Abraham Medina - Estudo biográfico 35
E finalmente, em 1963 Medina realizou seu sonho. Criou em Miguel Pereira sua Colônia de Férias, para onde trazia funcionários, parentes, amigos e artistas (espaço atualmente ocupado pela Pousada Miguel Pereira).
27/05/2016
Historiador Sebastião Deister
Edição 87
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Filho de Isaac Medina e Sultana Garson, Abraham Medina nasceu em Belém do Pará no dia 16 de dezembro de 1916, tendo como irmãos Jacob, Sol e Guido. Tinha apenas dois anos quando a mãe faleceu, e já morando no Rio de Janeiro viu o pai unir-se a outra mulher de nome Renée, madrasta que após frequentes castigos contra Abraham provocou sua fuga de casa quando ele contava tão-somente dez anos, levando-o a se abrigar na casa do tio Samuel Garson. Este, aos 19 anos, já administrava, em 1927, uma loja de pianos na rua Gomes Freire, além de gerir vários negócios no ramo industrial carioca. Samuel acolheu o sobrinho com alguma reserva, porém ele acabou sendo-lhe útil, uma vez que Medina aprendera com o pai os rudimentos de conserto daquele instrumento. A loja de Samuel ganhou ampliações e lucros, e em 1930 aparecia no Rio de Janeiro a conhecida Casa Garson, espaço onde Abraham Medina iria aprender as artimanhas de compra e venda de instrumentos musicais, eletrofones, discos, rádios, geladeiras, televisores e outros produtos e artigos desse então incipiente ramo comercial carioca. Em 1932, com 16 anos, Medina passou a conviver com a Era de Ouro da Rádio Nacional, onde despontavam Ary Barroso, Francisco Alves, Orlando Silva, Lamartine Babo, Lupíscínio Rodrigues, Aracy de Almeida, Noel Rosa e outros astros da música. Com o sucesso da loja, Samuel abriu uma filial na Rua Uruguaiana, mas com uma doença súbita que o acometeu, Medina assumiu o controle dos negócios tendo apenas 21 anos de idade. Logo em seguida, surgiu nova loja na Rua do Ouvidor, e com isso a Casa Garson multiplicou bastante suas vendas. Por essa época, ele conheceu Rachel, sobrinha de Célia Zenatti, a companheira de Francisco Alves. Foi essa circunstância que aproximou Medina do idolatrado cantor, fato que criou entre eles uma amizade que perduraria por 12 anos. Célia era cunhada de Miguel Levy, proprietário de uma loja em Miguel Pereira chamada Casa Nova, em cujo espaço por vezes Francisco Alves aparecia para conversar com seus amigos miguelenses.
Na verdade, foi Francisco Alves quem trouxe Medina pela primeira vez à cidade, e não o contrário. De fato, Chico já frequentava o lugar em função do parentesco de Célia, e no ano de 1940 o famoso Rei da Voz trouxe Medina a Miguel Pereira após convencê-lo sobre as belezas, o clima e a tranquilidade da pequenina cidade do interior. Vieram no famoso buick do cantor, e desde sua primeira visita o já vitorioso empresário passou a frequentar a serra regularmente, imaginando criar por ali um ponto de repouso e diversão tanto para a família quanto para os inúmeros empregados que trabalhavam nas afamadas Casas Garson.
Em 1941, aos 25 anos, Abraham Medina casou-se com Rachel, para com ela gerar Rubem, Roberto e Ruy. Levava uma vida tranquila no Rio de Janeiro, ao lado da família, dos amigos e das lojas que administrava com rara competência. Entretanto, em 27 de agosto de 1952 sentiu o trauma da perda do grande amigo Francisco Alves, morto tragicamente em um acidente na Rodovia Presidente Dutra. Não poderia jamais permitir que a lembrança do Rei da Voz fosse obliterada pelo tempo, até porque suas empresas patrocinavam programas de rádio e, especialmente, as apresentações de Chico Alves no Rio de Janeiro. Assim, em 30 de novembro de 1955 ele inaugurava o estabelecimento que seria sua marca registrada no Rio de Janeiro: a grande casa batizada como Rei da Voz, localizada nos números 30/40 da Rua Uruguaiana, no espaço antes ocupado pelo Rei das Louças. Ele próprio dirigiu as obras. Queria luxo, modernidade, visibilidade e diferenciação de todas as concorrentes, e assim dotou a loja de amplas fachadas e letreiros enormes. Nela havia de tudo, desde televisores, geladeiras, equipamentos de som e liquidificadores até um bar para descontração dos clientes, todos atendidos por dez vendedores, todos bem jovens e atraentes. O Rei da Voz logo se tornou a maior rede de lojas do gênero do Rio de Janeiro, uma potência em recordes de vendas e pioneira na comercialização de discos e na venda de inéditos artigos de luxo na época.
Finalmente, em 1963 Medina realizou seu sonho. Criou em Miguel Pereira sua Colônia de Férias, para onde trazia funcionários, parentes, amigos e artistas (espaço atualmente ocupado pela Pousada Miguel Pereira). Participando de atividades comunitárias na cidade, foi ele quem ampliou as dependências do Miguel Pereira Atlético Clube, dotando-o de ginásio, piscina olímpica, campo de futebol society e ampla área social, ali produzindo e patrocinando grandes eventos musicais e shows com famosos artistas cariocas. Convidado pelo prefeito Manoel Guilherme Barbosa (Nelzinho), Medina assumiu a Secretaria de Turismo do município entre fevereiro de 1967 a novembro de 1968, mas durante sua curta gestão remodelou a entrada de Barão de Javary, urbanizou o entorno do lago e refez sua ponte, estruturou a praça fronteiriça à Escola Edmundo Soares (que hoje leva seu nome), montou a 1ª Mostra de Produtos Típicos de Miguel Pereira, inaugurou o Mirante da Serra e, principalmente, plantou roseiras ao longo da linha férrea, desde Javary ao centro da cidade, obra que criou para Miguel Pereira o título agora esquecido de Cidade das Rosas. Tais atividades e melhorias adensaram muito a imagem do município em todo o estado do Rio, atraindo veranistas, artistas e outros moradores para o lugar. A cidade ganhou uma nova dimensão social, turística e cultural graças ao dinamismo e à visão eclética do empresário que trabalhou até os últimos dias de sua vida.
Abatido por um enfisema pulmonar, Medina faleceu no Rio de Janeiro em 20 de agosto de 1995, sendo sepultado no Cemitério Comunal Israelita do Caju.
Na próxima edição: Sebastião Teixeira Portela