Sete heranças portuguesas que são a cara do Brasil

Historiador lista curiosas e pouco conhecidas marcas da colonização portuguesa no Rio de Janeiro e no país

 01/05/2020     Planeta Colabora      Edição 292
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No dia 22 de abril de 1500, as caravelas Santa Maria, Pinta e Nina aportaram em solo brasileiro pela primeira vez sob o comando de Pedro Álvares Cabral. Este episódio, como se sabe, é chamado de descobrimento do Brasil. Passados 517 anos, parte do que Portugal deixou por aqui ao longo destes mais de cinco séculos também pode ser descoberta, ou melhor, redescoberta pelos brasileiros. Convidado do programa "Como Será?" da TV Globo, que foi exibido no sábado 22 de abril de 2017, o historiador Antônio Edmilson Rodrigues ajuda a contar essa história que vai além das referências óbvias e, por vezes, surpreende. Confira nossa lista:

 

1 - Ora, pombas

 

Talvez pouca gente saiba, mas os pombos, hoje encontrados em qualquer esquina ou praça das grandes cidades e que por transmitirem doenças são até chamados de ratos com asas, não são nativos do Brasil. Eles foram trazidos propositalmente nos navios, diretamente de Portugal. Não que os colonizadores quisessem espalhar qualquer doença, é claro. Segundo o historiador, os pombos foram "importados" para terras brasileiras porque estavam associados à religiosidade, e a Coroa Portuguesa era extremamente católica. Os pássaros eram, então, símbolo de proteção divina. "Desde a Idade Média, o Divino Espírito Santo é representado pela imagem de uma pomba. Por isso, esses pássaros foram trazidos ao Brasil", conta Rodrigues.

 

2 - Árvore que dá em barco

 

Outra herança de Portugal com a qual praticamente tropeçamos em cada esquina são as amendoeiras. Mas, diferentemente dos pombos, essas árvores foram trazidas por razões práticas. "As amendoeiras eram usadas como lastro de navio. Elas vinham nos porões só para equilibrar as embarcações. Eram sementes, pedaços de tronco e galhos. As sementes foram se espalhando naturalmente pela terra e acabaram nascendo em toda a orla do Rio de Janeiro. Depois, elas foram plantadas propositalmente nos subúrbios, porque eram áreas de muito calor e terra. Ali, as amendoeiras serviam para urbanização das ruas, demarcando os trajetos e ainda faziam sombras grandes", explica o professor.

 

3 - Misericórdia!

 

Na maior parte das cidades com colonização portuguesa, você vai encontrar um deles: lugares denominados Largo da Misericórdia. No Rio de Janeiro, não é diferente. O largo fica no Centro, junto ao Museu Histórico Nacional e à Igreja Nossa Senhora do Bonsucesso. Segundo o historiador, era tradição portuguesa batizar com este nome os pontos referenciais para o início da urbanização das cidades. Portanto, ele ressalta, esta foi a primeira área verdadeiramente urbanizada do Rio.

 

4 - Olha o chão

 

Lá mesmo, no Largo da Misericórdia, está, com certeza, outra marca portuguesa: o calçamento com as chamadas pedras pé de moleque. São iguais às que se vê nas cidades históricas de Minas Gerais ou em Paraty, na Costa Verde do Rio. "Esse tipo de calçamento era usado para ajudar a travar as rodas das charretes. Por isso, ele é feito de pedras totalmente irregulares, cada uma tem formato e tamanho aleatórios. Isso impedia as charretes e carruagens de escorregarem nas ladeiras", destaca Rodrigues.

 

5 - Se essa rua fosse minha?

 

Um símbolo imaterial da presença portuguesa por aqui é a forma de nomear as ruas em homenagem a santos e pessoas com importância social ou política. De acordo com Rodrigues, antes do período de residência da família real no Brasil, as ruas não tinham nomes, eram conhecidas como "rua da praia" ou "rua de dentro" etc. A partir da chegada de Dom João VI, começou a mudança e os nomes foram gradativamente trocados.

 

6 - O segredo do chafariz

 

Também no Centro do Rio está mais uma curiosidade da marca da colonização brasileira.  O conhecido Chafariz do Mestre Valentim é um símbolo do projeto colonizador português. Em seu topo está a Esfera Armilar, a mesma que ornamenta a bandeira portuguesa e que representa a presença universal do país, ou seja, sua determinação de conquistar terras por todo o mundo. Aliás, o monumento pouco se parece com um chafariz tradicional - hoje nem verte mais água. Apenas olhando-se bem atentamente é possível ver pequenas bicas nas laterais, que eram usadas para pegar água por marinheiros que aportavam por ali.

 

7 - Festa abrasileirada

 

Apesar de todos os símbolos materiais da presença portuguesa no Brasil, como as construções coloniais, os azulejos ou mesmo os doces e o bacalhau, há outras marcas culturais que eles deixaram no Brasil e que, de tão incorporadas pelos brasileiros, já não têm quase nada em comum com sua origem. Um exemplo são as festas juninas. Segundo Rodrigues, essas festas são comemoradas até hoje em Portugal, mas não têm qualquer semelhança com a maneira como as celebramos no Brasil. "Em Portugal, junho é o mês das festas porque 13 de junho é o dia do padroeiro de Lisboa, Santo Antonio. Dia 24 é do padroeiro do Porto, São João. E o dia de São Pedro, padroeiro de Vila Nova de Gaia, é 29. O país inteiro comemora essas três datas. Aqui no Brasil, herdamos a tradição, mas as festas acabaram ficando diferentes, incorporando os hábitos sertanejos e de outras partes do mundo. Os portugueses, por exemplo, não dançam quadrilha, mas outras danças tradicionais de lá", diz Rodrigues.

 

Foto 1 - Caravela na Praça XV: uma das muitas heranças de Portugal no Centro do Rio. (Foto: Márcio Menasce)

 

Foto 2 - Os pombos, que estão por toda parte no Rio, foram trazidos em navios diretamente de Portugal. (Foto: Márcio Menasce)

 

Foto 3 - As amendoeiras que se espalham por todo o Rio de Janeiro vieram de Portugal em navios. (Foto: Márcio Menasce)

 

Foto 4 - O Largo da Misericórdia, no Centro do Rio, foi o marco do início da urbanização da cidade. (Foto: Márcio Menasce)

 

Foto 5 - O Chafariz do Mestre Valentim guarda símbolo do imperialismo português. (Foto: Márcio Menasce)