Os orgânicos sobem a favela

Saladorama vende comida saudável e gera emprego para pessoas da comunidade

 06/03/2017     Planeta Colabora   
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A primeira vez que comeu lasanha de berinjela, Hamilton Santos não gostou. Provou novamente, muito mais por insistência dos novos amigos do que por vontade própria. Morador de São Gonçalo, na região Metropolitana da cidade, ainda não estava acostumado aos hábitos alimentares dos colegas de trabalho, todos moradores da Zona Sul cario- ca. Recém-formado em Engenharia de Produção, traba- lhava no Templo, escritório de coworking na Gávea.

No horário do almoço, ele saía para comer nas redondezas e o cardápio escolhido era, invariavelmente, uma combinação de saladas com carnes magras. Até que, em um final de semana, ficou com vonta- de de repetir o cardápio e comer uma comidinha leve. Não encontrou nenhum restaurante na vizinhança de sua casa, em São Gonçalo. A primeira reação de Hamilton foi ficar irritado; a segunda, foi enxergar ali uma oportunidade. Daí para abrir o seu próprio negócio foi um pulo. Assim nasceu o Saladorama, um delivery de comida saudável para pessoas de baixa renda.

Descobri que comer saudável é um privilégio, não é um direito

Hamilton Santos coordenador do Saladorama

Junto com a nutricionista Mariana Fernandes e a designer Isabela Ribeiro, Hamilton mergulhou nas estatísticas e constatou que quase metade da população está acima do peso e que, entre as pessoas das classes C, D e E – seu público alvo -, uma das principais causas de morte é a doença cardiovas- cular. Era a justificativa que ele e suas sócias precisavam para embalar suas saladas. Faltava ainda criar uma alternativa para derrubar o principal entrave para que a comida saudável subisse a favela: o preço alto. É comum ouvir dos empresários do setor que alimentos frescos e perecíveis deixam os pratos mais caros.

Para romper essa lógica, o Saladorama encurtou a cadeia produtiva, estimulando a criação de hortas na própria comunidade. O preço da salada varia de 12 reais a 21 reais. A mão de obra também é local.

Um ano depois, o fatura- mento está próximo de 100 mil reais, o Saladorama se mudou de São Gonçalo para a favela Santa Marta, em Botafogo, e expandiu a rede para Sorocaba (SP), Florianópolis (SC) e Recife (PE). A próxima filial já tem endereço certo: São Luís (MA). A entrega é feita de bicicleta. O modelo de crescimento é via franquia. Nos três primeiros meses, o franqueado – que os sócios do Saladorama preferem chamar de ponto de representantes – está livre de qualquer tipo de pagamento. Só após esse período é que repassa um percentual das vendas.

Como as saladas e sucos são feitos por e para um público de baixa renda, o Saladorama se autointitula um “negócio social”. O conceito nasceu no início dos anos 2000 e se refere a uma empresa que não visa exclusivamente o lucro. “Queremos democratizar o acesso à alimentação saudável”, diz Hamilton. Para garantir que o preço seja justo, a empresa cria cozinhas bases dentro das comunidades e emprega os próprios mora- dores.

O negócio se encaixou como uma luva no conceito do indiano Muhammad Yunus, criador do microcrédito e dos negócios sociais, e ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 2006. “Descobri que comer saudável é um privilégio, não é um direito”, diz Hamilton, comentando que ficou surpreso ao constatar que havia uma demanda reprimida por uma alimentação saudável e de qualidade nas comuni- dades.

A meta é quadruplicar o resultado da startup, que levou Hamilton a virar embaixador Choice (um dos programas da Artemísia) e, antes de fazer a primeira entrega, ser aprovado no processo seletivo da Yunus Negócios Sociais Brasil.

Os pedidos podem ser feitos através do site, pela página do facebook ou por WhatsApp, até às 22h do dia anterior à entrega. Por dia, o Saladorama vende 200 saladas.