Alternativa para a saúde que o Estado ignora
A Apepi, com 70 colaboradores e 8 mil associados, opera aguardando a definição normativa da Anvisa.
17/11/2023
Cannabis medicinal é vida
Edição 475
Compartilhe:
A
comercialização de medicamentos à base de Cannabis no Brasil enfrenta complexidades
regulatórias, com permissão apenas para produtos importados, resultando em
custos elevados. Associações de pacientes, ignoradas pelo Estado, tornaram-se
centros de excelência na produção acessível e segura de medicamentos
certificados por universidades prestigiadas, oferecendo alternativas mais
acessíveis e contribuindo para o conhecimento em pesquisa da planta Cannabis sativa.
Essas ONGs
desafiam as normas, expandindo-se sem regras impostas pela Anvisa, enquanto o
Estado, indiferente, vê o movimento crescente de cerca de 80 organizações que
atendem mais de 100 mil pacientes. O paradoxo é evidente: enquanto as associações
se multiplicam, o Estado mantém-se alheio, relegando essas iniciativas à
ilegalidade.
O silêncio dos Três
Poderes ecoa nas prisões de indivíduos movidos pela compaixão e busca por
alternativas terapêuticas, enredados em leis desatualizadas. Na última
quarta-feira, dia 8, um veredicto lançou a Associação de Apoio à Pesquisa e
Pacientes de Cannabis Medicinal (Apepi) no epicentro dos debates. Em 2019, a
Apepi obtivera, em primeira instância, uma vitória crucial contra a Anvisa,
garantindo direitos desde o cultivo até a pesquisa de produtos à base de Cannabis.
No entanto a esperança foi dissipada por um recurso da Anvisa, resultando numa
vitória meramente formal.
A Apepi, com 70
colaboradores e 8 mil associados, opera sob a alegação de desobediência civil,
aguardando a definição normativa da Anvisa. Atualmente, cerca de 80
organizações no Brasil funcionam com base em raízes sociais e históricas,
destacando-se não apenas como produtoras de medicamentos, mas também por
oferecer acolhimento humanizado e estabelecer parcerias de pesquisa.
O veredicto, impactando
a Apepi no Rio de Janeiro, provavelmente influenciará outras entidades no
Brasil, solidificando entendimentos nos tribunais. O principal argumento
jurídico centrou-se na separação dos Poderes, defendendo que o Executivo, por
meio da Anvisa, deveria regulamentar a questão. Entretanto a omissão de mais de
17 anos descumpre a Lei 11.343 de 2006, que exige a criação de regulamentação
para pesquisa e uso medicinal da Cannabis. Sem proteção jurídica
efetiva, as organizações enfrentam ameaça iminente de fechamento, dada a
omissão dos Três Poderes.
A Anvisa declara
incompetência para regulamentar a Cannabis, o Legislativo paralisa
o Projeto de Lei, e o Judiciário, surpreendentemente, rejeita sua competência. Paralelamente,
no mesmo dia do julgamento, a Anvisa aprovou quatro novos produtos à base de
Cannabis de grandes farmacêuticas. Enquanto isso, o futuro das ONGs permanece
incerto, submetido à complexidade do sistema legal brasileiro. Cabe a todos
nós, enquanto sociedade, questionar e pressionar por uma resolução que respeite
os direitos fundamentais à saúde e à vida.
O futuro dos pacientes e
das associações de Cannabis medicinal precisa estar escrito. É
tempo de dar voz a uma história que, apesar de silenciada, pulsa com a vida e a
esperança de milhares. A história das associações de Cannabis no
Brasil, marcada pelo que o Estado prefere ignorar, merece ser contada,
discutida e compreendida.
*Margarete Brito, advogada, é fundadora-diretora da
Associação de Apoio à Pesquisa e Pacientes de Cannabis Medicinal
https://leiaisso.net/5k1gs/