A Fazenda Monte Ararat e o Barão de Mentzingen - Parte 2

A Fazenda Monte Ararat agora fazem parte do território de Rogério Van Rybroek, então proprietário da fazenda São João da Barra, morto quarta-feira, 25/1

 27/01/2023     Historiador Sebastião Deister      Edição 434
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Wilhelm Ludwig Raban von Mentzingen (que, a partir de agora, será lembrado pelo seu nome abrasileirado Guilherme Luís Raban de Mentzingen) casou-se com Antônia Maria dos Santos, gerando os filhos Guilherme Filho (nascido em 17-06-1859); Alfredo (17-11-1861); Cecília (05-10-1863); Ernestina (24-04-1864); Isaltina (05-01-1869); Almerinda (?); Adolpho (?); Franklin (?) e Guilhermina (?). Por herança, ele e a esposa receberam a Fazenda das Palmeiras, agregando-a às terras formadoras da Fazenda Monte Ararat.

Muitas notícias com seu nome apareciam em diversos periódicos fluminenses impressos na segunda metade do século XIX, como no Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro (Almanaque Laemmert) e no Jornal do Commercio. As menções variavam bastante: publicidade sobre seus serviços como exímio agrimensor e produtivo lavrador, citações suas elogiando o Império Brasileiro, comunicações descritivas de suas viagens pela Província Fluminense e outros relatos referentes às suas atividades nas fazendas das Palmeiras e Monte Ararat, tudo sempre referenciado nas publicações da época pelo equivalente idiomático de seu nome em português: Guilherme Luís Raban de Mentzingen.

No dia 15 de dezembro de 1855 partiu para a Europa, provavelmente para tratar de assuntos familiares, retornando meses depois. Fato importante remeteu-se ao dia 4 de junho de 1858, quando desembarcou no Brasil o Barão Ernst von Mentzingen, seu irmão caçula. Ernst vinha a visita, permanecendo nas propriedades de Guilherme até 3 de setembro de 1858, dia em que retornou a Alemanha.

 

O violento e excessivo castigo do negro Joaquim Mina

 

Todavia, a vida em Bom Fim era muito complicada por conta das dificuldades sociais e econômicas próprias do século XIX, sendo, muitas vezes, maculada por circunstância tristes e inesperadas que normalmente brotavam no seio da ambiência escravocrata imposta nas fazendas de Guilherme Luís. Consta, por exemplo, que em determinada ocasião um feitor da Fazenda Palmeiras teria castigado um negro de nome Joaquim Mina de maneira excessivamente violenta. Não ficou explícito nos comentários da época se a ação do capataz fora uma decisão própria e individual ou se agira sob ordens diretas de Guilherme, mas o medo e a raiva alastraram-se junto aos demais escravizados, levando alguns deles a uma corajosa insubordinação. Com efeito, na noite de 15 para 16 de novembro de 1853 foi veiculada a notícia de que quatro escravos chamados Antônio, Jacintho, Vicente e Camillo teriam fugido da fazenda para se ocultar em um Quilombo na Estrada do Comércio, levando objetos pessoais, alimentos e algumas armas. Guilherme logo tratou de prometer boa gratificação a quem os capturasse, mas não existe documentação que registre o aprisionamento dos rebelados e sua possível recondução à fazenda.

 

Tentativa de fraude leva a interdição, pela Justiça, de Antônia de Mentzingen

 

Em 1920, Antônia Maria de Mentzingen, viúva do Barão Guilherme e então com 79 anos e residindo em Vassouras, foi obstada pela justiça devido à sua "caducidade". Na realidade, ela era herdeira direta da Fazenda Monte Ararat, e seu filho Guilherme de Mentzingen Jr. (1859-1922) em conluio com o cunhado Sebastião Corrêa, temendo uma eventual morte de Antônia, teriam pedido que ela assinasse a venda da Fazenda Monte Ararat a um determinado fazendeiro por um preço absolutamente irrisório. Posteriormente, o comprador revenderia a propriedade a Guilherme Jr. e Sebastião, negociata que, certamente, causaria prejuízo aos outros herdeiros e a alguns credores da família Mentzingen, uma vez que a fazenda não poderia ser transacionada em virtude da alienação hipotecária a que estava sujeita. Assim, a suposta (e suspeita) venda cruzada não foi concretizada por conta da intervenção do promotor da época, decisão que acabou levando Antônia à interdição pela Justiça de Vassouras que, afirmando sua incapacidade de decisão ditada pela idade avançada, não lhe dava discernimento para assinar qualquer tipo de documento relativo à comercialização da fazenda.

