Uma costa rica em bons exemplos
Adversário do Brasil na Copa é um dos países mais sustentáveis e democráticos do mundo
06/08/2018
Planeta Colabora
Compartilhe:
Foto
1 - A praia de Ostional, um dos refúgios nacionais de vida selvagem na Costa
Rica. O país tem o melhor desempenho ambiental da América Latina. Foto: Iuri
Cortez
O
que a pequena Costa Rica, com uma área do tamanho do Rio Grande do Norte e uma
população menor que a da cidade do Rio de Janeiro, pode ter em comum com um
país continental como o Brasil? A paixão pelo futebol certamente é um dos
exemplos, mas não é o único. Outra semelhança é histórica: dois países
colonizados por europeus, que se tornaram independentes no início do século XIX
(a Costa Rica em 1821 e o Brasil em 1822); ambos passaram anos vivendo da
exportação do café, do açúcar e da exploração do trabalho escravo. Só que lá, a
abolição veio 50 anos mais cedo. Assim como o voto direto, que existe desde
1913. Aqui, como todos sabem, essa conquista custou um pouco mais caro e veio
muito mais tarde.
"A próxima meta da Costa
Rica é se transformar, até 2021, na primeira nação carbono zero do mundo. O
projeto inclui novos investimentos em transporte público, eletrificação dos
automóveis, produção de gás natural, técnicas agroflorestais e redução do uso
de fertilizantes na agricultura"
A
biodiversidade é outro tema que nos aproxima. O Brasil, em seus 8,5 milhões de
quilômetros quadrados, abriga 20% das espécies do planeta. Já a Costa Rica, com
apenas 51 mil km2, concentra 5% da fauna e da flora mundial, o que fez com que
as universidades de Yale e de Columbia, nos EUA, dessem ao país o título de
Melhor Desempenho Ambiental da América Latina e terceiro melhor do mundo.
E
essa relação com o meio ambiente é uma das muitas lições que podemos aprender
com o nosso adversário na Copa do Mundo.
Até 1970, cerca de 80% das florestas costa-riquenhas haviam sido
destruídas pelo agronegócio, especialmente pela criação de gado ? qualquer
semelhança com outra nação ao sul do continente será mera coincidência. Desde então, os sucessivos governos decidiram
investir em preservação. Entenderam que manter a floresta em pé seria muito
mais lucrativo para o país e para o seu povo do que derrubá-la. A principal
medida foi o estabelecimento do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA).
Produtores rurais e comunidades tradicionais passaram a receber dinheiro para
restabelecer e preservar a vegetação nativa. Hoje, quase 50 anos depois, mais
da metade do território nacional é coberto por florestas e 25% abriga parques
nacionais e áreas protegidas.
Foto
2 - Turistas no Parque Manuel Antonio. O turismo ecológico é uma das principais
fontes de divisas do país. Foto: Bertrand Gardel/ Hemis/FR
Um
dado curioso é a fonte dos recursos que financiam estes pagamentos. O dinheiro
vem dos impostos cobrados da produção de energia, especialmente dos
combustíveis fósseis; é a economia marrom financiando uma das nações mais
verdes do planeta. Atualmente, além de receber recursos de países desenvolvidos
como compensação pelo carbono absorvido por suas florestas, a Costa Rica virou
sinônimo de sustentabilidade. O turismo ecológico e de aventura é a sua
principal fonte de divisas, além da crescente indústria de alta tecnologia.
Empresas como a Intel e a Amazon são dois exemplos dessa nova economia.
A
próxima meta da Costa Rica é se transformar, até 2021, na primeira nação
carbono zero do mundo. É verdade que as emissões do país já são muito baixas e
que o objetivo não é tão desafiador quanto parece, mas o caminho está traçado e
ele inclui novos investimentos em transporte público, eletrificação dos
automóveis, produção de gás natural, técnicas agroflorestais e redução do uso de
fertilizantes na agricultura.
Mas
tudo isso só foi possível por conta de um detalhe importante: a estabilidade
política. A Costa Rica é considerada uma das 22 democracias mais antigas e
consolidadas do mundo. Aliás, o presidente recém-eleito, Carlos Alvarado, do
Partido Ação Cidadã, formou um gabinete com maioria feminina e tem como
vice-presidente a economista Epsy Campbell Barr, que é a primeira mulher negra
a ocupar o cargo na América Latina. Desde 1948, o país abriu mão do seu
exército e a segurança é feita por uma Guarda Nacional. Coincidência ou não, o
fato é que a Costa Rica é uma das poucas nações da América Latina que passou
incólume pelo século XX, sem enfrentar nenhum golpe militar ou guerra civil.
O
dinheiro economizado com o fim das forças armadas foi investido em educação e
saúde. Houve resultados claros e óbvios: 96% da população alfabetizada,
expectativa de vida de 79 anos, IDH de país desenvolvido, 96% das mulheres com
acesso a métodos contraceptivos, primeiro lugar da América Latina em Liberdade de
Imprensa, terceiro menos corrupto do continente e primeiro em índice de
satisfação da população. Talvez a gente não tenha quase nada a aprender com
eles em termos de futebol, mas seria bom olhar com atenção para o resto. Tem
muita coisa boa sendo feita por lá. Como diz o slogan oficial da Costa Rica:
Pura Vida.