Por trás da pornografia
Qual é o impacto da pornografia na (des)educação sexual das crianças e adolescentes?
13/10/2023
Sexóloga Clarissa Huguet
Edição 470
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Hoje
vamos falar sobre um tema duro que todos vocês conhecem, uns o tem presente na
sua vida, outros não. Vamos falar sobre pornografia. Para falar sobre o
significado deste termo, nada melhor do que acessar a etimologia da palavra.
Pornografia é um termo que chegou ao Brasil no século XIX, do francês "pornographie".
Essa palavra nasceu com um sentido ligado à prostituição. Foi em meados do
século XIX que ela passou a ser empregada para designar a arte, em especial
aquela produzida na antiguidade que retratava temas obscenos. Vale pontuar que
a raiz do termo francês estava plantada no grego, língua que tinha palavras
como pórne, "prostituta", e pórnos, "que se prostitui", além de
pornographos, "autor de escritos sobre a prostituição". Perceba que
todos esses termos traziam embutida a ideia de comércio, de compra e venda.
Corpos compráveis, vendáveis, corpos a serem usufruídos. Comércio,
objetificação destes corpos femininos que estão ali para servir ao homem,
reproduzindo e alimentando a lógica do patriarcado.
Mas e o erotismo?
Seria
este um termo com significado similar ao pornô? Não. A pornografia está
relacionada à devassidão sexual, ao que é considerado obsceno, indecente,
agressivo, o que acaba por se relacionar com violência(s) e com as relações de
subordinação sexual. Na pornografia, a mulher, o corpo feminino é tido como um
objeto, como um produto a ser consumido. O ato sexual é explícito, não há uma
história ou uma contextualização. Já a palavra erotismo deriva de Eros, que
representava o Deus grego do amor e da paixão. O erotismo refere-se à
sensualidade e às diferentes formas de se provocar excitação e desejo sexual, porém
ligados ao amor e não ao comércio, sendo, inclusive, instrumento de inspiração
para as artes e a literatura. O erotismo insinua, deixando espaço para a
imaginação, enquanto a pornografia é explícita.
Partindo
deste pressuposto, qual é o impacto da pornografia na (des)educação sexual das
crianças e adolescentes? Bem, a educação sexual deveria ser realizada todos os
dias desde o nascimento do bebê. Um dos enormes problemas da nossa sociedade é
exatamente a quase inexistência de uma educação sexual nos lares e nos
currículos escolares. Pais e cuidadores não sabem como educar sexualmente seus
filhos, eles mesmos muito provavelmente não receberam educação sexual e boa
parte acredita no mito de que educação sexual erotiza as crianças e/ou que vai
incentivar a iniciação sexual precoce de crianças e adolescentes. Vale lembrar
que a OMS (Organização Mundial da Saúde) já comprovou, ao analisar mais de mil
relatórios sobre os efeitos da educação sexual no comportamento de jovens, que
quanto mais informação de qualidade sobre sexualidade, mais tarde os
adolescentes iniciam a vida sexual. E vice-versa.
Quando
aquela criança, futuro adolescente, acessa conteúdo online sem supervisão, e
sabemos que isso é o que mais acontece, ele vai ter a sexualidade pautada pela
pornografia. E o que isso quer dizer? Que ela vai entender que aquilo que ela
vê na tela é como deve ser a realidade, que as mulheres devem ser tratadas
daquela maneira agressiva, inferiorizada e subjugada; e que sexo é sobre
performance, sobre desempenho, o que se distancia sobremaneira de uma relação
positiva onde há uma conexão saudável e prazerosa.
Em 2022,
foi divulgado relatório de um estudo que mostra que brasileiros começam a
acessar pornografia, em média, aos doze anos de idade. A adolescência inicia
aos doze anos de idade, ou seja, estamos falando de uma adolescência toda sob
influência de conteúdo pornô em um país onde não há educação sexual bem
orientada. O Brasil hoje ocupa o 7º lugar no ranking de assassinatos de
mulheres no mundo, lembrando que feminicídio é um crime motivado pelo ódio,
pelo sentimento de posse por parte do feminicida. No Brasil, uma mulher é
estuprada a cada 10 minutos; uma mulher é vítima de violência doméstica a cada
4 horas. Essa realidade precisa mudar, e os homens precisam entender que eles
devem ser parte ativa nesta mudança.