Francisco Alves, o Rei da Voz, teria feito 121 anos em 19/8
Corria o ano de 1937 quando Francisco Alves veio a conhecer o Décimo Distrito de Vassouras e se apaixonou pela hoje cidade de Miguel Pereira. Famoso e com muito dinheiro, procurou uma casa aqui para seus momentos de lazer.
27/09/2019
História
Edição 261
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Por
Renato Moreira*
Francisco de Moraes Alves nasceu na cidade do Rio de
Janeiro no dia 19 de agosto de 1898, filho do senhor José e da dona Isabel.
Seus pais eram portugueses. Chico foi criado entre os bairros do Estácio, Saúde
e Vila Isabel. Seu pai tinha um bar no bairro da Saúde. Chico cursou apenas a
escola primária e desde cedo se interessou pela música, inclusive ganhou de sua
irmã ngela seu primeiro violão, que era uma guitarra portuguesa, mas depois
ele a trocou por uma bicicleta. Chico começou a sua carreira de canto na Companhia
de Teatro São José, do empresário José Secreto, e depois na Companhia de João
de Deus.
Em 1919, foi levado pelo compositor Sinhô para gravar na
etiqueta popular fundada por Paulo Lacombe e João Batista Gonzaga, suposto
filho de Chiquinha Gonzaga, onde iria gravar dois discos com a marcha O Pé
de Anjo e o samba Fala Meu Louro, ambas de Sinhô. Nessa época,
depois de trabalhar na fábrica de chapéus na Mangueira, Chico levava a vida
como chofer de praça; apresentou-se secundário nos teatros de revista musicais.
Francisco Alves, com apenas 22 anos de idade, se casou
com Perpétua Guerra Tutóia, sem levar a conhecimento de seus pais esse
casamento. Chico mal conhecia seus padrinhos, e o casamento durou apenas 15
dias, se separando por não suportar a vida que aquela mulher levava.
Após sua separação, no mesmo ano, conheceu a
atriz-cantora Célia Zenatti, com quem conviveu por mais de 30 anos. No ano de
1924, gravou na Odeon dois discos para o carnaval com um samba de Sebastião
Neves e outro com uma marcha de Freire Júnior, obtendo grande sucesso no
carnaval. Vale lembrar que nessa época os discos eram gravados somente de um
lado.
Em 1927, passou pela gravadora Odeon, nela gravando ainda
pelo sistema mecânico, com destaque para as músicas de Cassiano Maxixi, Gosto
Que Me Enrosco e Ora Vajam Só; ambas as músicas são de Sinhô. Em
1927, a gravadora Odeon inaugurou o sistema elétrico de gravação e Chico foi o
primeiro a gravar. As músicas foram Albertina e Passarinho do Má,
sambas de Duque. Em 1928, passou a gravar na Porlophon, subsidiária da Odeon, usando
os nomes Chico Viola e Francisco Alves.
Nesse mesmo ano, fez sua estreia na Rádio Sociedade. Os seus discos vendiam em
grande profusão e, sem tardar, alcançou o topo, onde continuou até o seu falecimento,
sempre obtendo recordes de vendagem.
Até o ano de 1929, Francisco Alves já havia gravado quase
300 músicas de reconhecida qualidade e sucesso. Chico cantava todos os gêneros
musicais, inclusive muitas versões. Francisco Alves foi o cantor que mais
gravou em toda história dos famosos discos de 78 RPM (rotações por minuto) no
Brasil.
Em 1933, o locutor César Ladeira lhe dá o slogan de "O Rei da Voz". Francisco Alves, como
compositor, deixou marcado o total de 132 músicas, sendo seu forte a melodia.
No total, foram 526 discos e 1.052 músicas, fora os acetatos em homenagem aos
amigos e que não foram discos comerciais e sem contar regravações; assim,
calcula-se que no total foram cerca de 1.200 músicas.
No estado do Paraná, foi prestada uma grande homenagem ao
cantor, que o Chico não chegou a conhecer. Lá existe uma cidade com o nome Francisco Alves em sua homenagem.
Francisco Alves e Miguel Pereira
Corria o ano de 1937 quando Francisco Alves veio a
conhecer o Décimo Distrito de Vassouras e se apaixonou pela hoje cidade de Miguel
Pereira. Famoso e com muito dinheiro, procurou uma casa aqui para seus momentos
de lazer e foi até a rua Luiz Pamplona, número 19, onde se apaixonou pela casa que
estava à venda. O proprietário era o coronel Prado e Chico lhe propôs a compra
do imóvel. O coronel Prado lhe impôs uma condição: disse que só vendia o imóvel
se Chico mantivesse o seu caseiro Waldomiro Moreira. Chico imediatamente disse
ao coronel Prado: "a casa é minha".
