Jandira Feghali: Brasil: Operação Matar e o "auto de resistência"

O Estado precisa romper com o espírito militar de confronto bélico que ronda as corporações desde a ditadura

 18/09/2015     Opinião      Edição 51
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13/09/2015 00:05:54

O DIA

Rio - Cristian Andrade, de 12 anos, está inerte no chão frio e úmido da Favela de Manguinhos. Está morto diante do choque de familiares e amigos. Esta é uma das áreas mais carentes da cidade e, não por acaso, palco de chacinas silenciosas contra jovens pobres e, quase sempre, negros. Tem sido a bala da polícia que mata sem perguntar, que encerra sonhos sem questionar, que veda o futuro de inocentes ou alternativas aos que fazem parte do mundo do crime. É o fim e pronto.

Este é um debate que mora no coração do Rio. Calado no silêncio dos jovens que tombaram no asfalto pela morte ou na dor e angústia das famílias despedaçadas. Parece coincidência a morte de Cristian durante operação da PM, mas tem se tornado mais uma estatística galopante junto a de tantas outras. É o extermínio revestido de legalidade.

A letalidade policial é mais bem entendida por meio de pesquisas como a da Anistia Internacional, que aponta o Brasil como detentor do maior número geral de homicídios no planeta. Somente ano passado 15,6% desses crimes foram praticados por estes agentes públicos. Ou seja, a segunda polícia que mais mata no mundo, perdendo apenas para a dos Estados Unidos.

A prática é chocante: costumam atirar em pessoas que já se renderam, que estão feridas ou sem advertência que permitisse que o suspeito se entregasse. É atroz. É injustificável.  Essa face violenta se revela também pelo relatório do ISP: somente em julho 61 pessoas morreram em decorrência de autos de resistência. Segundo a Anistia, desde 2011, esses homicídios praticados por policiais representam 16% das mortes violentas em todo o estado.

Num cenário crítico como este, é dever do Congresso debater a desmilitarização das polícias e medidas de investigação e punição das más condutas policiais. O Estado precisa romper com o espírito militar de confronto bélico que ronda as corporações desde a ditadura. Série de propostas de emendas constitucionais e projetos de lei está no Parlamento, e nenhum legislador deve se omitir. Continuar perpetuando as mortes de jovens pobres é atuar velozmente pelo fim do futuro, ceifando vidas mais rápido que o ritmo dos gatilhos.

Jandira Feghali é deputada federal e líder do PCdoB na Câmara dos Deputados