As origens de Arcádia

Parte 2 - A chegada da ferrovia

 30/12/2022     Historiador Sebastião Deister      Edição 430
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A determinação do Imperador

 

Os primeiros contratos destinados à construção de uma estrada de ferro que chegasse a Três Rios partindo de Belém (hoje Japeri) foram assinados no Rio de Janeiro em 15 de março de 1882 atendendo a uma determinação do Imperador D. Pedro II que desejava ver o interior fluminense coberto por uma relevante teia ferroviária.

A via imaginada deveria seguir o curso do rio Santana, galgar as serras da Viúva e do Couto, ultrapassar as vilas de Governador Portela e Estiva, atravessar a Freguesia de Paty do Alferes e daí continuar para Paraíba do Sul e Entre-Rios (agora Três Rios), de cujo entroncamento com a bitola larga vinda de Barra do Piraí poderia desviar-se com facilidade para as Minas Gerais, via Porto Novo do Cunha, assim atravessando a divisa dos dois estados.

O projeto também previa que a nova ferrovia, ao contrário daquela já existente nos territórios de Vassouras e Valença, deveria ter bitola entre trilhos de 1 metro (conhecida como métrica). Para sua concretização, foi fundada, em 17 de maio de 1890, a Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil pelos engenheiros André Gustavo Paulo de Frontin (casado com D. Maria Leocádia de Toledo Dodsworth, filha do Barão de Javary), Henrique Eduardo Heargraves, Francisco Bicalho, Luiz Raphael Vieira Souto e Conrado Jacob Niemeyer, entre outros engenheiros e membros do Governo Imperial.

No dia 15 de fevereiro de 1893, deu-se então partida à construção da Linha Auxiliar na chamada Estação de Alfredo Maia, na Mangueira (Rio de Janeiro), sendo que dois anos depois - em 1 de novembro de 1895 - os trilhos já atingiam Honório Gurgel (km 17), destacando-se daí um ramal com cerca de 3 quilômetros em linha reta para a estação de Sapopemba (hoje Deodoro da Fonseca).

Em 29 de março de 1898, a Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil deu curso a uma série de inaugurações pela Serra do Tinguá, abrindo para o tráfego as estações de Sertão (hoje Conrado Niemeyer), Bomfim (agora Arcádia), Vera Cruz e o seu famoso viaduto, Conrado Niemeyer (depois batizada como Francisco Fragoso), Governador Portela, Estiva (ex-Barreiros e atual Miguel Pereira), Paty do Alferes, Arcozelo, Avelar, Andrade Costa, Cavaru e Barão de Werneck, além de diversas paradas de reabastecimento de locomotivas, entre as quais Paes Leme, Santa Branca, engenheiro Adel, Monte Líbano, Barão de Javary, Monte Alegre, Pau Grande, Mestre Xisto, Bueno de Andrade e Taboões. Naquele auspicioso dia, os diretores da ferrovia orgulhosamente entregavam aos moradores da serra a Maria Fumaça e seus vagões que, por muitos anos, foram motivo de alegria e prosperidade para todas as emergentes cidades do vale do rio Santana. Infelizmente, D. Pedro II, o maior de todos os mentores dessa obra meritória, não mais se encontrava entre nós, haja vista ter falecido em Paris em 1891.

Em 2 de julho de 1903, a ferrovia serrana conectando Japeri a Três Rios foi incorporada à Estrada de Ferro Central do Brasil (EFCB). Em seguida, por determinação expressa do ofício nº 835 datado de 16 de julho do mesmo ano, a estrada passou a ser definitivamente conhecida como Linha Auxiliar, apresentando um total de 61 unidades de trabalho, entre paradas de reabastecimento e estações para embarque e desembarque de passageiros e de cargas diversas.

Em 1957, com a criação da Rede Ferroviária Federal S/A - que unificou 19 estradas de ferro brasileiras -, a Linha Auxiliar passou a ser administrada pela Estrada de Ferro Leopoldina, tendo a mesma sido gerenciada, até dezembro de 1986, pela Superintendência Regional de Juiz de Fora, subordinada a CSP-3/Campos.

A construção de vários ramais ferroviários pelo Tinguá - aos quais seria somado o trecho Governador Portela-Vassouras em 1914 - com suas diversas linhas efluentes, significou para Governador Portela, Miguel Pereira, Paty do Alferes, Avelar e circunvizinhanças sua redenção econômica, transformando-se aos poucos num preponderante fator de desenvolvimento socioeconômico para todas as demais cidades interioranas alocadas entre Japeri e Paraíba do Sul.

Graças à Estrada de Ferro, enraizaram-se pela serra algumas localidades mais modestas, como Conrado Niemeyer (posteriormente denominada Francisco Fragoso), Vera Cruz e Barão de Javary e Arcádia. Uma das grandes características desta estação foi o grande prédio de características neoclássicas localizado às margens da atual RJ 125, ao lado da centenária estação inaugurada pela Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil a cavaleiro do Rio Santana. Registre-se que, à época de sua entrada em operação, a modesta estação foi, inicialmente, chamada parada de Bom Fim, posteriormente grafada como Bomfim e, no século XX, rebatizada como Arcádia.

Nos anos subsequentes, com o asfaltamento da Rodovia RJ-125 ligando Miguel Pereira ao Rio de Janeiro através de uma intersecção com a Via Dutra em Japeri, e em virtude da sensível melhoria das vias de acesso a Paraíba e Vassouras - circunstâncias agravadas pelo triste declínio estrutural e pela derrocada financeira da Rede Ferroviária Federal S/A - desativaram-se as composições que uniam a região do Vale do Rio Santana ao Rio de Janeiro e a Minas Gerais, reduzindo-se drasticamente o fluxo de trabalhos pela Linha Auxiliar e desaparecendo os trens de passageiros pelas colinas. A estação, atualmente, abriga um posto de referência social da Prefeitura de Miguel Pereira.

Por seu turno, após anos abandonado à própria sorte, o belíssimo armazém foi comprado por Rogério Van Rybroek (proprietário da Fazenda São João da Barra e das terras da velha Fazenda Ararat) aliado a um grupo de amigos, que ali estão dando curso a uma série de processos de reforma e restauração.

 

IMAGEM: Estação de Arcádia nos tempos da ferrovia

 

Na próxima edição: Na próxima edição: As Origens de Arcádia - Parte 3