Chico Alves e Waldomiro se tornaram grandes amigos; Chico
o tratava como Miro. Na casa, houve o casamento de Miro com Zulmira Dias da
Fonseca, e deste matrimônio vieram os filhos: Maria dos Anjos (Nininha), Renato
(eu), Célio, Olaci, Marília e Iracema, esta que foi batizada na antiga Igreja de
Santo Antônio, hoje o Centro Cultural, e os padrinhos foram Francisco Alves e
Célia Zenatti.
Um dia, Francisco Alves disse ao meu pai: "Miro, se você
morrer primeiro do que eu, eu cuido de sua esposa e de seus filhos, e se eu
morrer antes de você, eu não lhe deixo mal".
Última gravação
No dia 22 de setembro de 1952, Francisco Alves gravou na
Odeon com as crianças da Casa de Lázaro, do Bairro do Méier, no Rio de Janeiro,
as seguintes músicas: Brasil de Amanhã e Canção da Criança, de
sua autoria e de David Nasser e declamação da locutora da Rádio Nacional Lúcia
Helena. Naquela época, as gravações eram feitas direto com orquestra e cantores
juntos. O disco saiu errado, com palavras de Lúcia Helena, pois as palavras do
lado A saíram no lado B e as do lado B saíram no lado A do disco. Não teve
tempo de corrigir e o disco até hoje continua errado nas regravações.
Último show no Largo da Concórdia
Na noite de 26 de setembro de 1952, 6ª-feira, aconteceu o
último show de Francisco Alves, que foi no Largo da Concórdia com mais de 100
mil pessoas, acompanhado por violões, bandolins e pandeiros, ao som de carros
de som (volante) e transmitido diretamente pela Rádio Nacional de São Paulo
para todo o Brasil. O show foi patrocinado pelas bicicletas Merk Suissi e o
show foi das 20h às 22h.
No término do show, Francisco Alves se despediu de todos
e foi até a Boate Lorde, onde estava se apresentando o cantor Gregório Barrios.
Após o show do amigo Gregório, Chico foi para o apartamento de um amigo para
descansar porque no sábado estaria de volta a Miguel Pereira. No dia seguinte, às
15h do dia 27 de setembro, sábado, ele e seu companheiro de viagem Haroldo
Alves (que não eram parentes) partiram de São Paulo em seu automóvel Buick Eid
Dinefon na cor azul, placa DF 115.680, com destino a Miguel Pereira para o
final da festa do Ramadã, o jejum dos judeus, onde aqui se encontravam Abraham
Medina e outros para a festa.
Entre Taubaté e Pindamonhangaba, com Haroldo dormindo e o
Chico no volante com o rádio ligado no jogo do Fluminense e América, time do
seu coração, de repente surge um caminhão na contramão que pega em cheio o
Buick do lado do Chico, fazendo o carro explodir e atirando longe Haroldo Alves.
Chico Alves ficou preso nas ferragens e morreu carbonizado. No relógio do carro
marcavam 17h27min e o velocímetro ficou marcando a velocidade de 128 km/h.
No domingo, Chico sairia de Miguel Pereira às 10h para
seu programa Ao Soar do Carrilhão, na
Rádio Nacional do Rio de Janeiro, que era patrocinado pelas lojas Garçom. Foi
triste, parece mentira, mas aconteceu, a Rádio Nacional do Rio fez o programa
gravado.
Chico cumpre a palavra
Dias depois da morte de Francisco Alves, aparece em nossa
casa Abraham Medina e David Nasser, advogados de Chico Alves, e dizem ao meu
pai, Waldomiro Moreira: "Waldomiro, você terá que ir ao Rio para assinar, junto
à gravadora Odeon e com as crianças da Casa de Lázaro, o contrato de venda da
primeira tiragem do último disco do Chico, 50% para você e 50% para as crianças
da Casa de Lázaro", e assim foi feito.
Em fevereiro de 1953, meu pai recebeu pela venda dos
discos com as músicas Canção da Criança
e Brasil de Amanhã, Cr$ 25.500,00,
ficando Cr$ 25.500,00 para as crianças da Casa de Lázaro.
*Renato Moreira, servidor aposentado da
Prefeitura de Miguel Pereira, era filho de Waldomiro Moreira, caseiro de
Francisco Alves. Renato, com 14 anos, conviveu de perto com Francisco Alves, o
Rei da Voz, muitas das vezes carregando o vilão de casa para o carro e do carro
para a Rádio Nacional. Renato fazia isso inúmeras vezes, acompanhando o Rei da
Voz em um bate e volta ao Rio, saindo de Miguel Pereira. Segundo Renato, Chico
não tinha nenhum bem em seu nome e guardava dinheiro em caixas de sapato.