Fazenda Santa Genoveva
A fazenda teve origem em uma vasta gleba natural que formava um complexo composto por oito sesmarias denominadas Ubá, sendo apenas uma delas denominada Cazal.
20/12/2019
Historiador Sebastião Deister
Edição 273
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Seguindo pela
rodovia RJ-151 em direção à localidade de Três Ilhas, no trecho próximo a
Manoel Duarte (2º distrito de Rio das Flores), cobre-se 6,5 quilômetros em
estrada asfaltada até a entrada para a Fazenda Santa Genoveva. Este acesso
possui cerca de 6 quilômetros em estrada estreita e de terra batida, mas bem
conservada e asfaltada em trechos mais íngremes, e por ele alcançamos a sede da
fazenda entre morros cobertos de pastagens e com densa mata irrigada por muitas
nascentes e caracterizada pela paisagem formada pelo chamado mar de morros.
Ainda na entrada, do alto da estrada, podem ser vistas, à direita, algumas das
edificações do trato rural. Uma vez ultrapassadas a porteira e a casa do
colono, um estreito caminho de pé-de-moleque conduz o visitante até a sede,
cuja estrutura impressiona pela imponência do grande solar. Situado num platô
com a capela à sua direita, as construções estão voltadas para o vale. Na
baixada à frente, instalações de apoio às atividades rurais em geral e à
pecuária ocupam o local dos antigos terreiros de café. Centenárias araucárias
australianas, que chegam a atingir 50 metros de altura, aglutinam-se ao pomar de
jaqueiras, mangueiras, pitangueiras e goiabeiras, criando assim um bosque
concentrado na encosta imediatamente à frente da capela, conjunto que, ao lado da
casa grande, forma um cenário que dá uma pálida medida da pujança dessa notável
unidade agrária do século XIX. Com efeito, Santa Genoveva mantinha um admirável
conjunto de edificações assentadas em vários níveis do terreno, tabuleiros que
compunham os terreiros de café, senzala, tulha, depósitos e outras habitações,
além do luxo, da sofisticação e da inédita funcionalidade de possuir um sistema
de ferro-carril com vagões puxados por burros que interligava a bela fazenda a
outras propriedades e à estação ferroviária de Santa Rosa. Um vasto gramado
forra a área frontal do casarão, estendendo-se até a capela. Pela lateral
esquerda, um lajeado em pedras chega até a parte térrea do conjunto, aos
fundos, que configura a área de serviços da casa e que define, com o corpo
principal de dois andares do solar, o formato de um L invertido. Anexos e independentes
desse conjunto, nas laterais e ao fundo, há garagens, área de lazer e piscina.
A fazenda
teve origem em uma vasta gleba natural que formava um complexo composto por
oito sesmarias denominadas Ubá, sendo apenas uma delas denominada Cazal. As
terras dessas sesmarias ocupavam toda a vertente limitada pelas duas margens do
rio Paraíba do Sul, área inserida na antiga zona do Paty de Ubá, localidade hoje
denominada Andrade Pinto pertencente a Vassouras. Toda essa imensidão de terras
tinha um centro de administração na fazenda de Ubá, propriedade de João
Rodrigues Pereira de Almeida, o barão de Ubá. Este faleceu em 1830 e suas propriedades
passaram para seu único filho, José Pereira de Almeida, que, aos poucos, foi
vendendo as terras herdadas, mantendo em suas mãos tão-somente a fazenda de Ubá.
Em 1862,
Domingos Custódio Guimarães, mais tarde barão e posteriormente visconde do Rio
Preto, adquiriu de José Pereira de Almeida uma das oito sesmarias, batizando-a
com o nome de Santa Genoveva. Por volta de 1861, Maria Amélia, filha do
visconde do Rio Preto, casou-se com Domingos Theodoro d'Azevedo Júnior, data
provável em que receberam Santa Genoveva como dote de casamento. Consta que as
terras encontravam-se recobertas por intensa mata virgem, fato que demandou
alguns anos para que fossem abertas e se tornassem produtivas. Nesse interregno,
Domingos Theodoro adquiriu em 1865, em hasta pública, uma das propriedades
ligadas à fazenda do Paraíso, na freguesia de Santa Thereza de Valença (hoje
Rio das Flores). Para não confundir com a fazenda do sogro, criou para suas
terras o nome de São Polycarpo. Ali, residiu com a esposa e os filhos até 1870,
ano em que provavelmente ficou pronta a majestosa sede da Fazenda Santa
Genoveva, uma das mais sofisticadas da época.
