deister      Edição 256
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As origens dessa propriedade remontam aos primórdios do século XIX, quando suas terras, através do então costumeiro processo de doação de sesmarias, foram entregues ao capitão Antônio Luís dos Santos Werneck e à esposa Luiza Maria Angélica Werneck (o mesmo casal que circulou também pela São Fernando de Massambará), a terceira filha de Inácio de Souza Werneck, patriarca da família Werneck e dono da Fazenda da Piedade, em Vera Cruz (hoje Município de Miguel Pereira). Cumpre dizer que o casal deu origem ao ramo familiar Santos Werneck, que logo estendeu seus domínios e sua influência desde Massambará, na área de Vassouras, até Bemposta, já em terras de Três Rios.

D. Luiza morreu em 1813 e o Capitão Antônio Luiz em 1825, com apenas 53 anos, de uma suposta "(...) inflamação do peito (...)" Esta é, provavelmente, a data em que Francisco Luiz dos Santos Werneck, um dos sete herdeiros do Capitão - casado com D. Maria Francisca das Chagas Werneck -, recebeu as glebas onde seria implantada a Fazenda São Francisco, atualmente chamada Mulungu Vermelho.

Assegura-nos o historiador Adriano Novaes, de Valença, que

"(...) pelo que consta, o Solar de São Francisco, na área rural mais distante de Vassouras, foi construído em 1831, na primeira fase do café no vale do Paraíba e, com pouco tempo de lavoura, tornou-se uma das mais prósperas de Vassouras. Tudo isso foi facilitado pela abertura da importante e pioneira Estrada do Comércio em 1816, que cortou as fazendas dos irmãos Santos Werneck, de ponta a ponta, trazendo-lhes grandes vantagens no transporte do café para os portos da baixada e posteriormente para os do Rio de Janeiro e finalmente os da Europa. Por essa mesma estrada subiram para o vale, pouco tempo depois, os primeiros requintes da Corte do Rio de Janeiro, transformando as sedes das fazendas cafeeiras em verdadeiros palácios rurais, que nada ficavam a dever às residências mais luxuosas da Capital do Império Brasileiro."

Certamente influenciado pela arquitetura mineira do século XVIII, o Solar de São Francisco recebeu uma repaginação neoclássica, estilo introduzido no Brasil em 1816 pela Missão Artística Francesa que deixou sua marca calcada em toda a arquitetura do Vale do Paraíba durante a fase mais rica do café. Tais sinais neoclássicos podem ser observados nas marcações dos cunhais, nos capitéis, nas cimalhas, nas sobrevergas e nos caixilhos cuidadosamente trabalhados.

O solar tornou-se uma das mais opulentas propriedades no chamado vale do Ribeirão Florência lá pelos anos cinquenta do século XIX, quando produzia, além de café, diversos cereais que chegavam até mesmo a abastecer algumas fazendas vizinhas. Em suas plantações principais - que chegaram a conter cerca de 280 mil pés de café - trabalhavam aproximadamente 110 escravos e mais um razoável número de empregados e colonos.

O comendador Francisco faleceu em 1871, sendo assim poupado de ver a decadência de sua querida fazenda. Já sua esposa Maria Francisca - que lhe dera três filhos - ali permaneceu às voltas com todos os problemas oriundos da ruína econômica imposta pelo gradativo desaparecimento das plantações de café, morrendo somente em 1886.

São Francisco então passou aos herdeiros Francisca Adelaide das Chagas Werneck (casada com o primo Luiz dos Santos Werneck), Zeferina Adelaide das Chagas Werneck (esposa de seu primo, o Capitão João Barbosa dos Santos Werneck, proprietário da Fazenda de "Cima", hoje Fazenda São Luiz) e Peregrino das Chagas Werneck.

O Capitão João Barbosa dos Santos Werneck e D. Zeferina trataram de comprar as partes relativas aos irmãos, tornando-se assim os únicos donos da São Francisco, da São Luiz e das Cruzes (antiga Páo Ferro), em cuja capela haviam se casado. João não chegou a desfrutar por muito tempo de suas propriedades, pois morreria pouquíssimo tempo depois, deixando-as para o filho Joaquim Barbosa dos Santos Werneck. Contudo, em 1903 Joaquim vendeu ao casal Fortunato Delgado Motta e Gabriela Messias Delgado Motta os 117 alqueires geométricos da fazenda, que incluíam o "Sítio Velho" e a Fazenda Páo Ferro (das Cruzes). Chegados do município mineiro de Lima Duarte, Fortunato e Gabriela iniciaram um novo ciclo na história da São Francisco: a do gado de leite, sem, no entanto, abandonar a tradicional cultura de café cultivado na fazenda até meados da década de 1940. Algum tempo depois, o casal adquiriu as fazendas vizinhas de São Luiz, Cachoeira Bonita e São José (antes conhecida como Dr. Reis).

Reportemo-nos novamente a Adriano Novaes. Segundo ele, Fortunato era um homem muito simples e bastante respeitado por seus 11 filhos - Maria (Nicota), Militão, Judithe, Mariana (Neném, falecida ainda bem jovem), Maria José, Jayme (Zezé), Geraldo, Francisco, Thereza, Ana (Anita) e Fortunato - tidos com sua amada esposa Gabriela Messias, filha de João Evangelista de Almeida Ramos e Mariana Evangelista Duque, os barões de Santa Bárbara do Monte Verde (...) Sinhá Gabriela, como era carinhosamente chamada pelos criados da fazenda, faleceu em 1935, mas Fortunato viveu até 1947.

Após sua morte, São Francisco foi desmembrada entre seus onze herdeiros. Em seguida, suas terras acabaram sendo fracionadas e o grande solar, apesar de ficar com uma área bem reduzida, foi vendido a Carmem Lahmeyer Duval e a seu marido Carlos Afonso Ferraz Duval, associados a Selma Ferreira da Silva. Encontrando o casarão em estado bastante precário, o casal Duval logo promoveu sua recuperação, embora ali residisse por pouco tempo.

Em 1988, a bela fazenda foi adquirida por Simone Marques Coimbra Pio da Fonseca, já ostentando o nome de Mulungu Vermelho.

 

Fonte Principal: Inventário das Fazendas do Vale do Paraíba