O Viaduto Ferroviário Dr. Paulo de Frontin

Estudos para a criação de uma imensa ponte, cujo leito apresentasse uma curvatura adequada à implantação dos trilhos, um coeficiente de inclinação apropriado ao balanço dos comboios e um índice de tração suficiente para suportar o peso das locomotivas

 17/02/2017     Historiador Sebastião Deister      Edição 125
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Em finais do século XIX, quando da construção da Linha Auxiliar da ferrovia na serra, afigurou-se para os diretores, engenheiros e projetistas da época um problema considerável: como vencer a profunda garganta do rio Santana, junto à estação de Vera Cruz? Uma imensa ponte de ferro deveria ser ali construída unindo os flancos daquele despenhadeiro desafiador, porém não em linha reta em virtude da topografia peculiar do local e em razão de a linha férrea já ter um projeto técnico que considerava com cuidado os pequenos aclives em curva após cada cabeceira do viaduto.

Assim, começaram a se desenvolver nos gabinetes da empresa ferroviária profundos estudos para a criação de uma imensa ponte, cujo leito apresentasse uma curvatura adequada à implantação dos trilhos, um coeficiente de inclinação apropriado ao balanço dos comboios e um índice de tração suficiente para suportar o peso e as oscilações das pesadas locomotivas e dezenas de vagões repletos de cargas e passageiros. Além do mais, algumas outras imposições físicas não podiam ser ignoradas em hipótese alguma: a força dos ventos vindos do sudoeste, cuja velocidade e força talvez comprometessem a estrutura superior da obra, o impacto das águas do rio em suas bases, especialmente quando de suas assustadoras cheias de verão, e o material formador da estrutura metálica, cuja qualidade garantisse a perenidade da obra.

Os engenheiros responsáveis pela Linha Auxiliar conseguiram planificar às minúcias uma obra memorável, enviando para a Compagnie des Chemins de Fer du Su-Ouest Brésiliens, na Bélgica, os croquis do viaduto, memoriais descritivos sobre as colinas e o rio, plantas da área de Vera Cruz, dados físicos e matemáticos relativos a curvaturas, desníveis e ondulações do leito férreo, mapas fisiográficos da região, cópias de cartas referentes ao trajeto da estrada pretendida, com a exata e detalhada definição do que sonhavam erguer na serra. Por conseguinte, levantou-se a 34 metros por sobre o Rio Santana um pontilhão inigualável de 82 metros de comprimento em curva e em ferro, com um belo vão central em arco de 40 metros e mais dois vãos de 21 metros cada um, considerado por tais características único no mundo.

Após 119 anos, a obra ainda provoca admiração e respeito pela serena firmeza de suas bases piramidais, pela inexistência de fendas, trincamentos ou rachaduras em sua estrutura e, em especial, pela total ausência de ferrugem em seu metal secular e já tão agredido pelas temidas intempéries serranas. Registre-se que a construção do Viaduto de Vera Cruz foi, de fato, o mais extraordinário e elogiável feito da Linha Auxiliar, pois aquele era trecho mais crítico e desafiante de todos os pontos das montanhas a serem vencidos.

Assim, a partir do viaduto os trilhos subiram as colinas em direção a Fragoso com raios mínimos de 100 metros e em rampa máxima de 2,65%, visto que acima de tais valores os tombamentos e descarrilamentos seriam inevitáveis.

    À testa de tais trabalhos encontravam-se homens altamente qualificados como André Fustavo Paulo de Frontin, Luiz Raphael Vieira Souto, Henrique Eduardo Hargreaves, Conrado Jacob de Niemeyer, Francisco Bicalho e especialmente João Alberto Masô, um diligente engenheiro de origem suíça que acabou por estabelecer, ao lado de Frontin, os números definitivos para o viaduto. 

Com tal façanha, revelou-se assim, mais uma vez, o gênio criativo, obstinado e audacioso do homem brasileiro, e no dia 29 de março de 1898 inaugurava-se solenemente o notável viaduto ferroviário em Vera Cruz, prontamente batizado pela Direção da Linha Auxiliar como Viaduto Dr. Paulo de Frontin em reconhecimento aos serviços prestados por aquele admirável engenheiro em favor da estrada de ferro serrana.

Apenas para lembrar, a obra terminou em 1897, mas sua inauguração só ocorreu um ano depois, razão pela qual no viaduto existe uma placa registrando o ano de 1897.