Fazenda Santarém - Bemposta - Três Rios

Fazendas de Café do Vale do Paraíba Fluminense

 29/11/2019     Historiador Sebastião Deister      Edição 270
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A utilização do chamado Caminho de Mar de Espanha como rota alternativa pelos moradores do sudeste das Minas Gerais para alcançar a Estrada Real e, finalmente, o Porto de Estrela, na Baía de Guanabara, favoreceu o desbravamento das terras de Bemposta, onde se localiza a Fazenda Santarém. Essas matas interessaram ao desembargador Antônio Barroso Pereira, 8º Intendente dos Negócios de Diamantes da Coroa Portuguesa, no Tijuco (Diamantina), que, recém-casado com Mariana Jacinta, queria se estabelecer na região. Sua motivação imediata era morar próximo aos sogros, José Rabelo de Macedo e sua esposa D. Maria, proprietários da Fazenda Mato Grosso, em Sebollas e, por isso, Antônio adquiriu, no início do século XIX, grande quantidade de terras de Francisco Antônio de Carvalho, primeiro sesmeiro da região e parente de sua mulher. O desembargador, entretanto, faleceu cedo, deixando Mariana Jacinta com dois filhos pequenos batizados como Madalena Maria Pereira e Antônio Barroso Pereira, homônimo do pai.

Mariana casou-se em segundas núpcias com o capitão José Antônio Barbosa Teixeira, seu vizinho na Fazenda Mato Grosso, que tinha a alcunha de Tiramorros pelo fato de ter aberto várias estradas pela região dos três rios (Paraíba do Sul, Piabanha e Paraibuna). Unindo suas terras às da esposa, Tiramorros teve sob seus domínios toda a área situada à margem direita do rio Preto, desde São José da Serra (hoje São José do Rio Preto) até seu encontro com o Piabanha, e depois as terras seguindo pelo rio Paraíba do Sul até o marco da vila de Anta, em Sapucaia. Com a morte do casal (Mariana em 1833 e Tiramorros em 1834), sem deixar filhos comuns, as propriedades foram herdadas pelos irmãos Antônio Barroso Pereira e Madalena Maria Pereira Carvalho, filhos do primeiro casamento de Mariana. Registre-se que em finais do mesmo ano de 1834, Madalena ficara viúva do alferes Damaso José de Carvalho, que a deixara com seis filhos para criar com idades entre um e dezesseis anos. Antônio Barroso Pereira, nesta época, tinha se instalado em sua fazenda Cantagalo (em terras de Três Rios) e preferiu vender sua parte na herança dividindo pela primeira vez a fazenda Bemposta e negociando as partes com três proponentes distintos.

Conforme escritura passada em 1837, Antônio vendeu parte da fazenda Bemposta a Antônio Luiz dos Santos Werneck, o primeiro da estirpe Santos Werneck a se instalar em Paraíba do Sul. Com a morte de sua mulher, Antônio Luiz dos Santos Werneck resolveu alienar a seu primo José de Souza Werneck a fazenda Santo Antônio de Massambará, em Vassouras, onde vivia com a família, e mudar-se com os filhos para a fazenda Boa Vista, em Bemposta. Em 1840, sua filha Isabel Leopoldina Santos Werneck casou-se com Mariano José Barroso de Carvalho, filho de Madalena Maria. A Fazenda Santarém, então, foi dada como presente de casamento ao casal. Segundo Pedro Gomes da Silva, foi o dote oficial dos Werneck pelo enlace, mas o historiador Pedro Vianna Born, descendente do citado casal, afirma ter sido um presente de D. Madalena. D. Isabel Leopoldina, com dois filhos pequenos, de súbito ficou viúva de Mariano José e, como era costume na época para manter as propriedades em família, casou-se com seu cunhado Antônio José Barroso de Carvalho, irmão de Mariano, tendo então mais sete filhos.

A sede da Fazenda Santarém foi construída em 1851 e pertenceu às famílias Barroso de Carvalho e Werneck até o início da década de 1980, quando foi vendida por D. Léa Werneck a Olavo Monteiro de Carvalho. O atual proprietário foi o responsável pela primeira grande reforma da casa grande, entregando o projeto ao arquiteto Luís Amador. Na antiga fazenda de café, Olavo Monteiro de Carvalho fundou o Haras Itajoana e transformou as criações de gado Nelore e de cavalo Mangalarga Marchador nas principais atividades da Santarém.

A sede está implantada em área de relevo suave, entrecortada por córregos e servida por algumas represas. A paisagem alterna áreas desmatadas com trechos recobertos por vegetação em visível recuperação. Ao atravessar a ponte sobre o riacho que corre longitudinalmente entre a estrada e suas terras, avista-se o portal e os escritórios. Os terreiros de café surgem em seguida, divididos por pequeno ressalto com pavimentação original em cerâmica vermelha.

Ao longo dos terreiros, à esquerda, encontramos um bloco de construções de apoio à produção de café, que foi reformado para atender a novos usos. Estas construções e a casa-sede compõem dois lados do espaço quadrangular definido pelos terreiros. Contíguo aos terreiros de café e separado destes pela aleia de entrada, estende-se o magnífico jardim. O terreno em suave aclive é coberto por gramado muito bem cuidado, grupos de árvores frondosas e canteiros de flores. Destacam-se no jardim a sequência de árvores que compõem a alameda e sombreiam a entrada que leva à casa grande e a uma larga escadaria em pedra que interliga os dois patamares de jardim. Voltada para esse jardim, a casa se destaca pela sua imponência, marcada pela volumetria do telhado e acentuada pela horizontalidade do plano da fachada frontal. Interligada a esse corpo principal, mas ligeiramente recuada, foi acrescida uma nova construção. O casarão tem, acoplado ao bloco principal, uma ala de serviço formando uma planta em L invertido.

O espaço externo definido por estas duas alas abriga o jardim posterior, onde foi construída uma piscina. No prolongamento deste jardim estendem-se campos gramados e três represas. Além da casa-sede, um trecho de mata em recuperação ressalta o relevo dos morros meia laranja e contrasta com amplos paredões rochosos.

O telhado mantém o desenho original, com cobertura de telhas capa e canal e caimento em quatro águas, adequando-se às respectivas plantas - do corpo principal e lateral - que dão forma ao L da construção. Destaca-se um amplo beiral arrematado por cimalha em massa, pintada de branco e ressaltado por faixa verde. A interseção entre os dois telhados é harmoniosa, formando rincões e espigões. As coberturas dos alpendres da entrada e da varanda posterior, no entanto, estão posicionadas abaixo do telhado, seccionando os desenhos das cimalhas, evidenciando sua construção em épocas distintas. A fachada frontal é sóbria e se impõe por suas grandes dimensões. Apresenta vãos de mesma largura e espaçamento que lhe imprimem ritmo constante.

 

Fonte Principal: Inventário das Fazendas do Vale do Paraíba