Febre amarela reduz população de micos-leões-dourados
Doença causa diminuição de 32% no número de animais da espécie símbolo da defesa do meio ambiente no Brasil. A solução é uma vacina ainda em fase de testes
20/09/2019
Planeta Colabora
Edição 260
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Foto 1 - Mico-leão-dourado: surto de febre amarela devolve incerteza à
espécie, que estava vencendo a luta contra a extinção. (Foto de divulgação)
O recente surto de febre amarela na região Sudeste do Brasil teve
impacto dramático sobre uma espécie ameaçada de extinção e que é também símbolo
da defesa do meio ambiente no país: o mico-leão-dourado. Censo realizado pela
Associação Mico-Leão-Dourado (AMLD) aferiu redução de 32%, queda de 3.700
animais para 2.500. Pesquisadores estão desenvolvendo uma vacina na tentativa
de evitar que novas perdas ocorram, o que acontecerá caso o vírus da doença
permaneça circulando na área de ocorrência da espécie, endêmica da Mata
Atlântica da baixada do Rio de Janeiro.
O vírus da febre amarela atinge primatas humanos e não humanos por meio da
picada de mosquitos infectados. A maioria dos macacos morre poucos dias após
serem expostos ao vírus. No caso dos micos-leões-dourados, os pesquisadores
perceberam que alguns grupos, ou famílias, do animal sumiram das matas nos
últimos dois anos. O desaparecimento coincidiu com a morte de macacos bugios,
considerados sentinelas para febre amarela.
Os grupos de micos-leões-dourados são regularmente monitorados por
equipes de campo da AMLD. Em cada grupo, um dos animais usa colar com rádio transmissor,
o que permite sua rápida localização por meio de uma antena de telemetria. Três
foram encontrados mortos. Em maio de 2018, um deles teve a doença confirmada em
laboratório como causa da morte. As hipóteses de que a fatalidade tivesse sido
provocada por predadores naturais ou caçadores também foram examinadas, mas
descartadas por falta de maiores evidências. Antes do surto de febre amarela, a
população de micos-leões-dourados vinha aumentando de forma consistente: de
apenas 200 nos anos 1970 - quando o animal esteve à beira da extinção na
natureza - para os 3.700 do censo de 2014, considerado marco de sucesso mundial
na recuperação de uma espécie ameaçada.
"É a maior queda da população já verificada desde o inicio dos esforços
de conservação, há mais de 40 anos" -James Dietz, cientista e vice-presidente
da ONG Save the Golden Lion Tamarin
O novo censo, concluído recentemente, constatou o declínio de 32%,
redução que poderá tornar mais difícil a reprodução da espécie. As maiores
perdas ocorreram em fragmentos de Mata Atlântica do município de Silva Jardim,
a 120 km do Rio de Janeiro. Todos os dados desse estudo estão sendo publicados
nesta terça-feira no Scientific Reports, da revista norte-americana Nature.
O artigo é assinado pelos pesquisadores James M. Dietz, Sarah J. Hankerson,
Brenda Rocha Alexandre, Malinda D. Henry, Andréia F. Martins, Luís Paulo Ferraz
e Carlos R. Ruiz-Miranda.
Segundo o biólogo norte-americano James Dietz, cientista aposentado da
Universidade de Maryland, vice-presidente da ONG Save the Golden Lion
Tamarin e que lidera o grupo de pesquisadores, esta "é a maior queda da
população já verificada desde o inicio dos esforços de conservação, há mais de
40 anos. Mas existe conhecimento científico e capacidades locais para enfrentar
mais este desafio para o mico-leão-dourado".
Dietz refere-se, sobretudo, ao desenvolvimento de uma vacina para os
macacos, já em fase de testes, que está sendo desenvolvida por pesquisadores da
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Centro de Primatologia do Rio de Janeiro,
com apoio da AMLD. Diante da possibilidade de um ciclo continuado da doença nos
próximos anos, a vacina para proteger os micos pode fazer a diferença entre
perder a espécie definitivamente ou salvá-la da extinção.
O secretário-executivo da AMLD, Luís Paulo Ferraz, considera a redução
na população dos animais "muito preocupante" e disse que, além dos estudos para
a vacina, a associação continuará a fazer o monitoramento dos grupos de macacos
na sua área de ocorrência, formada, principalmente, pelos municípios de Silva
Jardim, onde fica a Reserva Biológica de Poço das Antas, Rio Bonito e Casimiro
de Abreu. "Há condições para que o mico resista, mas para isso os esforços
terão que ser redobrados. Felizmente, em todos estes anos, temos uma comunidade
consciente e que protege o mico. Isso faz toda a diferença", afirmou Ferraz,
lembrando ainda que a recuperação da espécie no Brasil foi possível graças a um
esforço global, com a participação de zoológicos estrangeiros que mandaram
alguns de seus animais para serem reintroduzidos na natureza na década de 1980.
"Isso é uma luz para o caso de necessidade extrema", concluiu, esperançoso.
Por: Cristina Serra