Casas, ruas e loteamentos pioneiros do município Parte 2

Trajetória Política e Social de Miguel Pereira

 02/09/2022     Historiador Sebastião Deister      Edição 413
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Durante o intenso período de urbanização do município, despontaram em Miguel Pereira algumas belas propriedades campestres que passaram a ser o orgulho do lugar por um punhado de anos, entre elas o Sítio Maria Clara, do professor Miguel Pereira (assim denominado em homenagem à sua esposa e ainda existente em Miguel Pereira, no final de uma rua também batizada Maria Clara, bem no centro da cidade); o Sítio das Rosas (do Dr. Manfredo Delamare) e o Sítio Samambaia (da família Machado Bitencourt), ambos contíguos ao primeiro; o Sítio Alegria (propriedade de Chiquita Soares Maia, onde se abrigou a família Deister logo após sua chegada de Petrópolis, em 1920); o Sítio dos Coqueiros (do Dr. Sodré e de sua esposa, D. Maria Clara Miguel Pereira, filha do professor Miguel Pereira e carinhosamente conhecida na cidade como D. Mancala); o imenso e arborizado Sítio do Dr. Mário Freire (hoje transformado no elegante loteamento Village São Roque, no coração de Miguel Pereira); o Sítio de Joaquim da Conceição, origem de um bairro do mesmo nome; o Sítio Lírio do Brejo (instalado em terras da antiga Fazenda do Sacco e propriedade de D. Astréia de Mattos); o Sítio do Dr. Joaquim Nicolau (médico muito querido na velha Miguel Pereira, casado com outra filha do professor Miguel Pereira, D. Helena, e situado no bairro Praça da Ponte); o Sítio do Dr. Mandinho (também na Praça da Ponte); o Sítio do Dr. Bruno Lucci (um dos criadores do famoso Hotel Summerville); o Sítio do Dr. João Alberto Masô (o imigrante de origem suíça que participou dos trabalhos da ferrovia na serra e que se casou com D. Laurita, neta do Dr. Antônio Botelho Peralta); o Sítio do Dr. Hermano Durão (em terras que hoje fazem limite com a Colônia de Férias do Banco Boa Vista, no bairro Cupido); o Sítio Chaumiére (em Javary, posteriormente transformado em Hotel) e o Sítio Brasil (em Portela, antes um hotel e hoje Colônia de Férias dos Gráficos).

Simultaneamente, dezenas de casas mais simples foram construídas no centro de Miguel Pereira, especialmente depois de 1920, quando se tornou intenso o trânsito de veranistas pela Serra, fenômeno certamente motivado pela constante propaganda do lugar levada a efeito anos antes no Rio de Janeiro pelo professor Miguel Pereira e por outras famílias aqui estabelecidas, como os Delamare, os Durão, os Fraga, os Peralta e, em especial, os Machado Bitencourt.

Cremos ser interessante registrar que tal propaganda baseava-se na suposição de que o clima de Miguel Pereira era tido como ideal para a cura de várias enfermidades, particularmente a tuberculose, tão insidiosa e temida na época.

 

O próprio Miguel Pereira dizia aos colegas da Faculdade de Medicina que:

 

"(...) nada melhor do que passear pelos iluminados bosques de eucaliptos e procurar os estábulos para cheirar o amoníaco do estrume do gado para bloquear o desenvolvimento da doença (...)".

 

O Dr. Miguel Pereira orientou muitos de seus discípulos a transferirem para Miguel Pereira seus doentes tuberculosos. Aqui, teriam eles os benefícios do clima, repouso absoluto e alimentação adequada e natural. Muitos médicos renderam-se aos argumentos daquele mestre famoso, e logo dezenas de doentes procuravam a serra em busca de um lenitivo, verificando-se mesmo, segundo crônicas da época, algumas curas impressionantes.

 

Diga-se, de passagem, que uma delas teve especial importância para nosso município: 

Frederico Augusto da Senna Wängler desembarcou de maca na estação ferroviária e anos depois teria a honra de ser o primeiro prefeito eleito de Miguel Pereira.

 

Um dos médicos que seguiram os conselhos de Miguel Pereira foi o Dr. Alcântara Machado. Entusiasmado, manteve ele em Paty do Alferes, nas proximidades da Fazenda da Manga Larga, uma confortável e conhecida Casa de Saúde destinada tanto a doentes tuberculosos quanto a enfermos mentais. Infelizmente, esse pioneiro hospital foi desativado após sua morte, e hoje não se notam nem mesmo vestígios de tal construção naquele local.

A maioria dos enfermos que buscavam Miguel Pereira era constituída por homens e mulheres de boa condição econômica ou membros das melhores classes sociais do Rio de Janeiro, o que colaborou bastante para que Miguel Pereira formasse uma população de bom poder aquisitivo e mentalidade arejada, cuja consequência mais imediata seria sua participação na vida social e política do lugarejo que crescia e prosperava rapidamente.

 

1922 Vila Alzira

O resultado da chegada de tanta gente a Miguel Pereira não se fez esperar, e a década de vinte e trinta caracterizou-se por um grande fomento na construção civil. De fato, na rua que seria posteriormente batizada como Luiz Pamplona, surgia, em 1922, a empertigada Vila Alzira, propriedade do comerciante Aurélio Barile, homem que participou com desenvoltura de muitas marchas sociais em Miguel Pereira, inclusive das ações destinadas a trazer energia elétrica para a cidade e dos movimentos de fundação do Estiva Futebol Clube. Na mesma rua, um pouco mais à frente, três residências ganharam destaque naqueles anos: o grande sobrado de Manoel "Manduca" Bernardes Sobrinho, a simpática casinha denominada Tintaóca (de 1926), pertencente a Alzino Rodrigues Ferreira "Tintas" (irmão do já mencionado Juju) e a vivenda designada como Villino Geraldino, construída em 1932 pela família de Geraldino Fraga.

As construções familiares aparecidas nessa época apresentavam uma característica estrutural bem típica: todas mantinham o inconfundível estilo interno herdado das velhas fazendas de café, isto é, a ausência de corredores de circulação. Em geral, a porta principal abria-se para uma ampla sala de recepção, por cujas paredes distribuíam-se as portas de ligação com os demais aposentos da casa. O uso de corredores só foi introduzido alguns anos depois, razão pela qual as mais antigas residências de Miguel Pereira e Governador Portela mantêm ainda intactas as singelas peculiaridades arquitetônicas dos anos vinte. Além disso, quase todas dispunham de grandes janelas e portas bem largas e altas, pelas quais os moradores podiam transportar os imensos e pesados móveis da época, não sendo raro o fato de a porta central da casa ser construída em dupla folha de madeira de lei extremamente resistente e de muito bom-gosto.

 

Foto: Antiga residência para caseiro no interior do Loteamento do Dr. Mário Freire (desaparecida)

 

Na próxima edição: Casas, Ruas e Loteamentos Pioneiros do Município - Parte 3