Paraibuna e Monte Serrat - Sítios Históricos do Sul Fluminense - 5
Uma das roças mais frequentadas dentro do roteiro que ligava Vila Rica ao Rio de Janeiro via Caminho Novo de Minas.
28/10/2016
Historiador Sebastião Deister
Edição 109
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O povoado de Paraibuna, no
alvorecer do século XVIII, transformou-se numa das roças mais frequentadas
dentro do roteiro que ligava Vila Rica ao Rio de Janeiro via Caminho Novo de
Minas. Seu crescimento ficou atrelado à criação do Registro Geral, espécie de
alfândega da época que tinha por objetivo evitar o contrabando de ouro e pedras
preciosas extraídos de Minas Gerais, mas tal posto servia, ainda, para
arrecadar os quintos pelo direito de passagem das riquezas obtidas de forma
legal nas cidades mineiras.
De fato, o Registro Geral de
Paraibuna foi instalado no ano de 1711 por iniciativa de Garcia Rodrigues Paes,
tendo sido criado no local um quartel para o abrigo da Polícia Montada, com sua
corporação proporcionando segurança total ao trânsito pelo Caminho Novo, razão
pela qual tornou-se necessário edificar casas para seus componentes e para os
demais funcionários do próprio Registro, logística que propiciou a rápida
evolução do povoado, tornando-o uma vila próspera e bastante conhecida. Somente
a partir de 1720 o governador das capitanias do Rio de Janeiro (Ayres de
Saldanha de Albuquerque) e de Minas Gerais (D. Pedro de Almeida) acordaram em
manter o Registro em terras mineiras (atualmente inserido no território de
Simão Pereira), mas sob a direção e segurança do governo fluminense. Em finais
de 1726 foi arrematado o contrato dos "Direitos das Passagens da Parahyba e
Parahybuna" por Joaquim Ferreira Varella. Três anos depois, o mesmo contrato
foi arrematado por Pedro Pinto da Costa. Além dos trabalhos do Registro,
verificava-se pelas circunvizinhas um intenso e rentável serviço de
aproveitamento de terras. Paralelamente às lavouras de milho, feijão, cana-de-açúcar,
batata, mandioca e verduras, cuidava-se bastante do cultivo da mamona, cujas
plantações forravam vastas planuras próximas ao rio Paraibuna. A mamona
constituía um produto fundamental para todo o Vale do Paraíba, uma vez que dela
se extraía o azeite (óleo) que servia como combustível nos candeeiros que
iluminavam as casas e algumas vielas que brotavam pelo povoado.
Tal fruto também
representava importante moeda de troca com o Rio de Janeiro e, em especial, com
Vila Rica, o que garantia mais uma boa fonte de renda para os agricultores dos
roçados cultivados às margens do Caminho Novo ou junto aos remansos dos rios da
região. Por conseguinte, Paraibuna passou a remeter seus excessos de estoques
agrícolas às cidades mineiras. Assim, pesados fardos de milho, mandioca, batata
e frutos de mamoneiras, ao lado de espessas braçadas de cana-de-açúcar, eram
despachados com frequência para as Gerais que praticamente nada produziam na
área agrícola em razão de sua especialização no extrativismo mineral. Em contrapartida,
as florescentes cidades das alterosas enviavam, para o Sertão da Paraíba, parte
de seu ouro e de suas pedras preciosas, eventualmente remetendo-lhe outros
artefatos e materiais básicos, como ferramentas para lavoura, calçados, tecidos
e roupas em geral, espingardas e munição, medicamentos, cobertores, selas,
bridões, sal, açúcar, farinha e outros bens de consumo tão necessários aos
bravos homens da época.
Os lucros auferidos com a
exportação de óleo de mamona trouxeram para Paraibuna plenas condições de um
rápido crescimento, e sua facilidade de comunicação com o Rio de Janeiro e com
as povoações mineiras ensejou a chegada de mais viajantes, fazendeiros,
mascates, posseiros, negociantes de escravos, caçadores de índios e de peles,
padres missionários, carpinteiros, pedreiros, historiadores, sertanistas,
famílias de comerciantes, agentes imobiliários, militares e funcionários
públicos cujos múltiplos tentáculos abarcaram de pronto todo o Vale do Paraíba
e, numa sequência colonizadora bastante natural, as incultas áreas voltadas
para as colinas do Tinguá e para os territórios que alicerçariam o nascimento
posterior de inúmeros municípios do Sul Fluminense. Também nessa auspiciosa época
construiu-se a capela em honra de Nossa Senhora de Monte Serrat por ordem
direta de Garcia Rodrigues Paes, bem ao lado da colossal pedra de Paraibuna. Como era costume dos
portugueses, toda e qualquer povoação que abrigasse um expressivo número de
habitantes deveria contar com os trabalhos religiosos de sua própria ermida. Em
torno dela, então, formou-se uma leva populacional que logo fez nascer um povoado que acabou por se
transformar no Município de Levy Gasparian,
este um simples Distrito do Município de Três Rios até 23 de dezembro de 1991.
Os anais históricos dão como certo que a Capela de Monte Serrat foi erguida
entre os anos de 1702 e 1723, também por iniciativa do bandeirante Garcia
Rodrigues Paes.
Já por
volta do ano de 1780, o português Cristóvão Rodrigues de Andrade, natural da
cidade de Vizeu, em Portugal, estabeleceu-se no Vale do Paraíba, de cuja vila
veio a ser Capitão de Ordenanças e na qual se dedicou com afinco a várias
atividades comerciais, possuidor que era de vultosos capitais.
Na capela de Monte Serrat,
contraiu então matrimônio com D. Ana Esméria de Pontes França, ali nascendo
todos os seus filhos, inclusive Eufrásia Joaquina do Sacramento Correia, futura
esposa de Laureano Corrêa e Castro, o mesmo que, em 1854, receberia o título de
Barão de Campo Belo em Vassouras. Lembremos, a propósito, que Cristóvão e D.
Ana Esméria vinham a ser bisavós de Eufrásia Teixeira Leite, a conhecida dama
da vida vassourense no século XIX.
Pela apreciável quantia de
28 mil cruzados, o Capitão Cristóvão adquiriu a Fazenda de Paraibuna, então
pertencente a Ana Francisca Joaquina de Oliveira Horta Paes Leme (ou Francisca
Joaquina d'Horta Forjaz Pereira), viúva de Pedro Dias Paes Leme, o filho
primogênito de Garcia.
Assumindo a direção da
fazenda, o Capitão implementou um conjunto de medidas destinadas a viabilizar a
realização de investimentos diretos naquelas terras tão fecundas, com isso
transformando um latifúndio ainda intocado e sem produtividade em uma
propriedade rural dinâmica e rentável. Alguns anos após seu falecimento em
1809, a fazenda foi retalhada entre seus filhos e outros herdeiros, mas durante
o ciclo do açúcar verificaram-se significativas melhorias nos transportes da
região. De fato, sob a direção do Capitão Antônio José Barbosa Teixeira, o
lendário Capitão Tira-Morros, o já centenário Caminho Novo de Garcia foi
bastante revigorado, recebendo profundas obras de recuperação de seu leito e
simultaneamente vendo nascer a bela ponte sobre o rio Paraibuna, ligação
terrestre entre o Rio de Janeiro e Minas Ferais e até hoje em pleno
funcionamento como parte integrante da Estrada União e Indústria. Registre-se
que tal obra fora determinada em 1818 por Decreto expedido por D. João VI, mas
sua inauguração somente aconteceria em 2 de maio de 1824 por ordem de D. Pedro
I.
Na próxima edição: Cavaru e Sertão do Calixto