O Arraial de Sebollas

O arraial de Sant'Anna de Sebollas tem suas origens calcadas em 1723, ano em que o reinol Francisco Fagundes do Amaral e sua mulher Águeda Gomes de Proença receberam uma freguesia junto ao rio que logo depois foi batizado como Fagundes em homenagem àquele

 31/12/2020     Historiador Sebastião Deister      Edição 326
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O arraial de Sant'Anna de Sebollas tem suas origens calcadas em 1723, ano em que o reinol Francisco Fagundes do Amaral e sua mulher Águeda Gomes de Proença receberam uma freguesia junto ao rio que logo depois foi batizado como Fagundes em homenagem àquele desbravador. Entretanto, o local já era conhecido por esse curioso topônimo, uma corruptela da palavra "Sipollas" que, na língua provençal do Sudeste da França, na Idade Média, significava "região de lendária beleza e fertilidade, habitada por gente feliz." A lenda corrente na época dá conta de que alguns aventureiros, após passar por aquele local, acharam-no tão belo que o consideraram um eldorado em meio àquele sertão inóspito, consagrando-o então como Sant'Anna de Sipollas. Lenda ou não, o fato é que a freguesia incorporou essa inusitada denominação, e pela ligação de descendentes de Francisco e Águeda com os imigrantes Leandro Barbosa de Mattos (chegado de São João de Meriti) e Francisco Gonçalves Teixeira (vindo do Minho, Portugal), formaram-se ali os troncos das três famílias fundadoras do arraial. Importante ainda a registrar o fato de a irmã de Leandro Barbosa de Mattos - D. Mariana Barbosa de Mattos - vinha a ser esposa de Francisco Gonçalves Teixeira, e esse casal aglutinou seu nome, em definitivo, ao crescimento daquela pequena vila.

A primeira igreja de Nossa Senhora de Sant'Anna de Sebollas deu lugar a um cemitério colonial por volta de 1740. Interessante notar que o pioneiro Fagundes faleceu em 1732, sendo sepultado no cemitério do adro da capela de Nossa Senhora da Conceição e de São Pedro e São Paulo, na Ilha, em Paraíba, esta, por sua vez, levantada no ano de 1715. Por sua vez, sua esposa Águeda veio a falecer em 1740, tendo sido seu corpo inumado no recém-criado cemitério da Fazenda de Sebollas, o mesmo que, em 1792, receberia parte do corpo de Tiradentes.

A segunda capela de Sebollas foi construída por Provisão de 1 de setembro de 1769, graças a um requerimento enviado por Caetano Borges da Costa e Francisco Gonçalves Teixeira ao Governo da Província, ganhando assim a imediata condição de Curato, porém a criação eclesiástica da Paróquia de Sant'Anna ocorreu em 1839. Finalmente, em 1858 foi construída a primeira Igreja de Sant'Ana de Sebollas, transferida para a atual posição em 1894.

Município de Paraíba do Sul

Pelo Decreto-Lei nº 153, de 7 de maio de 1839, o Governo Provincial elevou Sebollas à categoria de freguesia, anexando-a como Capela Filial do Milagroso Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, de Sardoal. Por seu turno, a Lei nº 2.999, datada de 3 de dezembro de 1869, mudava o nome de Sant'Anna de Sebollas para Sant'Anna de Tiradentes, concorrendo para tanto os trabalhos legislativos desenvolvidos pelo vereador Dr. Leopoldo Teixeira Leite e pelos deputados Diocleciano Alves de Souza e Sebastião Modesto. Todavia, o termo Sebollas não seria apagado da memória dos moradores locais. Apesar de todos os movimentos legislativos buscarem fixar a designação de Sant'Anna de Tiradentes para aquele logradouro, ele continuou a ser chamado de Sebollas, muito embora toda a população paraibana reconhecesse o mérito de ali se perpetuar o nome de um brasileiro tão conhecido quanto o Alferes Joaquim José da Silva Xavier. Tempos depois, o Decreto estadual nº 641, de 15 de dezembro de 1938, mudava o quadro territorial a vigorar no quinquênio 1939-1943, alterando ao mesmo tempo o topônimo do lugar. Com isso, o Distrito de Sant'Anna de Tiradentes era consagrado então com a designação de Distrito de Inconfidência, arrolado na Prefeitura Municipal como 3º Distrito do Município de Paraíba do Sul.

A igreja

A atual igreja é de arquitetura vernacular, com porta principal em arco pleno, frontão triangular com óculo central e uma torre sineira. Suas paredes laterais possuem seis óculos com vitrais de origem francesa. A nave principal possui um lustre em prata de lei ornamentado com detalhes cinzelados. No altar-mor impera o belíssimo ícone de Nossa Senhora de Sant'Anna tendo a seus pés uma comovente imagem de Cristo Morto, peças atribuídas a um entalhador do século XVIII. O batistério é singelo, com pia batismal de mármore. A sacristia abriga um quadro a óleo sobre tela de 1888, retratando cenas religiosas sem identificação do autor, baixelas religiosas, imagens variadas em gesso, tocheiro de latão, vasos maiores (turíbulos) para queima de incenso e recipientes menores chamados navetas. O acesso ao coro possui escada em caracol confeccionada em fino acabamento rendilhado.

A guarda do acervo

Todo o acervo sacro da igreja está sob a guarda do Museu Sacro Histórico Tiradentes (inaugurado em 21 de abril de 1972 por Raymundo Padilha, então governador do estado do Rio de Janeiro, e pelo senhor Nelson Aguiar, prefeito de Paraíba do Sul, como parte das comemorações do sesquicentenário da Independência do Brasil).

Outros grandes povoadores de Sebollas foram o mestre de campo Bartolomeu Bahia, o capitão Luís Alves de Freitas Belo e sua mulher, Ana Quitéria Joaquina de Oliveira (avós maternos de Duque de Caxias, Luís Alves de Lima e Silva) e Nicolau Viegas de Proença, entre tantos outros.

A freguesia de Sebollas logo incorporou três capelas filiais: a do senhor Bom Jesus de Matozinhos, reedificada em 1862 pelo conselheiro Martinho de Campos; a capela de Santo Antônio do Rio Manso, ereta em 1872 por Joaquim Pinto de Lima, e a capela do mártir São Sebastião, na fazenda do Sertão do Calixto, construída em 1874 por Ana Joaquina da Conceição.

Com o desvio do caminho de ligação com Minas Gerais para o vale do Rio Piabanha (Estrada União e Indústria, construída em 1861 para atender Petrópolis e Juiz de Fora), o trânsito por Sebollas diminuiu bastante, prejudicando aquela região e condenando o arraial a um triste esquecimento.

Segundo o historiador Luiz Carlos Coelho, da Fundação Cultural de Paraíba do Sul, a Igreja de Nossa Senhora de Sant'Anna de Sebolas foi cenário de uma história que envolveu um falso padre. Um foragido nazista chamado José Lockner assassinou o pároco de Nossa Senhora de Sant'Anna de Sebollas, assumiu sua identidade e roubou um valioso candelabro de prata do templo, que só foi recuperado anos depois em um antiquário na cidade do Rio de Janeiro. Descoberto, ele foi banido de Sebollas e fugiu para o município de Matias Barbosa, em Minas Gerais, onde cometeu outros crimes e acabou sendo linchado pela população local.