Museu de Tiradentes em Sant'anna de Sebollas, Distrito de Paraíba do Sul

Tiradentes passou então a disseminar sua palavra por estradas, aldeias e vilas, entre elas Sant'Anna de Sebollas, onde costumava se hospedar na fazenda de Anna Mariana Barbosa, cuja família mostrava simpatia pela causa mineira.

 08/01/2021     Historiador Sebastião Deister      Edição 327
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Joaquim José da Silva Xavier nasceu em uma casa modesta no Sítio do Pombal, distrito de São João d'El Rei, no dia 12 de novembro de 1746. Cresceu sem grandes instruções, uma vez que naquela época o saber era privilégio dos mais abastados e as escolas muito raras no interior mineiro. Foi comerciante, ambulante, minerador e tropeiro de caravanas, chegando ao posto de Alferes num Regimento de Cavalaria (patente hoje correspondente a segundo sargento). Com o tempo, Joaquim José (já apelidado Tiradentes em função de seus trabalhos como dentista pelas povoados e caminhos mineiros) mostrou-se descontente e mesmo revoltado com a série de erros e crueldades cometidos pelos homens que comandavam o país. Assim, não tardou a se aliar a outros conspiradores como Thomaz Antônio Gonzaga, Cláudio Manuel da Costa e Alvarenga Peixoto, todos inspirados pelo ideal de criar, a partir de Minas Gerais, um governo independente de Portugal.

Entusiasmado pelo movimento e pelas ideias libertárias, Tiradentes passou então a disseminar sua palavra por estradas, aldeias e vilas, entre elas Sant'Anna de Sebollas, onde costumava se hospedar na fazenda de Anna Mariana Barbosa, cuja família mostrava simpatia pela causa mineira. Na realidade, sabe-se que ele e Mariana mantiveram uma relação íntima e apaixonada. Contudo, os planos dos inconfidentes foram repassados por Joaquim Silvério dos Reis ao visconde de Barbacena (Afonso Furtado de Castro), que determinou, imediatamente, a prisão de todos os rebelados. Joaquim José acabou preso, julgado e condenado à morte em 19 de abril de 1792. Às 7 horas da manhã do dia 21 de abril, o negro Capitânia, nomeado seu carrasco, entrou no oratório da cadeia, trazendo nos braços a corda grossa e comprida e o camisolão branco dos condenados. Descalço, altivo e de passo firme, com a corda presa ao pescoço, Joaquim José seguiu à frente dos soldados. O cortejo chegou ao Largo da Lampadosa e subiu com lentidão os degraus do cadafalso. Tiradentes, então, simplesmente beijou o crucifixo oferecido por um dos religiosos. Às 11 horas e 20 minutos de 21 de abril de 1792 balançou no ar o corpo do mártir da Inconfidência, o homem que encarnou o espírito do povo mineiro que, inconformado, trazia na alma a chama da liberdade tão bem representada hoje pelo lema Liberta quae sera tamen (Liberdade ainda que tardia).

Alguns de seus restos mortais foram dependurados em postes junto à Fazenda das Sebollas, enquanto outras partes do corpo esquartejados foram enterradas, em segredo, sob o altar da Capela de Sant'Anna daquele arraial. Ao lado na igreja, o então prefeito de Paraíba do Sul, Nelson Espíndola de Aguiar, criou, em 21 de abril de 1972 (ano do Sesquicentenário da Independência) o Museu Sacro-Histórico Tiradentes: uma pequena casa, nos arredores da velha Estrada do Proença, abrigando ali um acervo representativo das relíquias do herói nacional distribuídas por pequenas salas, tais como réplicas de fardas do alferes, sua maleta de dentista, uma pia inglesa de metal que pertencera à fazenda de Sebollas, além da coroa e do cetro que ele doara para a capela local. Durante escavações realizadas no lugar visando à construção do museu foi encontrada uma ossada masculina atribuída ao alferes. Protegidos por uma redoma de vidro, os ossos do mártir estão expostos ao lado de pedaços do caixão da sua amada Mariana Barbosa e de alguns documentos de época.

Por efeito do Decreto Estadual nº 641, de 15 de dezembro de 1938, por ocasião da Emancipação de Entre-Rios que fixou o quadro territorial em vigor para o quinquênio 1939-1943, o Distrito de Sant'Anna de Tiradentes do município de Paraíba do Sul teve seu topônimo alterado para Inconfidência. Já o Decreto-Lei Estadual nº 1063, de 18 de janeiro de 1944, determinou que Inconfidência fosse arrolado como 3º Distrito de Paraíba do Sul, passando definitivamente a ser conhecido como Sebollas.

Abaixo, apresenta-se a transcrição da sentença que levou Tiradentes à forca (com grafia de época), contida na folha 90, verso do Livro 9, Arquivo da Inconfidência em Minas, Armário nº 1):

 

                                                "Portanto, os Juízes condenam o Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha Tiradentes Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas a que com baraço e pregação seja conduzido pelas ruas publicas ao logar da forca e nella morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Villa Rica aonde em lugar o mais publico della será pregada, em um poste alto até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregado em postes, pelo Caminho de Minas no sítio da VARGINHA e DAS SEBOLLAS [área de Paraíba do Sul] AONDE O RÉU TEVE AS SUAS INFAMES PRATICAS, e os mais nos sítios de maiores povoações até que tempo também os consuma; declara o Réu infame e seu filhos e netos tendo os seus bens aplicados para o Fisco e Camara Real, e a casa em que vivia em Villa Rica será arrasada salgada, para que nunca mais no chão se edifique, e não sendo propria será avalliada e paga a seu dono pelos bens confiscados, e no mesmo chão se levantará um padrão, pelo qual se conserva em memória a infame deste abominável Réu."

                                             Rio de Janeiro, 18 de Abril de 1972

 

Vas, los Gomes Ribr.o Cruz e Silva Veiga

Guerreiro Montr.o Gayoso

 

Completando a sentença, arrolavam-se os nomes de todos os outros inconfidentes seguidos de suas penas com a chancela do então Vice-Rei do Brasil, o conde de Resende (José Luís de Castro), plenamente referendadas por D. Maria I, a Louca, avó de D. Pedro I.

Em Sebollas, ergue-se o Conjunto Histórico Tiradentes, inaugurado em 21 de abril de 1972 pelo prefeito Nelson Espíndola de Aguiar ao lado do governador Raymundo Padilha e do Dr. Luiz Gonzaga, arquiteto que projetou o museu. A área histórica é composta pela Igreja de Nossa Senhora de Sant'Anna; pelo marco erguido pelo Exército Nacional em 1966; pela plataforma do conjunto embasando três mastros; pelo triângulo revestido de vidro vermelho procedente da Bélgica, simbolizando a Inconfidência Mineira, ostentando a célebre frase Liberta quae sera tamen; pela placa de 7 metros de comprimento comemorativa do Sesquicentenário da Independência do Brasil, com reverenciamento à memória do Patrono Cívico do Brasil, e pelo prédio do Museu Sacro Histórico da Inconfidência.