Vida e morte do professor e Dr. Miguel da Silva Pereira - Parte 3
Imagem: Maria Clara Tolentino Pereira, esposa do Dr. Miguel Pereira
04/01/2019
Historiador Sebastião Deister
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Mesmo
mergulhado em suas múltiplas atividades, Miguel Pereira sempre dava provas do
amor que dedicava à Medicina, tanto que logo foi indicado para o Sodalício da
Academia, cargo que ocupou com galhardia e competência entre os anos de 1909 e
1911.
O simples
trabalho como médico em consultórios e as decisões que devia tomar em um posto
burocrático não concretizavam, todavia, as ambições daquele jovem e inquieto
doutor. Havia em suas entranhas uma crepitante força de solidariedade. Ele se
educara basicamente para ser professor, e seu espírito afetivo o impelia a
passar aos seus semelhantes tudo aquilo que já aprendera na vida. Sua alma
desprendida e atenciosa jamais poderia preservar, unicamente para si, os
conhecimentos que adquirira, caracterizando aquilo que Miguel Pereira dizia ser
um exercício de puro egoísmo. Viver é aprender e ensinar sempre, e por essas razões
o jovem médico voltou-se de corpo e alma para o magistério.
Segundo
relatos de muitos colegas e professores que com ele militavam, o jovem e
despojado médico tinha no sangue a fibra inata e inigualável de um grande
mestre, tanto que o professor Miguel Ozório de Almeida afirmou certa vez a seu
respeito que "(...) Miguel Pereira
educou-se para ser professor. Suas faculdades se apuram neste sentido e ele
pode chegar a um alto grau de perfeição, só comparável com o completo domínio
sobre sua própria atividade intelectual."
Miguel Ozório também garantia:
"A atuação marcante de Miguel Pereira foi
realmente no ensino, tendo iniciado esta atividade depois de sua diplomação,
quando o professor Francisco de Castro ? O Divino Mestre ? convidou-o, em 1898,
para ser assistente na Clínica Propedêutica. O contato e a convivência entre
esses dois maiores expoentes da medicina brasileira só foram interrompidos com
a morte prematura de Francisco de Castro, em 11 de outubro de 1901, cujo
desenlace causou a Miguel Pereira profundo abalo, pois ele era considerado pelo
Divino Mestre como um verdadeiro filho (...)"
No dia 4
de outubro de 1907, Miguel Pereira foi nomeado, depois de acirrado concurso,
como Professor Substituto da 6ª Seção de Clínica Médica, ocasião por ele
aproveitada para pronunciar na Academia
um vibrante discurso em defesa da melhoria do ensino de Medicina no Brasil. Na
realidade, a vaga fora conseguida com imensa dificuldade, pois ele a
conquistara derrotando Aloísio de Castro, Antônio Austragésilo e Rubião Meira,
competidores que representavam na época a nata da cultura médica do país, fato
que, obviamente, aumentou ainda mais suas responsabilidades profissionais e o
consagrou como exímio professor.
Em 1908,
recebeu, com grande júbilo, a indicação para ocupar a Cadeira de Patologia
Médica. Seus feitos profissionais sucediam-se celeremente, e já em 1909 a
Congregação da Faculdade indicava-o para reger a 1ª Cadeira de Clínica Médica,
cátedra em que permaneceu até o dia de sua morte.
Ainda de acordo
com Miguel Ozório de Almeida
"(...) suas aulas são consideradas magistrais. Sua
palavra é clara, sonora, precisa, suave e douta. Ensinava o essencial, com a
introdução de novos meios semióticos e terapêuticos. Sabia preparar o
profissional para a vida prática e sua bondade era um dos atributos realçados
pelos seus discípulos."
Também a
respeito de suas aulas, seu antigo aluno, o professor A. de Almeida Prado,
escreveu com grande conhecimento de causa:
Miguel
Pereira foi o professor, o expositor incomparável, cujo renome atulhava os
auditórios, embevecidos com a precisão vocabular, com a segurança do seu exame
clínico e com os sortilégios de sua sedução pessoal "(...)as suas qualidades foram, sem dúvida, as de professor. À facilidade
extrema de expressão aliava dotes de rigor científico absoluto e a sagacidade
mental das verdadeiras vocações clínicas."
Em
relação ao mestre, disse o Dr. Xavier Pedrosa, seu biógrafo e um dos seus mais
fiéis alunos:
"Quem lhe ouviu o timbre de voz, agradável e envolvente,
não mais o esqueceu, nem o tempo em sua marcha inexorável pode apagar dos
nossos ouvidos aquela ressonância longínqua, só comparável a esses rastros de
luz provenientes de astros que já se extinguiram há milênios e cuja luz ainda
vaga nos espaços".