Fazenda Monte Alegre
Paty do Alferes a Caminho do Bicentenário - IV
08/06/2018
Historiador Sebastião Deister
Edição 193
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Maior centro
administrativo entre todos os estabelecimentos agrícolas comandados por
Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, o barão de Paty, a concorrida e lucrativa
Fazenda Monte Alegre era a mais bem aparelhada em número de escravos, em mão de
obra especializada, em instalações gerais, em instrumentos de produção e no
trabalho geral de campo, além de possuir uma localização geográfica esplêndida,
já que se distanciava a menos de meia légua da Vila de Paty do Alferes. O barão
comprou a Fazenda Monte Alegre de seu tio Francisco das Chagas Werneck, irmão
de sua mãe, e nela passou a residir, a centralizar seus inúmeros negócios e a
concentrar e arquivar toda a documentação relativa à inspeção de suas lavouras
e às atividades desenvolvidas em outras propriedades da família a partir do ano
de 1853. Já em 1859, Monte Alegre possuía 200 escravos, avaliados num montante
considerável de Rs. 396:899$000 (trezentos e noventa e seis contos e 899 mil
réis), como consta no inventário do barão. É certo que as avaliações de mão de obra
negra variavam de Rs. 100$000 (cem mil réis) a Rs. 2:500$000 (dois contos e
quinhentos mil réis), mas apenas dois escravos, de nomes Fortunato e Joaquim,
foram considerados "sem valor", talvez por invalidez, talvez pela idade avançada.
Entre todas as
fazendas do barão, as instalações de Monte Alegre mostravam-se, de fato,
inigualáveis. Compreendiam a casa de
moradia com oratório próprio, no valor de Rs. 10:500$000 (dez contos e
quinhentos mil réis); moinho; engenho de fazer farinha; 59 lances de senzalas,
sendo 3 deles com assoalhos; serra; pilões; 1 olaria; 1 forno e mais seus
utensílios próprios; 2 lances de casas para guardar carretões e charretes; 10
lances de armazéns de café e tulhas; 1 engenho de serra; armazém de guardar
tábuas; casas de agregados; ranchos nas roças; 1 canavial; diversos cafezais; 9
lances de casas assoalhadas que serviam de enfermarias para os escravos, dos
quais 3 ainda tinham forro e 11 lances de casa onde se achavam colocados os
engenhos de cana.
Monte Alegre ainda
possuía mobílias de mogno, jacarandá, cedro e peroba. Havia no grande salão um
belíssimo piano, e para servir seus hóspedes o barão utilizava-se de um serviço
de louça da Índia que podia vir acompanhado de um valioso aparelho de
porcelana, no qual apareciam a firma e o brasão da família.
Em 1859, um
acontecimento inesperado veio a alegrar bastante a vida dos moradores da Vila
de Paty do Alferes. O Imperador D. Pedro II ali apareceu de súbito, chegando de
Petrópolis por uma picada aberta pelas colinas periféricas ao povoado, a qual,
alguns anos mais tarde, seria alargada e conhecida como "Estrada do Imperador". Atraído pelas notícias que davam conta das
excelências do clima da região e desejoso de desfrutar da hospitalidade
concedida pelo barão de Paty, o Imperador apareceu a cavalo no centro da Vila,
resguardado por uma comitiva bem numerosa, deixando entre perplexos e até mesmo
céticos os moradores mais humildes do lugar, mas causando pânico entre as
autoridades e os nobres locais, que não podiam sequer sonhar com uma visita tão
ilustre e respeitável. Tocado em sua sensibilidade por aquela alentadora
presença em suas terras - não fosse ele um nobre Cavaleiro do Império - o barão
de Paty, de pronto, recebeu Sua Majestade em seu palacete no centro da Vila,
oferecendo aos empertigados convivas uma recepção de vulto, guarnecida pelas
mais finas iguarias da terra e alguns vinhos por ele guardados, com carinho,
para uma ocasião única e memorável como aquela.
À época, várias
fazendas, contudo, já começavam a enfrentar os ventos amargos da decadência
que, em breve, iria abater-se sobre todas elas, desde o Vale do Paraíba até os
recônditos da Serra do Tinguá. A terra já esgotada, os cafezais velhos
produzindo muito pouco e as dificuldades de se obter mão de obra escrava - a
cada ano que passava mais rara, combatida e cara - levaram os fazendeiros a
valorizar as terras que possuíam em meio às matas virgens, nomeando-as em
escrituras e inventários na tentativa final de valorizá-las ainda mais, já que
eram as únicas que, ainda não exploradas, poderiam ser aproveitadas em
eventuais plantações. Também Monte Alegre e as demais fazendas do barão não
escaparam do abraço asfixiante da decadência agropastoril do final do século
XIX que, enfim, culminaria na Abolição da Escravatura.
De qualquer
maneira, Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, o 2º barão de Paty do Alferes,
foi, sem favor, um dos maiores exemplos de grande fazendeiro da época imperial
brasileira, cuja vida transcorreu ligada diretamente ao crescimento extraordinário
da cafeicultura e ao brilho da Corte no decurso do Segundo Reinado.
Depois de dedicar
toda sua vida às suas amadas fazendas, à família que tanto protegia e ao
Império que venerava, o barão veio a falecer de congestão cerebral na Fazenda
Monte Alegre no dia 22 de novembro de 1861, sendo sepultado no cemitério de
Paty do Alferes.
Durante muitos anos, a Monte Alegre ficou relegada
a um total abandono. Felizmente, em 1976, o engenheiro e escultor Antônio
Gabriel de Paula Fonseca Junior decidiu, como ele mesmo disse, "comprar e peitar a empreitada de restaurar
tudo". Segundo suas lembranças, foram gastos cinco anos nos trabalhos, mas,
enfim, a bela fazenda de novo brilhou nas terras patienses. A família lembra
que a fazenda também pertenceu a Antônio Faustino Porto entre os anos de 1939 a 1945, que no período
administrou o Hotel Monte Alegre. Curiosamente, entretanto, não houve registro
dessa compra. Nos últimos anos, a fazenda tem servido de palco para as
atividades culturais e artísticas promovidas pelo Festival Vale do Café. Em
seus jardins encontram-se distribuídas várias esculturas criadas pelo próprio
Gabriel Fonseca, porém a propriedade não abre para visitas regulares.