Após o litígio, a propriedade entrou em franco declínio e acabou sendo desmembrada em múltiplos lotes de terra, pouco a pouco deixando de pertencer à família Mentzingen, muito embora alguns descendentes de Wilhelm tenham adquirido parte dos terrenos dividios, ali implantando algumas atividades agropecuárias que, com o tempo, por conta da mão de obra ineficiente, da falta de equipamentos mais modernos e, principalmente, da concorrência de outras propriedades mais bem preparadas, levaram Monte Ararat a um fim melancólico e irreversível.

 

Freguesia de Sant'Anna das Palmeiras

 

Guilherme Luís foi um dos subscritores da petição enviada pelo Barão de Paty do Alferes ao Governo Imperial em 1852 pedindo um alvará para implantação de uma paróquia na Freguesia de Sant'Anna das Palmeiras, (onde hoje é a Reserva Biológica do Tinguá) destinada a atender os grupos católicos da região, cujo decreto de criação nº 813 expedido pela Província Fluminense ocorreu em 6 de outubro de 1855.

Como vimos ao longo de textos anteriores, Guilherme foi o responsável pela instauração da estirpe Mentzingen no Brasil. Atualmente, a maioria de seus descendentes ainda vive no país, concentrando-se em maior parte na cidade do Rio de Janeiro e no município de Miguel Pereira, com destaque para familiares alocados no distrito de Governador Portela. Outros famiiares vivem em Maricá (RJ), Ponta Grossa (PR), Brasília e Florianópolis (SC).

Seus últimos anos de vida foram marcados pelos transtornos políticos advindos da queda da monarquia e subsequente instauração da República. Anteriormente, ele já sofrera sérios problemas econômicos determinados pela superprodução de café no Vale do Paraíba, com várias propriedades entrando em bancarrota por conta da Abolição da Escravatura. Isolado em Arcádia, ele não conseguiu enfrentar as consequências dos problemas agrários ocorridos em Vassouras e em outras localidades periféricas. As dificuldades de exportação dos produtos de suas terras foram lentamente minando seu cultivo e baixando seus lucros. Mesmo com a presença da estrada de ferro passando nas proximidades de sua propriedade (a estação de Bom Fim/Arcádia fora inaugurada em 29 de março de 1898), o que poderia facilitar o envio de sua produção para o Rio de Janeiro, o preço do frete estava sempre acima dos eventuais rendimentos de suas colheitas, provocando-lhe assim prejuízos insanáveis. Por conseguinte, sem conseguir evitar dívidas crescentes, Guilherme acabou por hipotecar a fazenda, deixando para a esposa e filhos o futuro controle de suas propriedades até ali tão bem cultivadas. Com efeito, o que se sabe é que antes de seu falecimento o barão nutriu alguns desgostos familiares, além da questão da crise econômica ocorrida no final do século XIX pela qual ele se viu duramente atingido.

Com 75 anos de idade, Guilherme Luís Raban de Mentzingen faleceu às sete horas e trinta minutos da manhã do dia 6 de junho de 1902 na Fazenda Monte Ararat. Foi sepultado no Cemitério da Conceição, em Arcádia, onde ainda repousa.

Após passar pelas mãos da família de Sebastião Teixeira Portela, oriunda de Governador Portela, as glebas de Monte Ararat agora fazem parte do território de Rogério Van Rybroek, então proprietário da fazenda São João da Barra, morto quarta-feira, 25/1.

 

IMAGEM: A baronesa de Mentzingen Antônia Maria e os dois fihos mais velhos: Guilherme Jr. e Alfredo, da esquerda para a a direita. (Arquivo: J.M. Linhares)

 

Na próxima edição: Monte Líbano e o Barão de Mentzingen