Muvuca de sementes restaura área degradada
Em Diamantino - Mato Grosso, renda oriunda da coleta de sementes representou um ganho médio de R$ 3,4 mil em 2019
03/04/2020
Planeta Colabora
Edição 288
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Com cabelos descoloridos, piercing no
nariz e batom roxo nos lábios, Geovana Antunes Pivotto, uma jovem de 19 anos, é
o rosto da nova geração de assentamentos rurais no país. Sua estética é urbana
e contemporânea; seu modo de vida é rural e antigo. Sua família transformou a
muvuca de sementes no principal ganha-pão dos Pivotto. Disseminada no país há
13 anos pela Rede de Sementes do Xingu, esta técnica, que usa uma mistura de
sementes de diferentes espécies - daí o nome "muvuca" -, restaurou uma área
degradada. Além disso, gera emprego e renda, mantém a floresta em pé e custa
três vezes menos do que o plantio tradicional de mudas.
No assentamento Caetés, área rural de
Diamantino, onde Geovana mora e a 182km de Cuiabá - Mato Grosso, as famílias de
coletores derrubaram por terra a máxima de que "dinheiro não dá em
árvore". No ano passado, a renda oriunda da coleta de sementes representou
um ganho médio de R$ 3,4 mil por coletor local do assentamento. Para eles,
floresta vira semente e semente vira floresta.
Geovana é a segunda geração de uma família
que sabe exatamente o valor da floresta em pé. Até o seu sobrinho, o pequeno
Estevão Pivotto de um ano e seis meses, representante da terceira geração da
família, já aprendeu que com sementes pode comprar pirulitos. Os agricultores
rurais trabalham em parceria com a Iniciativa Caminhos da Semente, coordenada
pela Agroicone e com apoio técnico do Instituto Socioambiental (ISA). O projeto
foi criado para estimular a semeadura direta - em dez anos, já se tem uma
floresta baixa estratificada e, a partir deste período, novas espécies
(trazidas por aves, morcegos e outros animais) são colonizadas.
Em 2019, 700 hectares foram restaurados com a
muvuca de sementes em Diamantino. Este ano, a expectativa é atingir uma área de
2,1 mil hectares de área degradada na cidade. É que com a implementação
integral do Código Florestal, está prevista a compensação ambiental para quem
desmata, que também limita o espaço dentro da propriedade destinado à
plantação. Na região da Amazônia Legal, por exemplo, o percentual de área
preservada varia de 50% a 80%.
"O passivo florestal brasileiro é de 19
milhões de hectares, que estão espalhados entre Áreas de Preservação Permanente
(APPs) e Reservas Legais (RLs)", comenta Laura Antoniazzi, sócia da
Agroicone e coordenadora geral da Iniciativa. Só a Companhia Paranaense de
Energia (Copel), por exemplo, precisa replantar 17 mil hectares de floresta.
Recentemente, representantes da empresa estiveram em Diamantino para conhecer a
experiência de replantio via semeadura direta.
Entre os estados da Amazônia Legal, Mato
Grosso ocupa o segundo lugar no ranking dos dez maiores desmatadores do país,
perdendo apenas para o Pará. A pressão do desmatamento é constante na região de
Diamantino, onde a pecuária e a soja estão representadas por pesos-pesados
do agronegócio nacional: os grupos Maggi e JBS. No dia 14 de dezembro de 2019,
os agricultores familiares de Caetés plantaram 62 espécies de sementes.
Tinha de tudo um pouco: Jatobá, Periquiteira,
Pente-de-Macaco, Sucupira branca, Baru, Aroeira, Feijão Guandu e de Porco. No
mercado de sementes, o quilo da Sucupira custa em média R$ 600; o da
Periquiteira, R$ 122,00; e o do Jatobá, R$ 25,00. Parte das sementes foi usada
no Parque Sesc Serra Azul, também conhecido como Sesc Pantanal, em Rosário
Oeste, cidade vizinha a Diamantino. A demanda de restauração foi herdada do
antigo dono da área.
É fato que depois de misturar sementes de
diversas espécies nativas no quintal de casa e plantar tudo de uma vez só, a
aparência de confusão, bagunça e tumulto prevalecem no ambiente. Ledo engano. A
muvuca de sementes é uma técnica com forte componente de pesquisa. Várias
universidades e teses de doutorado vêm, nos últimos anos, dando suporte,
fazendo experimentos em campo na época certa (quando as chuvas começam) e
analisando toda a sobrevivência da planta até o final do primeiro ano. "É
muito cálculo e pesquisa envolvidos na 'muvuca' para garantir um mix de
sementes com proporções calculadas de forma a assegurar uma boa cobertura
florestal", explica Maxmiller Ferreira, técnico agropecuário e biólogo da
Agroicone.
*A repórter Liana Melo viajou a convite da
Agroicone.
Foto 1 - Geovana Pivotto com as sementes:
técnica de restauração de área degradada gera emprego e renda. (Foto:
Agroícone/divulgação)
Foto 2 - O pequeno Estevão, de um ano e meio,
no assentamento Caetés: valor da floresta em pé passado de geração em geração.
(Foto: Agroícone/divulgação)
Foto 3 - Produtor rural peneira sementes: no
ano passado, 700 hectares foram restaurados com a muvuca de sementes em
Diamantino. (Foto: Agroícone/divulgação)
Foto 4 - Sementes cultivadas em Diamantino:
agricultores familiares de Caetés plantaram 62 espécies em um dia. (Arte:
Agroícone)
Foto 5 - Agricultores familiares plantam
sementes no assentamento Caetés: ação pelo reflorestamento. (Foto:
Agroícone/divulgação)