A Coudelaria (Remonta) de AVELAR
Como curiosidade, podemos lembrar que Euclides Zenóbio da Costa era avô do músico Roberto de Carvalho, esposo e parceiro musical da cantora Rita Lee.
11/12/2020
Historiador Sebastião Deister
Edição 323
Compartilhe:
A
palavra coudelaria vem de capitão, ou mais precisamente
de coudel, que significa Capitão de Cavalaria. O termo foi criado em
terras portuguesas para designar o chefe de estabelecimento onde se criavam
cavalos de várias raças. O vocábulo tem origem no latim caput, isto é,
cabeça, com conotação vernacular de chefia. Em relação ao termo haras, trata-se
de um francesismo que designa um conjunto de cavalos destinados à reprodução,
com tal palavra, por vezes, sendo empregada em lugar de coudelaria. Com efeito,
garanhões de excepcional pedigree ganhavam nas coudelarias não apenas atenção,
mas valores, por vezes, extraordinários.
Com
efeito, o cavalo Alter-Real foi um animal de origem genuinamente portuguesa
graças aos trabalhos da Coudelaria Alter (Haras) fundado pelo
Rei Dom João V no início do século XVIII. À época,
trezentas éguas Andaluzas das mais nobres linhagens foram trazidas
de Jerez de La Frontera, na Espanha, para a Corte Portuguesa. O posto de criação foi
inicialmente batizado como Alter-do-Chão, mas depois seu nome foi mudado para
Alter-Real, sendo, inclusive, administrado pelo Príncipe D. João VI que, ao
fugir para o Brasil, conseguiu trazer alguns exemplares selecionados de seus
haras. Entre 1809 e 1810, a raça foi seriamente ameaçada durante
as invasões napoleônicas, quando as tropas francesas do General Junot roubaram
os melhores exemplares da raça. Posteriormente, cruzamentos dos animais
portugueses com estirpes inglesas e árabes enfraqueceram a raça,
provocando grande perda de suas características genéticas, enquanto no Brasil
os espécimes cruzados com éguas de sangue berbere acabaram por dar origem a uma
filiação dócil e de grande robusteza e elegância batizada de mangalarga
marchador.
Uma
das mais conhecidas coudelarias da região Sul Fluminense foi instalada no
distrito de Avelar, em Paty do Alferes, tendo como apoio um posto de
atendimento da rede ferroviária alocado praticamente defronte da Fazenda Pau
Grande. Esta parada ferroviária foi inaugurada em 1903 pela Estrada de Ferro
Central do Brasil em terras doadas pelos descendentes do visconde de Ubá (Joaquim
Ribeiro de Avelar Filho), sendo batizada com o mesmo título daquela grande
propriedade. Em 1928, grande parte das terras que circundavam a pequena estação
já estava inserida no patrimônio da ferrovia, razão pela qual mais tarde (cerca
de 1940) teve o nome trocado para General Zenóbio da Costa.
Registremos
que Euclides Zenóbio da Costa nasceu em Corumbá (Mato Grosso do Sul) em 9 de
maio de 1893, falecendo no Rio de Janeiro a 29 de
outubro de 1963. Filho e neto de militares, estudou no Colégio
Militar do Rio de Janeiro em 1903, de onde seguiu para a Escola
Militar de Realengo, concluindo em 1916 os cursos
de infantaria e cavalaria. Em 1924 participou da repressão
militar contra a revolução tenentista. Foi Comandante da Infantaria
da Força Expedicionária Brasileira, participando das operações de guerra
na Itália.
Em
12 de outubro de 1943 foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Militar de
Avis de Portugal, e no período de 10 de agosto de 1946 a 31 de março
de 1952 comandou a 1ª Região Militar, no Rio de Janeiro. Já em 1954, no
governo de Getúlio Vargas, foi nomeado Ministro da Guerra, assumindo
o cargo em decorrência da crise político-militar surgida com o Manifesto dos
Coronéis contra a permanência de João Goulart no Ministério do
Trabalho. Por outro lado, participou dos movimentos militares de 11 a 21 de
novembro de 1955, destinados a garantir a posse de Juscelino
Kubitschek na presidência da república.
Ao
lado de outros colegas militares e de alguns amigos de Paty do Alferes,
participou da criação do Ginásio Barão de Paty do Alferes (no grande prédio
atualmente ocupado pelo Hotel Arcozelo Palace), dirigindo-o por vários anos e
introduzindo o ensino médio na cidade com a colaboração de professores como
George Jacob Abdue, Mário Vasconcelos Lopes Rêgo, Alcebíades Balthar, Darcy
Jacob de Mattos, Conceição Mariotti e outros. Paty o homenageia, hoje, com a
colocação de seu nome em uma avenida no centro da cidade.
Como
curiosidade, podemos lembrar que Euclides Zenóbio da Costa era avô do
músico Roberto de Carvalho, esposo e parceiro musical da cantora Rita
Lee.
A
parada Zenóbio da Costa (da qual praticamente nada resta) fazia limite com o
Campo de Instrução D. Pedro II, pertencente ao 32º Batalhão de Infantaria de
Petrópolis para atender à Coudelaria de Avelar, bem mais conhecida como
Remonta, servindo, através de uma rampa, para embarque de cavalos destinados à
entrega em quartéis e casernas apropriadas do Rio de Janeiro e para recebimento
de víveres e de outros animais remetidos à Remonta para avaliação clínica,
tratamentos veterinários e treinamento.
As
organizações criadas como Remontas Militares abrangiam Seções Especializadas de
Veterinária conectadas diretamente com a Diretoria de Abastecimento envolvida com
todas as Organizações Militares do Exército que administravam um efetivo animal
aprovado e pronto para emprego nas várias atividades de segurança no país.
Algumas dessas coudelarias recebiam recursos financeiros e técnicos necessários
para o desenvolvimento de seus trabalhos nas áreas de clínica e de cirurgia,
atendendo equinos e também caninos. Uma de suas vertentes mais especializadas
ligava-se ao controle de reprodução desses animais, com cuidados específicos
nas áreas de imunidade, estudos de moléstias e vigilância sanitária.
Os
Serviços de Coudelaria eram administrados por um coronel-inspetor, titulado
Diretor de Remonta, subordinado diretamente ao ministro da Guerra, tendo como
auxiliares
um tenente-coronel, seu subdiretor; um capitão-assistente e três sargentos
auxiliares de escritório. A Diretoria dispunha, além das ordenanças relativas
aos oficiais, de mais dois subordinados para os serviços da secretaria e também
um chofer.
A
coudelaria de Avelar chegou a abrigar alguns ex-combatentes da 2ª Guerra
Mundial, mas atualmente tais instalações estão extintas. No caso de Avelar, a
remonta foi desativada em 1974. Com sua extinção - por se mostrar deficiente e
já sem finalidade -, foi então executado o plano de transporte dos animais nela
existentes para a Remonta de Pouso Alegre (Minas Gerais), sendo que cerca de
140 animais seriam depois transferidos para as coudelarias de Tindiquera e
Rincão, no Paraná. Nos anos cinquenta, na sede da Remonta de Avelar um cavalo
para atividades de segurança de ruas foi avaliado em Cr$ 125.000,00 (cento e
vinte e cinco mil cruzeiros) e um cavalo operacional (para uso direto do
Exército) em Cr$ 600.000,00 (seiscentos mil cruzeiros).