Santa
Genoveva nasceu moderna, com um dos mais avançados processos de beneficiamento
de café. Segundo Eloy de Andrade, em sua obra O Vale do Paraíba, Azevedo Júnior
importou da Inglaterra as melhores raças de porcos, favorecendo os vizinhos com
a venda de reprodutores, além de gado de raça e equinos puro sangue. Portador
da Comenda Ordem da Rosa, Azevedo Júnior era também capitalista, além de fazendeiro,
e foi um dos fundadores da Companhia Estrada de Ferro Rio das Flores, da qual
foi presidente durante vários anos. Aumentou sua fortuna após o falecimento do
sogro, em 1868, tornando-se um dos homens mais ricos da região. De fato, Santa Genoveva passou a integrar um extraordinário
latifúndio composto pelas fazendas Paraíso, Loanda, Santa Rosa e Santa Luiza,
trazendo para o proprietário fortuna e imenso prestígio nas áreas de Rio de
Flores e Valença.
Quando o café
entrou em decadência e a situação se agravou com a Abolição da Escravatura em
1888, Azevedo Júnior tentou aliviar suas finanças empregando em suas fazendas
várias famílias de imigrantes italianos. Posteriormente, com o advento da
República, a família Azevedo Júnior passou a viver mais na Capital Federal do
que na fazenda, realizando constantes viagens à Europa, onde os filhos
estudavam. Nessa época o comendador Azevedo Júnior fundou o grupo Companhia
Agrícola Alto Parahyba, com sede em Niterói, para o qual vendeu, em 1890, as
fazendas Santa Genoveva e Loanda, adquirindo para essa mesma firma as fazendas
Santa Rosa e Santa Luiza. Esta última tornou-se a principal sede da família, em
cuja posse os descendentes permanecem até os dias atuais. Com a crise do
Encilhamento nos últimos anos do século XIX, a falência da companhia foi
inevitável e todas essas fazendas retornaram para a família. Após o falecimento
do comendador, em 1913, todo o vasto patrimônio foi dividido entre seus dez
filhos. Santa Genoveva e Santa Rosa foram herdadas pelo filho Dr. Domingos
Theodoro Guimarães d'Azevedo. Após seu falecimento, em 1953, elas passaram para
os netos Léo Theodoro, Maria Thereza e Maria Helena d'Azevedo.
A capela da Santa Genoveva pode
ser considerada como uma verdadeira Igreja em função de suas esplêndidas
dimensões, tendo sido levantada bem perto do palacete principal e ostentando
algumas características muito próprias da fase pré-republicana. Ela se destaca na paisagem com o corpo
central ladeado pelas sacristias, de telhados independentes, em meia água, e
mais baixos. As sacristias possuem acessos externos por portas de folhas cegas,
almofadadas, tipo camarão, com sobrevergas em massa. Em seu interior,
encontramos forro e assoalho simples em madeira, possuindo, cada sacristia, uma
janela para os fundos com guilhotinas externas em madeira e vidro e folhas
internas cegas. O campanário - com dois sinos mantendo o brasão do Império e
datados de 1861 - possui revestimento que imita o aparelhamento regular da pedra,
apresentando quatro sineiras em arco pleno e cobertura apoiada sobre
entablamento com cimalha e mísulas (parte superior de um pilar presa à parede),
revestidas em massa na forma de uma agulha hexagonal, terminada em aros
concêntricos encimados por cruz em ferro fundido.
Fonte Principal: Inventário das Fazendas
do Vale do Paraíba